A comunicação no centro da disputa da hegemonia e ferramenta de dominação cultural e ideológica de uma classe sobre a outra. A partir dessa perspectiva “gramsciana” foram norteados os debates construídos no Seminário Comunicação, Emancipação e Integração na América Latina, realizado nos dias 22 e 23 de maio, na cidade de Foz do Iguaçu.
Julio Cargnano
Ana Fonseca (Unila), Leonardo Severo (CUT) e Pedro Carrano (Brasil de Fato) durante o lançamento do livro “Latifúndio Midiota”
Promovido pela Universidade Federal de Integração Latino Americana (Unila) e o Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Paraná (SindiJor-PR), Subseção de Foz do Iguaçu, o evento reuniu estudantes, professores, sindicalistas, jornalistas e militantes da comunicação e ligados a movimentos sociais.
As discussões partiram das experiências de democratização dos meios de comunicações realizadas em países da América Sul. O jornalista Leonardo Wexell Severo, assessor de comunicação da CUT (Central Única dos Trabalhadores) e membro fundador do site Barão de Itararé, apresentou suas impressões de coberturas jornalísticas realizadas nas eleições presidenciais na Venezuela e Equador e nas manifestações do 7D na Argentina. “A comunicação hoje é uma guerra, onde a mídia burguesa e neoliberal reproduz seu padrão de comportamento alienante”, disse.
Mariano Gallego, professor da Universidade de Palermo e pesquisador da Universidade de Buenos Aires, apresentou um panorama da Lei de Meios argentina, com seus avanços e falhas. Integrante da Rede Nacional de Investigadores em Comunicação, Gallego detalhou os 21 pontos básicos do direito à comunicação que embasaram a nova lei de serviços áudio visuais argentina.
Hernan Cazzaniga, reitor da UNAM (Universidade Nacional de Misiones), também contribui para o debate sobre a experiência argentina. “Nossa mídia tinha como característica maior a concentração, os oligopólios. Hoje, mais vozes têm acesso, com a divisão das concessões para três setores da sociedade, sendo 33% para o setor público, 33% para o setor privado e 33% para setores da comunidade e sem fins lucrativos”, expressou.
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O jornalista Wemerson Augusto ‘Ceará’, diretor do SindiJor-PR, fez uma provocação aos companheiros de mesa, apresentando os retrocessos do governo brasileiro no setor das comunicações em contraponto às experiências de outros países da América do Sul. Ceará citou as relações do Estado com a grande mídia, a perseguição às rádios comunitárias e a omissão em relação às deliberações da Conferência Nacional de Comunicação (Confecom), realizada em 2009.
“Hoje o governo está atrelado com aquilo que alguns militantes que simpatizam com o PT chamam de ‘PIG’ (partido da imprensa golpista). Uma prova disso é a concentração dos recursos públicos do setor para a mídia convencional. Isso me soa muito estranho”, apontou.
Mídia popular
Projetos de comunicação que dialogam com os trabalhadores também estiveram nos debates centrais. Pedro Carrano, repórter do jornal Brasil de Fato, trouxe a experiência do semanário que completou 10 anos em 2013. “A proposta (…) é uma visão popular do Brasil e do mundo. Um jornal que busca ser uma unidade na esquerda brasileira, que atua junto aos movimentos sociais e sindicais. Nosso projeto é anti-imperialista e anti-neoliberal”.
Carrano falou das dificuldades de fazer um jornalismo de esquerda. “Temos algumas experiências como a Radioagência NP, o próprio Brasil de Fato, algumas revistas, porém a lógica do mercado busca eliminar essas experiências”, disse o jornalista, trazendo um exemplo da Paraná Educativa, TV pública paranaenses. “Tínhamos o programa Projeto Popular, da Paraná Educativa, extinto pela atual gestão do governador Beto Richa [PSDB], assim como toda a programação própria da TV”.
Para Vito Gianotti, coordenador do NPC (Núcleo Piratininga de Comunicação), os trabalhadores precisam construir seus próprios veículos e utilizar todos os meios possíveis nesta disputa de hegemonia. “Sem comunicação, não há possibilidade de os trabalhadores implementarem seu projeto de sociedade, diferente dessa do individualismo neoliberal”.
Para Vito, a comunicação tem o papel de disputar o coração e a mente de milhões de brasileiros. “[Antonio] Gramsci cita que a hegemonia se dá pelo convencimento e pela força. Precisamos fazer essa disputa com aqueles que são inimigos de classe”.
Outro desafio, segundo Vito, é dialogar com aqueles que consomem a comunicação hegemônica. “Não adianta nós fazermos nossos jornais, termos nossa rádio, nossa TV para falar com quem já tem cabeça feita, falar para nós mesmos. Por isso precisamos ter um jornal diário de esquerda de grande circulação e uma televisão”.