*Max Altman (1937-2016), advogado e jornalista, foi titular da coluna Hoje na História da fundação do site, em 2008, até o final de 2014, tendo escrito a maior parte dos textos publicados na seção. Entre 2014 e 2016, escreveu séries especiais e manteve o blog Sueltos em Opera Mundi.
Em 17 de maio de 1510 falece em Florença o primeiro pintor humanista, Sandro Botticelli.
O pintor nasceu na mesma cidade, 65 anos antes, com o nome de Alessandro Filipepi, na família de um curtidor de couro. Como um de seus irmãos, rechonchudo, havia sido apelidado de “botticelli”, que significa em italiano “pequeno tonel”, o epíteto substitui o sobrenome de família, passando a identificar o futuro pintor.
Sandro Botticelli fez seu aprendizado no ateliê de um grande pintor florentino do Quattrocento (o século XV italiano), Filippo Lippi (1406-1469). Como todos os artistas da Renascença, Lippi, tal qual um chefe de cozinha moderno, dirigia uma equipe da ajudantes e aprendizes, cada um especializado em um detalhe, nas roupas, nos filamentos de ouro, etc.
Com a colaboração de sua equipe, o mestre atende aos pedidos da burguesia e produz pequenos quadros em quantidade. Nessa ocasião é também muito solicitado por abades, bispos e príncipes para levar a cabo obras mais ambiciosas.
Botticelli passa ao ateliê de Verrochio embora frequentando o ateliê de Leonardo da Vinci, um rival. Em 1470, abre seu próprio ateliê. Seu talento vale ao jovem artista a possibilidade de frequentar as mais influentes famílias da cidade, entre as quais os Vespucci, um deles, Amerigo (ou Américo Vespúcio, o navegador), quem viria a emprestar seu prenome a um continente, e sobre tudo os Médicis. O poderoso “Lorenzo, o Magnífico” concorda em lhe dar proteção. O pintor, de resto, frequenta os grandes espíritos do humanismo da época, como Pic de la Mirandola e Marsilo Ficin, tradutor de Platão.
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Seus amigos o iniciam na filosofia neoplatônica que via o mundo sensorial como reflexo do mundo das ideias. Essa filosofia se vê refletida em suas célebres alegorias inspiradas na Antiguidade pagã.
Sua obra-prima “A Primavera”, destinada a uma ‘villa’ dos Médicis, expõe toda a graça e o otimismo da Renascença Italiana, com um toque de inquietação da ninfa da direita, quase agarrada pela divindade Zéfir. Trata-se possivelmente da primeira pintura europeia que colhe inspiração na Antiguidade pagã.
A tela mostra as diferentes estações, salvo o inverno, com, da direita para a esquerda, Zéfir, a ninfa Clóris, a Primavera, Vênus que domina Cupido, as Três Graças e o deus Mercúrio.
Reprodução/Wikimedia Commons
“A Primavera”, de Sandro Botticelli
Em 1481, o papa Sisto IV encomenda a Botticelli alguns afrescos de temas religiosos para a capela à qual emprestaria seu nome: a Capela Sistina. Pode-se admirar esses paineis ao lado dos monumentais afrescos de Michelangelo, posteriores de três decênios.
Após sua viagem a Roma, que não lhe trouxe qualquer recompensa financeira, o artista empreende O Nascimento de Vênus. Esta nova alegoria neoplatônica ilustraria, segundo certos comentadores, os quatro elementos – terra, água, ar e fogo – e o Amor que sela sua harmonia.
Depois da morte de Lorenzo, seu protetor, em 1492, o pintor sofre como muitos de seus concidadãos florentinos a influência do pregador Jerônimo Savonarola.
O otimismo próprio do humanismo é atacado, à época, violenta e sistematicamente pela maré montante do fundamentalismo religioso. A pintura de Botticelli se torna mais austera. Todavia, não se pode deixar à margem de suas célebres alegorias alguns retratos comoventes de realismo e as pinturas de madonas maternais e recatadas.
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