O avião baixa de altitude conforme se aproxima da cidade de Maracaibo, no Estado de Zulia, na tarde do primeiro dia de campanha de Nicolás Maduro à Presidência da Venezuela. Dali a alguns minutos o candidato iria aterrissar em solo “maracuche”, como são chamados os habitantes dessa terra conhecida pelo intenso calor e abundância de petróleo. O sol ainda brilhava forte quando, do alto, um barraco de madeira se destacava em meio ao um descampado. Sobre ele, em vez das telhas, se via uma gigantesca foto de Hugo Chávez.
Marina Terra/Opera Mundi
Chavistas esperam Maduro para comício em Maracaibo, Estado de Zulia. Candidato governista e opositor iniciaram campanha eleitoral oficial em 1 de abril
Exatamente um mês após sua morte, o presidente venezuelano é o tema central da disputa eleitoral na Venezuela, sendo protagonista tanto da campanha governista como da opositora, liderada por Henrique Capriles. Enquanto Maduro se apoia no último pedido de Chávez antes de viajar a Cuba, quando instruiu que ele fosse eleito em caso de novas eleições, o governador de Miranda utiliza a estratégia de preservar a memória do ex-rival, se concentrando em atacar o presidente interino e o CNE (Conselho Nacional Eleitoral).
Em todos os atos de campanha, o chavismo reproduz uma gravação do hino venezuelano cantado pelo falecido presidente, além do vídeo no qual ele declara a preferência por Maduro. Logo após interpretarem a música oficial da campanha, “Maduro desde mi corazón”, artistas venezuelanos emendam o “hit” da campanha do ano passado, “Chávez corazón del pueblo”. Entre o público, gritos de “Viva Chávez!”, enquanto muitos choram e se abraçam. Nas camisetas e cartazes, predomina o rosto do presidente.
“Nosso comandante se foi e nos dói muito, mas arrancamos forças para seguir em frente. Nossa missão agora é eleger Maduro por nocaute”, afirma Genesis Ramirez, de 20 anos, estudante da UNES (Universidade Nacional Experimental de Segurança) de Zulia. Acompanhada de outros três colegas no apoio logístico ao ato em Maracaibo, ela ajuda a resgatar as dezenas de pessoas que desmaiam devido ao forte calor. “Se meu voto será por Maduro ou Chávez? Vou seguir a orientação do meu comandante”, responde.
Do outro lado do palanque, eleitores distribuem bigodes falsos, uma iniciativa espontânea da população em apoio a Maduro. A cada mudança de visual, gargalhadas, principalmente entre as mulheres. “Oscilamos entre a tristeza e a alegria. Jamais nos imaginamos nessa situação”, afirma Carmen Chiquinquira, de 39 anos. “Ele faz muita falta. Mas tenho certeza que, assim como Deus abençoou meu comandante, irá abençoar Nicolás. Eu já o amo profundamente”, diz, com o rosto inchado. “Há um mês choro todos os dias”, confessa a costureira.
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Bigodes postiços são vistos em todos os comícios liderados por Maduro na Venezuela
Maduro também deixa transparecer em seus discursos a saudade que sente do líder político, além do peso da responsabilidade que assumiu desde 5 de março. Assim que se escutam em Maracaibo as já memorizadas palavras de Chávez, “minha opinião firme, plena, como a lua cheia, irrevogável, absoluta, total (…)”, o presidente interino entrelaça as mãos nas costas, abaixando a cabeça. Por vezes arrisca um olhar para o telão, que transmite uma das últimas imagens em vídeo de Chávez.
“Nunca esperei isso. Jamais. Mas foi absolutamente comovente e surpreendente que um chefe que amamos e que sempre apoiamos com lealdade em certo momento te diga: 'Olhe, vou fazer uma operação e há três cenários: um é que não sobreviva à operação, o segundo é que meu estado fique muito delicado e nestes dois casos cabe a você, você deve assumir o comando'”, afirmou Maduro em entrevista à AFP.
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Pesquisas realizadas nos últimos dias apontam entre 10 e 20 pontos percentuais de vantagem para Maduro. A mais recente, do instituto Consultores 30.11, indicou nesta quinta-feira (04/04) que 52,8% dos entrevistados votarão por Maduro, enquanto 38,6% em Capriles. O GIS XXI (Grupo de Investigação Social Século XXI), mostrou que o presidente interino conta com 55,3% das intenções de voto, contra 44,7% de seu principal opositor.
No domingo, pesquisa do Ivad (Instituto Venezuelano de Análises de Dados) deu ao candidato chavista 53,8% dos votos, enquanto Capriles teria 30,8%. Independentemente da preferência eleitoral, 64,4% dos entrevistados pensa que Maduro sairá vencedor, enquanto 22,9% apostam em Capriles.
Oposição
Do lado opositor, a menção ao falecido presidente também é constante. Em sua campanha, o candidato da MUD (Mesa da Unidade Democrática) repete diariamente que “Maduro não é Chávez” e critica duramente o adversário, adotando um tom mais agressivo do que o visto nas eleições de outubro de 2012. Com a morte do presidente, e a gigantesca demonstração de apoio e luto vistas nas ruas de toda a Venezuela, a oposição procura preservar o nome de Chávez, culpando Maduro pelos problemas do país.
Canção oficial da campanha opositora, “Venezuela somos todos”:
No Estado de Aragua, Capriles afirmou que está liderando uma batalha para derrotar os “ligados” ou congelados no poder e pediu ao ministro da Defesa, Diego Molero, que no dia 14 de abril “se ponha à frente” para garantir que o povo possa votar “em paz” e que sua vontade seja respeitada. Ele exigiu uma explicação do CNE às denúncias feitas pela MUD essa semana, sobre o suposto acesso de membros do PSUV (Partido Socialista Unido da Venezuela) à senha de urnas eletrônicas, o que foi negado pelo Comando Hugo Chávez.
A oposição venezuelana vem questionando a segurança e isenção do processo eleitoral desde antes do início da campanha. Durante discurso para anunciar sua candidatura, em 10 de março, Henrique Capriles acusou o CNE de já ter “tudo pronto” para a eleição de 14 de abril, pois a data foi anunciada com rapidez, cinco dias após a morte de Hugo Chávez. Em 8 de março, após jurar como presidente interino, Maduro convocou o novo pleito.
Poucos dias depois, o maior jornal opositor, El Nacional, publicou em editorial que o CNE é um “obstáculo permanente” para eleições livres e justas na Venezuela, e chegou a insinuar que o voto já não é uma forma de promover mudanças no país.
Quem também fez comentários sobre o CNE foram os Estados Unidos. A porta-voz do Departamento de Estado de Estados Unidos para América Latina, Roberta Jackson, afirmou em março que julgava difícil que a Venezuela tivesse eleições “abertas, livres e transparentes”. As declarações foram rechaçadas tanto pelo órgão eleitoral como pelo governo.