Cecilia Silveira
“Chegou a hora de votar LGBT para salvar a sua vida”, avisa Ru Paul na página da campanha #VoteLGBT. Cada vez mais, de fato, a questão dos direitos das pessoas LGBT é uma questão de sobrevivência. Segundo o Grupo Gay da Bahia, houve 310 assassinatos de pessoas trans, lésbicas e gays no Brasil no ano de 2013. Isso quer dizer que uma pessoa foi morta a cada 28 horas no Brasil no ano passado – além das centenas de casos de agressões – apenas porque sua orientação sexual ou sua identidade de gênero instigou o ódio de alguém. Quando esses alguéns são responsabilizados por esses crimes, o ódio que os motiva não é considerado agravante, e não é penalizado.
Uma das maiores lutas do movimento LGBT é por uma lei nacional que criminalize a homofobia – termo que engloba não só o ódio a gays mas também a lésbicas e pessoas trans. Vale lembrar que esse ódio não afeta exclusivamente pessoas homossexuais ou transgêneras. A homofobia se manifesta a partir da intolerância a qualquer expressão de gênero ou de sexualidade que seja percebida como fora da norma que impõe padrões estreitos sobre o que é ser mulher e o que é ser homem. Ser heterossexual ou ser cisgênero (não ser trans) não é salvaguarda contra a homofobia, já que a pessoa homofóbica não pede atestado de homossexualidade ou transgeneridade para agredir e matar – para a pessoa homofóbica, “parecer viado” ou “parecer sapatão”, seja lá o que isso signifique, é o suficiente para justificar a violência.
O coletivo Põe Na Roda realizou um vídeo com pessoas que sofreram violentas agressões homofóbicas, entre elas uma pessoa heterossexual, para perguntar: “E se fosse com você?” No vídeo, Renata Peron conta como perdeu um rim em um ataque transfóbico; Caio Legítimo, homem heterossexual, comenta a agressão que sofreu por ter sido percebido como gay por um grupo de homens homofóbicos; André Baliera conta que foi espancado por reagir a ofensas homofóbicas enquanto atravessava a rua e Gabriel Cruz e Jonathan Favari relatam a violência por parte dos funcionários do restaurante onde jantavam juntos. Apesar de pecar pela falta do testemunho de mulheres lésbicas, o vídeo consegue passar a urgência da necessidade da criminalização da homofobia, e mais do que isso, a necessidade de um debate público sério sobre a violência contra lésbicas, gays e pessoas trans.
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O vídeo vem na esteira da discussão sobre os direitos LGBT nas eleições do próximo 05 de outubro, e também da campanha #VoteLGBT, lançada essa semana por um grupo de ativistas espalhadas pelo Brasil. Assim como a campanha Vote numa feminista, o foco da #VoteLGBT é o Legislativo. “As pessoas só pensam nas eleições presidenciais e esquecem que quem de fato elabora as leis são os legisladores. É importante ter representação nessas instâncias”, comenta Gui Mohallen, uma das pessoas na organização da campanha. O grupo inclusive explica o papel de deputadas e deputados estaduais e federais e senadoras e senadores, “responsáveis pelas leis” e “pela criação, revisão e defesa da Constituição”: a aprovação do projeto de lei 122/2006, que criminaliza a homofobia em todo o território nacional, por exemplo, depende diretamente das pessoas que ocupam esses cargos. Foi justamente a falta de representação LGBT (e a super representação de segmentos anti-LGBT) no Congresso que fez com que a PLC 122/2006 fosse “enterrada” pelo Senado em dezembro do ano passado.
Os segmentos anti-LGBT no Legislativo estão concentrados na bancada formada por parlamentares evangélicos e católicos ultra-conservadores, que ignoram o princípio de laicidade do Estado e insistem em tentar impor sua visão de mundo a todas as pessoas brasileiras, propondo disparates como o projeto de “cura gay” e barrando a aprovação de leis como o PLC 122/2006. A bancada evangélica na Câmara Federal conta hoje 66 parlamentares, e deve crescer em 2015, já que o número de pastores candidatos cresceu 40% das eleições de 2010 para as eleições de 2014: de 193 em 2010 para 270 candidatos que se declararam pastores ao registrar suas candidaturas esse ano, além dos 32 bispos e 16 padres candidatos nessas eleições.
Emilia Santos
A campanha #VoteLGBT é também uma resposta à tomada do Congresso Nacional por parlamentares com uma agenda explicitamente anti-LGBT. “A gente está muito preocupado com esse crescimento. Não somos contra os evangélicos, mas a bancada deles tem uma pauta conservadora e, muitas vezes, homofóbica”, explica Marcos Visnadi, também uma das pessoas que idealizou a campanha. Para ajudar geral a votar LGBT, o grupo reúne em seu site pessoas candidatas deputadas estaduais e federais e senadoras, de todos os estados, comprometidas com a causa. Para cada pessoa listada, o grupo fez três perguntas: “Quais são suas principais propostas para a população LGBT? Quais outras propostas da sua candidatura você gostaria de destacar? Qual sua mensagem para as eleitoras e os eleitores LGBTs?” Muitas já responderam, e suas respostas são disponibilizadas no site também para especificar o que cada pessoa candidata pretende fazer em prol das pessoas LGBT.
Há também outro ótimo recurso para orientar para a melhor escolha no dia 05 de outubro: a cartilha LGBT Eleições 2014, produzida pelo grupo LGBT Brasil, esclarece a importância de se atentar principalmente para o partido a que a pessoa candidata está filiada. O grupo chega a classificar os partidos em três categorias de acordo com seu comprometimento com a causa LGBT: hostis (PR, PRB, PP, PSC, PTC, PSDC, PRTB, PHS, PT do B, PSD, PRP, PTB, DEM, PROS, SDD e PEN), desfavoráveis (PDT, PMDB, PSDB, PT, PC do B, PTN, PMN, PPL, PCO, PSL) e favoráveis (PSB, PV, PPS, PSTU, PCB, PSOL). A cartilha traz comentários do grupo justificando a classificação de cada partido, e explica o peso do voto de cada eleitor, lembrando que o sistema de coligações pode fazer com que o voto a um candidato ou partido pró-LGBT acabe favorecendo candidatos e partidos com histórico de atuação homotransfóbica – por isso a importância de se informar e refletir bem sobre em que pessoa candidata e em que partido votar. “Queremos ressaltar que, embora sejamos apenas cerca de 10% do eleitorado, podemos ter muita força política, pois temos pais, irmãos, parentes e amigos que não são LGBTs, que nos amam e querem que nossos direitos humanos sejam respeitados”, finaliza a cartilha.
A #VoteLGBT chama todas as pessoas, independentemente de se identificarem como LGBT ou não, a se engajarem na luta: “Está mais do que na hora de pararmos de entender a causa LGBT como uma coisa do ‘outro’. LGBT é uma sigla que comporta TODOS nós, independente de orientação sexual. Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis, Amigos, Colegas, Pais, Mães, Irmãos, Primos, Tios, Avôs, Avós, Sobrinhos e todas as pessoas que, em comum, têm o amor pelo próximo. E ‘próximo’, pra quem perdeu a aula, não quer dizer ‘igual’. A diferença é a única constante entre os seres humanos. Amar e respeitar essas diferenças são alguns dos vários exercícios de humanidade que podemos e devemos praticar.”
Meu voto é feminista e LGBT, pra proteger eu mesma e as pessoas que eu amo. E o seu?