Jornais internacionais afirmam que o Brasil foi “ingênuo” ao aceitar um acordo com Ahmadinejad, “comemorou” no Twitter o senador paranaense Álvaro Dias (PSDB), logo após o acordo nuclear entre Brasil, Irã e Turquia.
Desde a assinatura do acordo em Teerã no dia 18 de maio, confirmada em primeira mão por Lamia Oualalou, repórter do Opera Mundi, na madrugada de domingo para segunda-feira, os posicionamentos equilibrados de França, Rússia e China (os membros com cadeira permanente no Conselho de Segurança da ONU que não são meros repetidores das posições dos Estados Unidos, com é o caso do Reino Unido) em relação à atuação de Brasil e Turquia foram ignorados pelos políticos e articulistas mais afoitos.
Também foi ignorado o silêncio de Barack Obama, enquanto a voz estridente de Hillary Clinton ecoou como se estivéssemos dentro de uma caverna.
Apesar de muitos comentadores só estarem vendo as sombras projetadas no fundo dessa caverna, as análises precipitadas do episódio ganharam enorme repercussão. Nesse sentido, nada mais exemplar que versão plana e, portanto, rasa de Thomas Friedman para a negociação. Em texto publicado no New York Times (traduzido para o português pela Folha), o autor de best-sellers geopolíticos afirmou que Lula e o premiê turco, Recep Tayyip Erdogan, envergonhavam o Brasil e a Turquia por darem legitimidade a Ahmadinejad.
Friedman publicou seu texto mesmo depois de a agência Reuters, a partir de alguns trechos de uma carta de Obama a Lula, indicar que Lula e seu colega turco não agiram de modo impensado, mas em concertação com o próprio presidente norte-americano. Agora, com a publicação pela própria Folha da íntegra da carta do presidente estadunidense, obtida pelo colunista Clóvis Rossi, seu texto ficou ainda mais ridículo e extemporâneo.
O problema de analistas como Friedman, que atuam muitas vezes como repetidores das ideologias dos chamados “falcões” de Washington, conservadores que comandam de fato a política externa dos Estados Unidos, é que eles não se envergonham do que fazem. Não se trata de enaltecer a política externa do governo brasileiro, mas de exigir que as análises não sejam feitas apesar dos fatos.
Armadilha
E o fato é que ainda não sabemos quem foi o ingênuo, e há muitas hipóteses em jogo: Hillary, por cair numa armadilha de Obama? Obama, por acreditar que ainda pode construir uma política externa independente? Obama, por achar que Lula não fosse “dobrar” Ahmadinejad? Lula e Erdogan, por acharem que Obama daria suporte suficiente ao acordo? Ahmadinejad, por achar que estava construindo um caminho real de negociação que não significasse capitulação?
Claro que esta questão ainda não tem uma resposta – primeiro, porque o jogo diplomático ocorre com poucos holofotes, com a posição das luzes muito bem planejadas; segundo, e mais importante, porque ele ainda não terminou. E a nova Estratégia de Segurança Nacional dos Estados Unidos é apenas mais um capítulo, ainda não devidamente incorporada à discussão sobre o Irã.
O que fica evidente, neste cenário, é que análises precipitadas e com ponto de partida pré-concebido ao estilo de Friedman e de seus imitadores, estrangeiros e nacionais, não colaboram em nada para que se entenda melhor o que está se passando.
*Haroldo Ceravolo Sereza é jornalista e diretor de redação do Opera Mundi.
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