O Congresso dos deputados da Espanha rejeitou nesta terça-feira (08/04), com 299 votos a favor, 47 contra e uma abstenção, a petição do Parlamento da Catalunha de realizar um referendo pela autodeterminação da comunidade autônoma. O resultado não foi uma surpresa já que tanto o PP (Partido Popular), que tem a maioria absoluta de deputados, como o PSOE (Partido Socialista Operário Espanhol), maior sigla de oposição, já tinham avisado que votariam contra a proposta.
A petição rejeitada no pleno de hoje era fundamental para o sucesso, por vias legais, do processo independentista do governo catalão. Segunda a Constituição espanhola, apenas o Estado central tem a competência para realizar um referendo, mas pode cedê-la para autonomias regionais quando estas realizem um pedido formal.
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Rafael Duque/Opera Mundi
Por 299 a 47 votos, o Congresso espanhol rejeitou o pedido do Parlamento catalão (foto) de realizar o referendo
Antes mesmo da votação, o presidente da Catalunha, Artur Mas (CiU – Convergência e União), que não viajou a Madri para expor seus argumentos, já havia afirmado que uma resposta contrária do Congresso não significaria o fim do processo político adotado por seu governo. Em seu lugar, Artur Mas enviou Francesc Homs, conselheiro da Presidência, que afirmou: “Hoje vamos procurar uma colaboração, gostaríamos de votar [na consulta] com a colaboração [do governo]. Se não, votaremos igualmente”.
Com esta negativa do Congresso, as vias legais para realizar um referendo nos moldes já divulgados pelo governo catalão diminuem consideravelmente. Segundo especialistas em Direito Constitucional espanhol, o Parlamento da Catalunha ainda pode aprovar uma lei que lhe outorgue a competência para realizar consultas não-vinculantes. Entretanto, o governo central deverá recorrer desta decisão, assim como fez em 2008 quando o governo do País Basco tomou a mesma iniciativa, mas viu sua lei ser considerada inconstitucional pelo Tribunal Supremo.
Além da elaboração de uma lei própria, Artur Mas também pode antecipar as eleições e utilizar o resultado do pleito como um indicativo da vontade da população, o que poderia aumentar a pressão política dentro do país. O último recurso legal possível é a reforma da Constituição, mas para isso, o partido do presidente catalão teria que contar com o improvável apoio do PP, já que este possui maioria no Congresso de deputados.
Agência Efe
Representantes do Parlamento catalão falaram no pleno espanhol: Jordi Turull (esq.), Marta Rovira (c.) e Joan Herrera (dir.)
Caso nenhum dos cenários legais seja viável, Mas calcula a possibilidade de realizar um referendo unilateral, sem a aprovação do Estado no dia 9 de novembro, data pré-agendada pelo governo. Entretanto, uma decisão como esta significaria uma crise política sem precedentes, já que obrigaria o Estado central a intervir na administração regional.
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Debate político
O debate sobre a consulta realizado antes da votação teve início com a defesa da proposta de referendo por parte de três deputados do Parlamento catalão, Jordi Turull (CiU), Marta Rovira (ERC – Esquerda Republicana da Catalunha) e Joan Herrera (ICV – Iniciativa pela Catalunha Verdes).
Enquanto Turull fez questão de citar a história da Catalunha afirmando que a comunidade autônoma é “uma das nações mais antigas do mundo”, os outros dois representantes do Parlamento catalão enumeraram alguns problemas causados pela crise econômica (despejos, resgate financeiro a bancos e reforma da lei do aborto) como motivos da falta de identificação dos catalães com a Espanha.
Em seguida, foi a vez do presidente do governo, Mariano Rajoy. O político do PP afirmou que a realização da consulta nos moldes propostos é inconstitucional e por isso não poderia aceitar a proposta. Ele ainda disse que “a soberania espanhola corresponde a todos os espanhóis, não existe soberania regional”.
Agência Efe
O presidente do governo, Mariano Rajoy, do PP: “não me fale da Escócia, eles têm pressuspostos históricos diferentes”
Sobre a constante comparação entre o processo de Catalunha e o da Escócia, que votará por sua independência ainda neste ano, o presidente foi enfático: “não me fale sobre a Escócia, eles têm pressupostos históricos e políticos diferentes dos nossos”.
Após a fala de Rajoy, a bancada foi ocupada pelo líder da oposição, o socialista Alfredo Pérez de Rubalcaba. O secretário-geral do PSOE defendeu abertamente a reforma da Constituição para que todos os cidadãos espanhóis se sintam cômodos dentro do país. “Não gostamos dos processos que obriguem os cidadãos a escolherem se querem ser catalães ou espanhóis quando sempre foram os dois ao mesmo tempo”, afirmou.
Rubalcaba finalizou afirmando que apesar de pedir um referendo sem vinculação legal, os planos futuros do governo catalão não são meramente consultivos. “Este referendo pode até ser juridicamente consultivo, mas também é politicamente vinculante”, declarou o político em relação à possível repercussão nacional que uma maioria a favor da independência causaria.
Votação dolorosa
Poucos minutos após a votação que rejeitou o pedido de referendo, Artur Mas declarou, desde a sede do governo catalão em Barcelona, que “alguns querem apresentar esta votação como um ponto final, mas como presidente da Catalunha, eu lhes digo que este não é um ponto final. A votação no Congresso, por dolorosa que tenha sido, não é um ponto final. Seguiremos em busca de um acordo. A vontade da Catalunha não pode ser parada por uma votação no Congresso dos deputados”.