O senador Eduardo Suplicy (PT/SP) afirmou na tarde desta quinta-feira (21/02), em entrevista ao Opera Mundi, que “houve exagero” da parte dos manifestantes que protestaram contra a blogueira cubana Yoani Sánchez durante um evento na última segunda-feira (18/02), em Feira de Santana, na Bahia. Os protestos inviabilizaram a reprodução do filme Conexão Cuba-Honduras, do diretor brasileiro Dado Galvão, em que Yoani é uma das entrevistadas.
“Todas as pessoas com quem conversei desde o episódio em Feira de Santana concordaram que houve exagero [por parte dos manifestantes]”. Para Suplicy, eles protagonizaram uma “atitude agressiva e, por vezes, ofensiva à Yoani”, mas representam “um setor minoritário da esquerda brasileira que está mal informado, agindo com base em informações incorretas e por, vezes, falsas”.
Agência Brasil
Devido à amizade com Yoani Sánchez, Suplicy foi chamado de “Dom Quixote” pela blogueira
O senador paulista, que estava presente no evento em Feira, disse que “após 50 minutos muito tensos” – em que discutiu com os ativistas -, conseguiu organizar um debate entre ela e os manifestantes, que transcorreu normalmente.
Suplicy afirmou que, na ocasião, lembrou aos manifestantes que, quando participou da fundação do PT (Partido dos Trabalhadores), “estava muito clara a opção a favor de um socialismo que defenda uma sociedade mais igualitária e justa, por meios democráticos e com liberdade de imprensa, expressão e direito de ir e vir, em uma época que ainda não havia liberdade e todos lutavam contra a ditadura”.
Ao ser perguntado se sua defesa à blogueira não contraria a maior parte da esquerda brasileira, Suplicy lembrou ter participado na quarta-feira (20) do aniversário de 33 anos do PT e dos discursos do presidente nacional da legenda, Rui Falcão, do ex-presidente brasileiro Luiz Inácio Lula da Silva e da atual chefe de Estado, Dilma Rousseff, que o governo nos últimos dez anos “tem se caracterizado pelos avanços na democracia, liberdade de expressão e imprensa”.
Objetivos do tour
Para o senador, o tour internacional da blogueira cubana, iniciado nesta semana pelo Brasil, é uma grande oportunidade para pressionar os Estados Unidos a levantarem o embargo contra a ilha caribenha, fechar o complexo prisional que administram na Baía de Guantánamo e libertar os cinco prisioneiros políticos cubanos sob custódia em território norte-americano.
“Em decorrência da nova lei de imigração cubana, Yoani poderá pedir ao Congresso [dos EUA] para que acabem com o embargo à Cuba, a prisão de Guantánamo e que libertem os cinco presos políticos, que são Os últimos soldados da Guerra Fria, como foram citados no livro do escritor Fernando Morais”, afirmou o senador. Para ele, a vinda da blogueira ao Brasil representa “um sinal claro de que a nova política de imigração do governo cubano permitirá a cidadãos, mesmo que críticos ao regime comunista, tenham liberdade de ir e voltar ao próprio país, medida elogiada pelo governo de Barack Obama”.
Suplicy compareceu nesta manhã à sede do Estado de S. Paulo, zona norte da capital paulista, onde Yoani participou de uma sabatina com jornalistas do grupo de comunicação e, em seguida, de uma coletiva de imprensa. O senador, que deixou o evento na primeira parte, conversou com a reportagem de Opera Mundi à tarde, por telefone, já em Brasília.
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Segundo Suplicy, a presença da blogueira gerou “extraordinária repercussão e possibilitará um diálogo mais próximo” entre Cuba e EUA. “[A visita] dará passos importantes para restabelecer a normalidade entre as relações” dos dois países e “mostrará que o bloqueio não faz mais sentido”.
Para justificar sua tese, ele lembrou o ensaio “Common Sense”, de Thomas Payne, um dos principais documentos durante a luta da independência dos EUA. “Conheço Payne por ser um dos idealizadores da renda básica da cidadania [principal bandeira política do senador]. Nesse texto, Payne afirmava ser um contrassenso que ‘uma ilha controlasse um continente [referência ao Reino Unido e aos EUA]. Pois, se estivesse vivo hoje, diria ser contra o bom senso o embargo’ que o continente faz com a ilha.”
Discordância
No entanto, mesmo que a blogueira consiga cumprir o desejo do senador e realmente discurse no Congresso norte-americano, será muito pouco provável que ela defenda os três pontos defendidos pelo petista da forma como ele acredita.
Pois, toda vez que se declara contrária ao embargo, ela diz que a abolição dessa medida iria “mostrar o fracasso econômico” cubano, como fez na quarta-feira (20), em Brasília, em visita ao Congresso. “Me parece que não funcionou. Os defensores dessa medida às vezes me explicam a tese através da metáfora de que se esquentarmos a caldeira, espalharemos o fogo. Mas essa caldeira não explode nas ruas, só entre os imigrantes. E o regime usa esse argumento para justificar tudo”, disse ela nesta quinta-feira, em São Paulo.
Sobre Guantánamo, Yoani disse ser contrária em razão das violações aos direitos humanos cometidas dentro do complexo prisional norte-americano, o que é um uma ideia compartilhada por todos os progressistas, mas não estende a crítica pela fato de a prisão ser uma ingerência em território cubano.
E, em sua coletiva no Estadão, disse que não considera os cinco cubanos presos nos EUA como “cinco heróis, mas cinco espiões” e que foram julgados imparcialmente por “tribunais norte-americanos plurais” e, por isso, não pede a liberação deles. “É um tema superdimensionado em Cuba para acobertar outros problemas”, diz. O senador Suplicy diz não ter ouvido essa afirmação – de fato, ele deixou a sede do jornal após a coletiva, antes da coletiva começar.
A blogueira já havia deixado clara essa posição em sua conta no Twitter, na quarta-feira (20): “Não creio que são inocentes e, por outro lado, sou contra os enormes recursos que o estado cubano utiliza nessa campanha”.
Além disso, afirmou que sua prioridade para a visita aos Estados Unidos, marcada provisoriamente para a última semana de março, será visitar parte de sua família que mora lá.
Cervantes
A blogueira chegou a chamar Suplicy de seu “Dom Quixote pessoal” por ser um “dos muitos de seus amigos mundo afora que ainda não tinha conhecido pessoalmente”. O classifica como um dos principais responsáveis por sua vinda ao Brasil e que, apesar de não concordar com todas as suas ideias, as respeita.
Sobre o apelido, Suplicy disse que ela o passou a chamar assim após o episódio em Feira de Santana, quando conseguiu fazer todos se sentarem para o debate.