Em mais uma demonstração de força colonial, o governo espanhol lançou uma nova campanha de perseguição contra organizações bascas, chegando ao ponto de ameaçar até mesmo representações políticas legais e respaldadas por amplos espectros da população local, como o partido Sortu.
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Na última segunda-feira (30/10), 18 membros da organização Herrira foram presos nas quatro regiões históricas bascas (Álava, Guipuzkoa, Bizkaia e Navarra), acusados de “enaltecimento ao terrorismo”. O grupo, fundado há pouco mais de um ano, trabalha em prol dos direitos humanos e dos presos políticos bascos, ou seja, de presos, muitos deles torturados, pela Espanha, dispersos por cadeias em outras e distantes regiões, impedindo visitas familiares, sob acusações de pertencer à ETA ou de a enaltecerem.
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Logo após as prisões, o ministro do interior espanhol, Jorge Fernández Diaz, anunciou para as redes de televisão que “um tentáculo da ETA” havia sido cortado para, no dia seguinte, em tom de desmentido, declarar que “a ETA já não existe e não voltará a cometer atentados”.
A contradição causou revolta em parte da população basca, que exige o fim da perseguição política espanhola a organizações de solidariedade bascas.
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A ETA não comete um atentado há pelo menos quatro anos, tendo dado passos consistentes no caminho da resolução do conflito, subscrevendo a acordos políticos junto a diversas outras organizações da sociedade basca e anunciando claramente sua intenção de por fim à luta armada, esperando apenas um gesto por parte do governo espanhol – dos pós-franquistas do PP, Partido Popular – para sua dissolução.
Agência Efe (30/10)
Ação policial na sede da Herrira gerou revolta na população em Hernani, no País Basco
O governo espanhol por sua parte se recusa sequer a reconhecer a ETA como ator, exigindo seu fim unilateral e sem aceitar qualquer condição para tal. O que, para muitos, soa como provocação.
Não é de hoje que o termo “tudo é ETA”, usado com gosto tanto por lideranças do PP quanto do PSOE, se encaixa como uma luva nas políticas repressivas espanholas. A ETA tornou-se, já ha tempos, a desculpa ideal para sufocar o movimento nacionalista basco e a nova onda de prisões vem em um momento em que a Cataunha dá passos largos no caminho de sua soberania, o que pode vir a ser seguido pelo País Basco.
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A ETA, enfim, acaba se tornando o instrumento preferencial da Espanha na legitimação da repressão, ao passo que tal repressão faz apenas aumentar a revolta. Não é fácil compreender, então, o que leva a Espanha a insistir nessa via, a não ser a compreensão do passado recente do país, onde a repressão era a única lei.
A Espanha jamais passou por um processo de reconhecimento de seu passado. Os crimes de ontem foram esquecidos ou perdoados. Assassinatos, torturas e desaparecimentos, comuns mesmo após o franquismo, continuaram a ser ignorados sempre que as vítimas eram bascas (ou catalãs, galegas…) e isto acabou por criar o clima atual de medo, repressão e constante revolta.
Logo, a declaração de Fernandez Diaz sobra a ETA existir e não existir não surpreende, mas apenas retrata a situação onde é preciso acalmar a população espanhola com bravatas de que está tudo sob controle, mas aterrorizar a população basca e ampliar as investidas violentas contra ela em um momento em que o processo de paz caminha a passos largos – por iniciativa única e exclusiva da cidadania basca e em um processo interno de reconhecimento e perdão.
Os 18 membros da Herrira foram presos e tiveram suas sedes devassadas em uma decisão política, referendada por um Tribunal Constitucional de maioria conservadora e alinhada aos interesses do atual governo e com requintes de crueldade e provocação, visto que a ação foi realizada em sua maioria pela Guarda Civil Espanhola, quando a Ertzaintza – polícia regional basca – teria total capacidade de executar as ordens de prisão.
Mas é muito mais cinematográfico e manda uma mensagem muito mais poderosa usar a odiada Guarda Civil em uma ação política contra o processo de paz no País Basco.
E a ação foi vista por lideranças políticas, como Paul Rios (Lokarri), Oskar Matute (Alternatiba), dentre outros, como líderes do PNV (Partido Nacionalista Basco) e mesmo o Lehendakari (presidente regional) Iñigo Urkullu, como um passo atrás no processo de paz. Como uma ação política e absurda que visa apenas aterrorizar a população basca e provocá-la a reagir e implodir todo o diálogo que vem sendo feito entre diferentes autores e partidos ao longo dos últimos anos.
A paz não interessa à Espanha, pois a paz pode levar a uma união de forças soberanistas, como na Catalunha, que leve à dissolução do Estado Espanhol como conhecemos.