O pesadelo de María Teresa Rivera. de 29 anos, começou em 24 de novembro de 2011. A jovem salvadorenha, morena, de cabelos negros, sentiu fortes dores abdominais e pensou se tratar de um problema intestinal. No banheiro, sofreu um aborto involuntário. Poucos dias depois, María foi condenada a 40 anos de prisão.
“Não lembro de nada. Minha sogra diz que chamou a polícia, que por sua vez chegou uma hora depois da Cruz Vermelha. Me levaram a um hospital e perguntavam onde estava o bebê, mas eu não sabia do que estavam falando, porque nem sabia que estava grávida”, contou a moça ao site Feminicídio.net.
Feminicídio.net/Reprodução
María Teresa não viu mais seu filho desde que foi presa, em novembro de 2011
El Salvador é um dos cinco países da América Latina em que há criminalização total do aborto — os outros são Chile, Honduras, Nicarágua e República Dominicana). Ainda no hospital, María foi algemada à cama. Quando recebeu alta, foi direto para uma delegacia e, alguns dias depois, para o Centro de Readaptação para Mulheres de Ilopango.
“Dormi um ano no chão até que houvesse vaga para mim em uma cama, sendo que duas presas dormem em cada colchão. Recebia comida apenas uma vez por dia e pararam de me dar as medicações na hora certa. Comecei a ficar com uma febre cada vez mais alta, mas ninguém me atendia”, lembrou.
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Até a primeira audiência sobre o caso, María não teve qualquer contato com o advogado. Além disso, sua chefe — a jovem trabalhava em uma empresa do setor têxtil — testemunhou contra ela, argumentando que suspeitava da gravidez da funcionária após seguidas faltas ao trabalho.
“A única coisa que pude argumentar foi que faltava muito por questões médicas. Alguns meses antes, quando fui a um pronto socorro por inchaço nos pés, o médico receitou apenas anti-inflamatórios. Em nenhum momento falaram que eu estava grávida. Pensei que o inchaço era pelo excesso de trabalho, porque passava 24 horas de pé quando não estava de folga. Me condenaram sem provas”, lamentou.
Além de estar presa, María também enfrenta a incerteza financeira de sua família, que dependia de seu salário para sobreviver. “Minha sogra e meu filho não podem vir me visitar porque não têm dinheiro. Não sei como ela tem feito para pagar o colégio do meu filho. Ele ainda sofre de broncopneumonia e não sei como está sua saúde.”
Para a advogada do Grupo Cidadão pela Despenalização do Aborto, Dennis Rosa, o caso de María é “emblemático”. “Ela foi condenada pelo aborto, como se o tivesse provocado. Ninguém levou em conta a possibilidade da influência de fatores alheios à sua vontade. Ela foi condenada por 40 anos, sendo que uma testemunha, que trabalhava com ela, disse que María sabia que estava grávida desde janeiro de 2011, mas o aborto ocorreu apenas em novembro”, argumenta.
Enquanto espera que o recurso seja analisado pela Justiça salvadorenha, María vive em Ilopango, onde a quantidade de presas supera em 450% a capacidade local. A decisão pode demorar até três anos.