Atualizada em 12/11/2015
Mani Mostofi, diretor da Impact Iran, coalizão de ONGs de direitos humanos, e Omid Memarian, diretor da International Campaign for Human Rights in Iran, visitaram o Brasil na última semana em ‘tour’ inédito à América Latina, passando ainda por Argentina, Paraguai, Chile e México.
O principal objetivo da viagem, contam os dois ativistas iranianos a Opera Mundi, é denunciar as violações sistemáticas que ocorre no país, bem como pressionar outras nações latino-americanas a se posicionarem com firmeza no próximo Conselho de Direitos Humanos da ONU, que ocorrerá no dia 16 de novembro e debaterá a situação humanitária no Irã.
“Sabemos do histórico da América Latina de ditadura, violência e controle militar. Todas essas coisas nós experimentamos no Irã. E nós percebemos que esses países foram capazes de superar violações de direitos humanos dos piores tipos. Não é por acaso que ativistas iranianos prestam atenção constantemente no que ocorre na América Latina como um exemplo”, afirma Mostofi.
Arquivo pessoal
ONG dirigida por Mostofi, 39, luta pela cooperação entre autoridades do Irã nos órgãos de direitos humanos da ONU
Para o advogado que nasceu nos EUA, mas tem cidadania iraniana, é possível notar uma similaridade e é até possível traçar uma história em comum entre Irã e de alguns países latinos. “Vocês lutaram por esses valores que nós agora estamos lutando”, diz. “Claro, todas as nações têm seus problemas internos, mas, de modo geral, a gente percebe que os governos aqui buscam e tentam respeitar os direitos humanos, por isso, é exemplo”, acrescenta.
Além de ativista, Memarian é também jornalista e chegou a ficar confinado em uma solitária por dois meses em Teerã em 2004 sob acusações de perturbar a ordem pública. Aos seus olhos, os países da América Latina têm ganhado cada vez mais relevância nas relações com o governo iraniano, sobretudo o Brasil.
“O Brasil, como potência global, foi um dos principais pilares de contato do Irã diante das sanções ocidentais e tem um papel significante e crescente nas nossas relações externas, principalmente em termos econômicos. Mas creio que o país poderia também ser mais ativo em direitos humanos: essas coisas não são excludentes”, opina.
Acordo nuclear
Em 14 de julho deste ano, Teerã e o Grupo 5+1 (Estados Unidos, Rússia, China, Reino Unido, França e Alemanha) fecharam um acordo histórico, após 22 meses de negociações. Para muitos iranianos, o principal motivo de celebração é a eliminação progressiva das sanções, que estrangulam a economia local.
Arquivo pessoal
Além de ativista, Memarian também é jornalista e ficou preso durante dois meses em uma centro de detenção na capital, Teerã, em 2004
Em troca, o governo do presidente Hassan Rohani concordou em limitar o seu programa nuclear e em permitir a realização de controles periódicos da AIEA (Agência Internacional de Energia Atômica) em suas instalações – fato que ainda não está 100% resolvido na mesa de discussão.
Para ativistas como Mostofi e Memarian, contudo, a euforia da possibilidade de reabertura dos mercados oculta uma discussão mais ampla a respeito das violações de direitos fundamentais dos cidadãos iranianos e a necessidade da comunidade internacional manter-se firme e presente quanto a isso nesse processo de mudança paulatina.
Segundo os dois diretores das ONGs de direitos humanos, os próximos meses de 'pós-acordo' são muito importantes, pois formatarão, no mínimo, os próximos 10 anos de como se portará Teerã perante a comunidade internacional. Por isso, contam, vieram ao Brasil, não só discutir com políticos e diplomatas, mas também para se encontrar com acadêmicos, jornalistas, ativistas de ONGs como a Conectas e até a CUT (Central Única dos Trabalhadores).
EFE/Arquivo
Após acordo, população foi às ruas de Teerã celebrar fim de isolamento e das sanções que sufocam economia local
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“Nós estamos em um momento crítico para direitos humanos no Irã. Muitas organizações celebraram o pacto nuclear, mas a questão agora é saber como esse engajamento acontecerá de fato. Nós estamos falando de um aumento de relações diplomáticas e econômicas com países, mas, para nós, direitos humanos devem estar no topo máximo dessas prioridades”, alerta Mostofi.
“Os diplomatas e políticos estrangeiros devem considerar questões econômicas, mas também devem pressionar mais o governo iraniano a respeitar suas obrigações internacionais e os valores humanos”, completa Memarian. Neste ano, o Irã deve se tornar a nação com o maior número de execuções no mundo, pela primeira vez em mais de 20 anos, superando a China. Em média, o país persa executa três pessoas por dia.
EFE/Arquivo
Para grupos iranianos, o presidente da nação, Hassan Rohani, deve, agora, priorizar direitos civis agora
Mostofi e Memarian acreditam, também, que há uma falta de entendimento da comunidade internacional sobre o que de fato o presidente do Irã faz pelo país, dado que existem dois principais corpos políticos e o poder Judiciário funciona de modo autônomo.
Para os ativistas, Rohani é o rosto oficial que representa o povo internacionalmente, mas ele não é o homem que controla totalmente o país, tampouco tem capital político para exercer esse controle. O poder, dizem, está muito mais centrado na figura do aiatolá Ali Khamenei, líder supremo religioso da República Islâmica.
“Tem gente que diz que a situação do Irã não é tão má quanto a da Síria. Eu os pergunto: 'qual é a solução para a Síria?' e ninguém sabe a resposta. Agora, eu sei qual é a solução para o Irã: deixem os iranianos falarem por si mesmos, votarem livremente, participarem de uma sociedade vibrante em que tenham seus direitos garantidos. Há uma solução, vê? É mais tangível”, compara Mostofi.
Reprodução/Impact Iran
Gráfico mostra o aumento de penas de morte no Irã nos últimos anos – e a projeção para o próximo semestre de 2015