A revelação sobre ações de espionagem da Abin (Agência Brasileira de Inteligência) contra diplomatas estrangeiros não pode ser comparada, tanto em escala, quanto em natureza, ao esquema global de vigilância organizado pela NSA (Agência de Segurança Nacional dos Estados Unidos), recentemente revelada pelo ex-agente da CIA Edward Snowden. A opinião é do embaixador brasileiro Rubens Barbosa, que também acredita que o caso não deverá causar nenhum incômodo diplomático ao Itamaraty.
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“O procedimento da Abin é normal e todo mundo faz. O problema é quando ele é revelado [publicamente]. Todos os países fazem e sabem que isso acontece com os outros”, afirmou o diplomata em entrevista a Opera Mundi. Barbosa foi representante do Brasil em Londres (1994-1999) e Washington (1999-2004).
Agência Senado
Segundo o embaixador Rubens Barbosa, prática da Abin é usual e difere da investigação a chefes de Estado
Para ele, o episódio se justifica como um caso de segurança nacional, versão defendida oficialmente pelo governo brasileiro. Os procedimentos realizados pela agência também foram normais, já que, em alguns casos, investigavam a possibilidade de espionagem em território nacional.
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“Em um dos casos, envolvendo diplomatas iranianos [a “Operação Xá”], a reportagem afirma que a ação teria sido realizada a pedido de outro país. Isso mostra apenas um entrosamento grande entre essas agências de segurança, que possuem acordos bilaterais para casos como lavagem de dinheiro, por exemplo. Trata-se de um acompanhamento não ostensivo, é uma prática muito usual”, explicou.
Estados Unidos
Já o escândalo que revelou a rede organizada pela NSA para espionar diversos países e alguns de seus líderes, de acordo com Barbosa, “atingiu um nível em que não se esperava chegar, surpreendendo a todos”.
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“Snowden era analista de uma agência de inteligência, saiu dela portando dados e divulgou informações envolvendo diversos países, envolvendo até o monitoramento de chefes de Estado. A escala é bem diferente, a natureza é diferente. Agora, em ambos os casos, é tudo espionagem”, lembra.
Uma das consequências do escândalo envolvendo a NSA é que alguns países foram obrigados a reconhecer que estão vulneráveis. “Por essa razão se discute agora um novo código de conduta, com o objetivo de deixar essas ações dentro de limites. Mas, estes não chegarão a ser divulgados”, e só daqui a alguns anos será possível saber se ele foi de fato respeitado, acredita o diplomata. Para Barbosa, a dificuldade nessa negociação é que, enquanto alguns países [Reino Unido, Canadá, Austrália e Nova Zelândia] compartilham as mesmas informações porque oferecem total cooperação aos Estados Unidos em matéria de política externa e segurança, outros como França, Brasil e Alemanha nunca atingiram o mesmo status, porque têm políticas independentes”.
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Segundo o embaixador, a revelação das ações da Abin também não deverá causar qualquer constrangimento ao governo brasileiro, que tem sido um dos críticos mais ferozes às ações da NSA, especialmente no caso em que foi revelado que a agência norte-americana espionava a presidente ilma Rousseff e alguns de seus principais assessores.
O caso
Nesta segunda-feira (04/11), o jornal Folha de S.Paulo publicou reportagem em que afirma ter obtido documentos que revelavam que a Abin monitorou diplomatas de diversos países entre os anos de 2003 a 2004 em território nacional. Entre eles estariam funcionários da Rússia, Irã e Iraque, além de uma sala alugada pela embaixada dos Estados Unidos em Brasília.
Os alvos foram seguidos e fotografados por agentes da agência. O governo brasileiro defendeu o procedimento, alegando se tratarem de “operações de contrainteligência” visando proteger o interesse nacional, e que sempre estiveram amparados pela lei.
O GSI (Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República), órgão ao qual a Abin é subordinada, afirmou que não tem como validar a autenticidade dos documentos, já que a Folha não lhe enviou cópias dos papéis obtidos. No entanto, o órgão reconheceu a existência das operações citadas.