Efe
Acusações de corrupção e baixo crescimento abalaram partido de Putin, cuja vitória nas eleições presidenciais não é mais considerada uma “barbada”
As eleições parlamentares que ocorreram ontem (4/11) na Rússia representaram um importante teste popular à política do partido Rússia Unida, no poder desde 2000. Com um índice de aprovação cada vez menor, o partido do primeiro-ministro Vladimir Putin, já anunciado candidato à presidência, parece já não contar com o confortável apoio que obteve nas últimas legislativas.
Em 2007, 64,3% dos eleitores votaram na Rússia Unida, que conseguiu 315 dos 450 deputados da Duma (câmara baixa do parlamento). O Partido Comunista amargou um tímido segundo lugar, com 11,57% dos votos e 57 deputados.
O cenário mudou. Nas legislativas deste domingo, o partido Rússia Unida conseguiu apenas 49,54% dos votos e viu o Partido Comunista, principal partido de oposição, escalar na preferência do eleitorado e alcançar 19,16% dos votos. Os resultados não são uma surpresa, mas a que se deve tamanha mudança?
A perda de prestígio do partido Rússia Unida, apelidado pelo popular ativista político Alexey Navalny de “Partido de Ladrões e Vigaristas”, é resultado da insatisfação russa com a ineficácia de uma política econômica baseada na exportação de recursos energéticos e na centralização financeira em Moscou, além de um evidente aumento da desigualdade social. O fenômeno de explosão da classe média, vivido nos outros países emergentes, não ocorre na Rússia, onde apenas 18% da população pode ser classificada neste estrato social (no Brasil, este número é de 52%).
Paralelamente a este fato, Moscou se apresenta como a cidade com o maior número de bilionários do mundo, à frente de Nova York. Tudo isso, aliado a uma percepção de corrupção entre as mais altas do mundo. Num informe da ONG Transparência Internacional, a Rússia aparece na 154ª posição numa lista de 178 países no que diz respeito ao grau de corrupção (o Brasil está em 69º).
Numa campanha marcada por irregularidades, o processo eleitoral também apresentou inúmeras fraudes. A mais comum, conhecida como Carrossel, leva eleitores com zonas eleitorais temporárias ou com cédulas já preenchidas de eleitores sem registro a votar mais de uma vez no mesmo partido. Os vídeos com grupos de jovens chegando de ônibus aos locais de votação foram amplamente divulgados pela mídia independente.
Num outro tipo de fraude, mais simples e mais óbvio, um chefe da seção eleitoral preenche as cédulas daqueles eleitores que nunca comparecem às urnas. “Parece que a Rússia inaugurou o modelo mais eficiente de eleição – votamos enquanto dormimos. Eu não votei nas últimas duas eleições porque estava fora do país, mas fui à minha zona eleitoral neste domingo exercer o meu dever cívico. Qual não foi a minha surpresa ao chegar e descobrir que eu já havia votado? E, obviamente, para a Rússia Unida”, declara ironicamente o jovem Vladimir, que preferiu que o seu sobrenome não fosse publicado.
Chefe de uma seção eleitoral preenche cédulas de eleitores ausentes
Apesar dos casos de fraude eleitoral por todo o país, o partido Rússia Unida não conseguiu evitar o fracasso nas legislativas. “Todos os centros que calculam as intenções de voto davam no máximo 55% ao partido Rússia Unida. A fraude seria evidente se eles saíssem hoje com 65% dos votos”, explicou o analista Nikolay Petrov, do Carnegie Moscow Centre. E continua: “O partido ainda tem a maioria simples e isso é suficiente para aprovar a maioria das leis. E também não acredito que seja difícil conseguir a maioria constitucional através de alianças. Pouca coisa vai mudar e a Rússia Unida não terá problemas na governabilidade”. Na Rússia, exigem-de dois terços dos deputados (maioria constitucional) para que uma lei seja aprovada sem a consulta de outros partidos.
Dentro de três meses, os russos voltarão às urnas, desta vez para eleger o novo presidente do país. Vladimir Putin é um dos candidatos e a sua vitória era tida como certa, mas as legislativas deste fim-de-semana e a já mencionada perda de votos do partido Rússia Unida mudaram também as previsões para as presidenciais do dia 4 de março de 2012. Caso não consiga a maioria no primeiro turno, um segundo turno pode ser fatal para Putin.
Uma manifestação contra o resultado das eleições e as irregularidades está prevista para as 19h locais (13h em Brasília), no centro de Moscou.
NULL
NULL
NULL