Um grupo de ex-militantes de esquerda chilenos lançou um movimento com o qual pretendem reivindicar, junto ao governo do Brasil, a liberdade para o chileno Mauricio Hernández Norambuena, preso desde 2002, pelo sequestro do publicitário Washington Olivetto.
Norambuena, também conhecido como Comandante Ramiro, é procurado no Chile, onde foi condenado por envolvimento no assassinato do senador conservador Jaime Guzmán, em 1991, razão pela qual o partido UDI (União Democrata Independente), de direita, vem pedindo sua extradição há quase dez anos, sem obter sucesso até o momento.
Reprodução/Facebook
Imagem da campanha no Facebook que pede a libertação do ex-guerrilheiro Mauricio Hernández Norambuena
Devido a essa situação, o movimento pró-Comandante Ramiro, denominado Coordenação Nacional em Favor de Mauricio Hernández Norambuena, defende que ele seja libertado e possa ir viver em outro país, por considerar que ele não teria como continuar em segurança nem no Brasil nem no Chile. Rafael Escorza, um dos representantes do movimento, afirma que o tratamento dado a ele é o de um preso político: “Mauricio nunca teve acesso a um processo isento. Ele cumpre todos os requisitos para receber benefícios carcerários, mas não os recebe, é tratado como um preso de alta periculosidade, mas não cometeu nenhum homicídio, tampouco se rebelou em prisão”.
NULL
NULL
Escorza também relata uma visita realizada pela família, em junho passado, quando tentaram entregar uma carta relatando sobre a mobilização dos ex-companheiros chilenos, o que teria sido negado pelas autoridades carcerárias da Penitenciária Federal de Catanduva, no interior paulista, onde cumpre pena pelo sequestro de Olivetto — Norambuena foi condenado pela Justiça brasileira a 30 anos de prisão, dos quais 13 já foram cumpridos.
Execução de senador e fuga cinematográfica
Mauricio Hernández Norambuena nasceu em Valparaíso, em 1958. Durante a juventude, foi atleta de tênis de mesa, e chegou a ser campeão nacional juvenil, mas sua militância nas Juventudes Comunistas o levou à clandestinidade, a partir do golpe de Estado de 1973, a partir do qual foi instalada a ditadura de Augusto Pinochet (1973-1990).
Divulgação/Campaña de solidaridad con Mauricio Hernández Norambuena
Grafite e cartaz em manifestação de ex-companheiros do Comandante Ramiro pedem libertação do ex-guerrilheiro
Nos anos 1980, Norambuena passou a formar parte da FPMR (Frente Patriótica Manuel Rodríguez), grupo guerrilheiro formado por ex-militantes de esquerda que apostaram na luta armada para derrubar a ditadura. No dia 7 de setembro de 1986, o “Comandante Ramiro” — codinome usado por ele dentro da guerrilha, e adotado também durante a operação de sequestro do publicitário brasileiro — participou do atentado contra o ditador Augusto Pinochet. Na ação, fez parte da equipe principal, a que disparou contra o carro do general. A operação terminou com cinco militares mortos, e onze feridos, mas o ditador saiu ileso.
O crime que o levou à prisão pela primeira vez aconteceu no dia 1º de abril de 1991. Dois militantes da FPMR emboscaram e assassinaram o senador Jaime Guzmán, após ele deixar o prédio central da Universidade Católica do Chile, onde dava aulas. Guzmán é considerado o principal colaborador civil e intelectual da ditadura, autor da Constituição de 1980, vigente até hoje. Pelo crime, Norambuena foi condenado à pena de prisão perpétua, apontado como o autor intelectual do crime.
Foi detido em 1993, mas conseguiu fugir três anos depois, após uma espetacular operação de fuga, que terminou com ele agarrado a uma corda, pendurado no helicóptero que levou o junto a outros três companheiros do FPMR a escapar da Prisão da Alta Segurança de Santiago. Depois da fuga, conseguiu atravessar a fronteira para o Brasil, e passou a viver no interior de São Paulo, usando o nome de Ramiro.
Precedente na Argentina
A esperança dos organizadores do movimento em favor de Norambuena se baseia no sucesso do caso de outro ex-líder do FPMR, Galvarino Apablaza, também condenado a prisão perpétua como autor intelectual do assassinato de Guzmán.
Apablaza foi preso em 2004, na Argentina. Em 2010, quando o processo para sua extradição ao Chile estava em vias de ser concluído, o governo da Argentina decidiu lhe outorgar asilo político, considerando que no seu caso se justificava a aplicação da Lei de Reconhecimento e Proteção de Refugiados, a partir de um informe emitido pelo Conare (Comissão Nacional para Refugiados). Desde então, o partido UDI, fundado pelo próprio Jaime Guzmán, vem tentando reverter a decisão.
Em maio deste ano, o ministro argentino Aníbal Fernández, chefe de gabinete do governo de Cristina Kirchner, reconheceu que o Palácio de La Moneda enviou uma consulta a respeito do caso de Apablaza, e que a resposta foi que “a posição argentina sobre o tema continua sendo a mesma”.