As linhas funcionais da escola Bauhaus, embebida no ideário socialista pós-revolução russa de 1917, teve influência tão forte no modernismo que um passo adentro da retrospectiva em cartaz hoje no Barbican Centre, em Londres, cria uma rica sensação de familiaridade com esse grupo de artistas, apesar de tão distantes no tempo.
Erich Consemüller
Ise Gropius sentada em uma cadeira tubular de Marcel Breuer: máscaras e fantasias
Ao todo, cerca de 400 trabalhos estão expostos, de móveis a brinquedos, mas são os objetos pessoais que capturam uma quase impensável essência lúdica da escola alemã. Os convites de festa, as fantasias, os presentes feitos à mão e as fotografias íntimas de professores e estudantes mostram que a criatividade da Bauhaus transbordava sua essência direcionada ao industrial.
No aniversário de 50 anos do pintor Paul Klee, que dava aulas sobre teoria das cores na escola, estudantes decidiram alugar um avião da Junkers, cuja fábrica era em Dessau, uma das cidades que abrigaram a escola. Do céu, eles lançaram presentes em pacotes com formato de anjo sobre a casa do mestre.
Klee, em agradecimento, pintou Presentes a J (1928), que é parte do acervo do MoMA, de Nova York, mas está em cartaz e é uma das grandes atrações na retrospectiva.
Divulgação
Brinquedos também fizeram parte da produção da escola, que marcou época pela diversidade
O mergulho divertido na Bauhaus (cuja tradução é “casa para construir”) continua por fotos das festas na escola, em que estudantes usam fantasias feitas à mão e máscaras robóticas, que eram também figurino dos workshops de teatro. Sua mística é tão invejável quanto o legado. Enquanto todo designer imagina como teria sido estudar lá, escritores ainda hoje inventam personagens para seus livros inspirados na atmosfera criativa da Bauhaus.
“Um senhor me pediu para ajudá-lo em uma pesquisa sobre o que há de novo nessa retrospectiva. Ele é da República Tcheca e está escrevendo um romance em que o personagem principal estuda na escola”, contou ao Opera Mundi a satisfeita Catherine Ince, curadora da mostra, que vai até agosto.
Política e nazismo
Estranho imaginar um ambiente tão criativo em um período soturno, entre guerras. A escola Bauhaus foi fundada em 1919 pelos arquitetos Henry van de Welde e Walter Gropius na tentativa de combinar arte e tecnologia em uma Alemanha desmoralizada. Não por menos, a Bauhaus foi totalmente custeada pelo Estado. Frágil, pereceu em 1933 pelas mãos do nazismo depois de uma série de baques em seu orçamento.
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A retrospectiva mostra em detalhes como professores e estudantes eram pressionados pela instabilidade política a trazer resultados práticos, para produção em larga escala. Da arquitetura ao design de produtos, da pintura ao teatro, a escola conseguiu elaborar uma enorme quantidade de material.
As cadeiras tubulares de Marcel Breuer (1925-26), as tapeçarias de parede de Anni Albers (1924) e os estudos de círculos de Wassily Kandinsky (1923) são exemplos da amplitude da escola. Já a produção arquitetônica de Gropius a Mies van der Rohe, que encerra a mostra, expõe as diferenças de métodos dentro da Bauhaus.
Erich Consemüller
Marcel Breuer com Martha Erps, Katt Both e Ruth Ellos, seu “harém” em 1927
Com Gropius, o projeto era explicitamente socialista. Com Mies van der Rohe, porém, o objetivo era tentar fazer da Bauhaus uma escola apolítica, fato impossível de se concluir em Berlim na década de 1930, sob o comando de Adolf Hitler. A escola acabou fechada pela Gestapo.
“(A Bauhaus) é única pela diversidade de projetos e pela riqueza das vidas que foram vividas ali. Seu grande espectro de trabalho resulta da tentativa de mudar a sociedade”, analisa Catherine. Ela sugere ao visitante uma atenção especial à colagem Metropolis (1923), do estudante holandês Paul Citroen, que teria inspirado o filme homônimo de Fritz Lang, clássico do cinema e do expressionismo alemão.
“O período modernista ainda é muito atraente por conta da familiaridade dos objetos”, observa a curadora. “Localizar e entender as trajetórias de cada professor e estudante enriquece muito a experiência.”
Serviço:
Bauhaus: Art as Life
Barbican Art Gallery, Londres
Até 12 de agosto
10 libras esterlinas (venda online)
A galeria sugere fazer a compra com antecedência.
www.barbican.org.uk