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Líder da Frente de Esquerda, Jean-Luc Mélenchon, em manifestação da organização neste domingo (05/05)
O presidente da França, François Hollande, não teve muito o que comemorar no aniversário de um ano do início de suaadministração, ocorrido neste domingo (05/05). Uma grande manifestação, organizada pelo líder do Partido de Esquerda, que até então fazia uma oposição moderada ao governo do Partido Socialista (centro-esquerda), levou cerca de 180 mil pessoas à Praça da Bastilha (segundo os organizadore, 30 mil segundo a polícia), em Paris em protesto contra as políticas de Hollande, levadas a cabo pelo primeiro-ministra Jean-Marc Ayrault.
Mélenchon, quarto colocado na última eleição presidencial e apoiador de Hollande no segundo turno, acusa o atual governo de ter “traído a esquerda” francesa. Hollande, que acumula índices recordes de desaprovação (76% segundo a última pesquisa), tem sido duramente pressionado por não ter conseguido dar início a uma política de crescimento econômico em contraposição à austeridade fiscal defendida pela Alemanha e não conseguir conter o desemprego, que já atinge mais de 5 milhões de franceses.
Trata-se do maior e mais acentuada mostra de impopularidade de um presidente francês desde a fundação da V República, em 1958.
“Nós não queremos o mundo financeiro tomando o poder, nós não aceitamos medidas de austeridade que levam nosso povo, assim como em toda Europa, a uma dor incessante”, disse Mélenchon à multidão. O político, que nos últimos dias elevou o tom contra o governo, acusou Hollande de contribuir com a crise econômica europeia ao focar “nos interesses de acionistas, dos grandes negócios e de políticas de austeridade, em detrimento dos trabalhadores”.
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“Temos que demonstrar qual é o poder da esquerda na França”, assegurou Mélenchon, que pretende recuperar a iniciativa das manifestações – que, nos últimos meses, chamaram mais atenção pelas grandes mobilizações de grupos conservadores contrários à legalização dos casamentos entre pessoas do mesmo sexo.
Liderados pela Frente de Esquerda, os organizadores da manifestação defendem a instauração da “VI República” no país – propondo um novo sistema de governo. Os defensores dessa tese, liderados por Arnaud Montebourg, ministro da Indústria do governo Ayrault e membro do PS (Partido Socilista). Em troca do atual sistema presidencialista mixto, vigente na V República, eles propõem, entre outras medidas, um maior poder ao Parlamento e aos ministros, deixando o presidente com poderes arbitrais, com um mandato não renovável de sete anos. Segundo esse movimento, o atual sistema contribui para a despolitização da população e a imobilização do sistema político.
Em relação à ampliação, recebida nesta sexta-feira (03/05), de dois anos do prazo para que Paris reduza seu déficit público de 4,8% para até 3%, segundo impõe o Pacto de Estabilidade e Crescimento da UE, Mélenchon disse: “Parem com as mentiras. Não são dois anos de trégua que a Comissão Europeia está nos dando, mas dois anos de chantagem”.
“Todos nos desencantamos neste ano: a política, as pessoas que a conduzem, a ideia geral que se desprende do mandato de Hollande e, claro, as consequências”, diz Marthe, uma jovem de 27 anos, sem trabalho e sem moradia, que há um ano votou pelos socialistas com uma esperança que não se concretizou.
“Mas faz muito tempo que estamos nisso. Suportamos os anos de Sarkozy com a mesma linha geral e seguimos aguentando faz um ano sob um governo social-democrata. Nos roubaram o voto de uma maneira escandalosa”, afirma Pierre, empregado do correio presente no protesto e prestes a aposentar-se.
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Manifestação pró-esquerda reuniu milhares de simpatizantes na Praça da Bastilha em Paris
Popularidade
Apesar do sucesso da manifestação, as pesquisas mostram que a popularidade de Mélenchon se encontra estagnada desde o primeiro turno da eleição presidencial em abril de 2012, quando obteve 11% dos sufrágios.
Segundo a pesquisa da emissora i-Télé, divulgada nesta segunda-feira (06/05), 56% dos entrevistados que reprovam o primeiro ano do governo Hollande disseram ter votado nele nos dois turnos da eleição presidencial.
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Cartazes do partido conservador UMP (União por um Movimento Popular) mostram o Françõs Hollande ao lado da palavra “fracasso”
Atualmente, os dois políticos mais admirados pelos franceses em pesquisas de opinião são o ex-presidente Nicolas Sarkozy, da conservadora UMP (União por um Movimento popular), derrotado no segundo turno por Hollande em 2012, e a terceira colocada naquela disputa, a ultradireitista Marine Le Pen (Frente Nacional), que conquistou 18% dos votos nas últimas eleições. Em terceiro lugar, de longe, aparece Hollande.
O protesto de domingo, aliás, foi seguido de uma outra manifestação na quarta-feira (01/05) que reuniu centenas de apoiadores da Frente Nacional.
A resposta do governo
Em resposta aos protestos, o primeiro-ministro Jean Marc Ayrault disse ao canal televisivo TF1 que “não há austeridade, isso é invenção da propaganda”. Mas adicionou que entende a impaciência e que “nossas reformas são destinadas ao crescimento e investimento, não apenas à austeridade. Eles terão os frutos pouco a pouco”. O governo ainda estaria considerando cortar sua parte em algumas companhias semi-públicas para financiar investimentos, segundo o premiê.
O ministro da Economia, Jean-Pierre Moscovici, também saiu em defesa do governo: “A maioria dos franceses votou por esta política, não estão sendo enganados nem traídos”, disse em entrevist a uma emissora de televisão local. Segundo ele, a luta pelo crescimento e por novos postos de trabalho seguem no núcleo da ação governamental, que não pensa em aplicar planos de ajuste suplementares e nem “uma austeridade como na Grécia”.
Hollande ainda conta com o apoio de legisladores da centro-esquerda e do grupo sindical CFDT (sigla francesa para Confederação Francesa Democrática do Trabalho), que apoiam a reforma trabalhista e não se juntaram à manifestação.
* Com informações de Efe, Reuters, France24 e Página12