Quando se pensa na atuação das empresas brasileiras na Venezuela, vem à lembrança as tradicionais obras de infraestrutura, como siderúrgicas, teleféricos e hidroelétricas. Porém, um dos projetos desenvolvidos atualmente pela Queiroz Galvão visa sanear outro importante gargalo do país: a produção de alimentos. No caso do Projeto Agrário Socialista do Vale de Quibor, no Estado de Lara, a autossuficiência em tomate, cebola e pimentão, itens essenciais da dieta venezuelana.
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Estufa com mudas de tomates do Projeto Agrário Socialista do Vale de Quibor, no Estado de Lara, liderado pela Queiroz Galvão
Pouco industrializada, a Venezuela construiu sua economia na exploração do petróleo, importando a maioria do que se consome. O país é dono da maior reserva comprovada no mundo. Mas os reflexos da substituição de sua base agrícola e sua perspectiva industrial pelo recurso ao comércio exterior são especialmente sentidos no preço dos alimentos.
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Apesar do patamar de importação alimentar continuar próximo dos 70%, o governo analisa que ocorreram avanços estruturais no quadro agrário. Empresas como a Queiroz Galvão foram convidadas pelo falecido presidente Hugo Chávez para participar dessa missão de devolver à Venezuela a independência alimentar.
“Vínhamos desde 2007 fazendo prospecções comerciais e no final de 2009 assinamos o contrato de Quibor”, conta João Martins Jr., CEO da Queiroz Galvão na Venezuela. O projeto só começou a sair do papel em junho de 2010. “Grande parte da inflação da Venezuela parte dos alimentos, e dentre eles, o que mais influencia é o tomate. A importância do projeto está no fato de o Vale de Quibor ser essencialmente produtor de tomate, cebola e pimentão”, explica.
Elias Jaua, então vice-presidente venezuelano, inspeciona empresa agrícola do Vale de Quibor:
Atualmente, a região produz 120 mil toneladas/ano de alimentos e a projeção, com o projeto da Queiroz, é que ele passe a ter uma produção de 980 mil toneladas/ano. “A Venezuela atingiria autossuficiência desses três produtos”, afirma. Segundo o empresário goiano, há o desejo de que no local também seja desenvolvida a produção de laticínios, carne, frutas. “Há clima e qualidade para isso”, diz.
De acordo com Martins Jr., o projeto foi bem aceito em Lara. “Estamos fazendo o que é o desejo da população daquela região, independente da orientação política”, diz, garantindo que a Queiroz Galvão não sofreu qualquer tipo de resistência, inclusive do governador Henri Falcón, que é da oposição. Orçado em mais de 1,5 milhões de dólares, o projeto da Queiroz tem como contratante o INDER (Instituto de Desenvolvimento Rural), subordinado ao Ministério do Poder Popular de Agricultura e Terras.
Obstáculos
A área de influência do projeto é de mais de 46 mil hectares, sendo 26 mil deles agricultáveis. A primeira etapa, que contempla três mil hectares, já foi concluída. No entanto, não há água suficiente para a irrigação.
Um projeto de transposição da água do rio Yacabur, de mais de 30 anos, ainda não foi concluído pelo governo venezuelano devido a uma falha geológica – a promessa é a de que até 2015 o problema seja resolvido. “Não corresponde a nós [a conclusão da obra]”, explica Martins Jr.
Segundo ele, enquanto a água não chega, a empresa está desenvolvendo a infraestrutura básica da região, com a construção de escolas de capacitação – já existe um centro de formação agrário –, vias de acesso e rede elétrica. “A geração de emprego deve afetar 40 mil famílias”, estima. Uma vez concluído, a estrutura será de usufruto exclusivo da Venezuela.
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Projeto da Queiroz Galvão tem como objetivo a autossuficiência da produção de tomate, pimentão e cebola da Venezuela
Outro desafio foi lidar com a falta de pagamento ao longo do ano de 2011, fato que, de acordo com Martins Jr., não afetou o ânimo da empresa em investir na Venezuela. “Não foi nenhuma surpresa a forma de trabalhar aqui. E a Queiroz Galvão tem envergadura para suportar essa situação”, afirma, garantindo que o projeto nunca foi interrompido.
Ao analisar os últimos meses do cenário político venezuelano, especialmente com o prolongado período de tratamento de Chávez em Cuba, Martins Jr. disse não ter sentido dificuldades maiores no diálogo com o governo venezuelano. “Teve períodos piores com o presidente atuando com 100% da saúde do que nesses três meses”, salienta.
No entanto, ele indica que a empresa observa atenta ao novo processo eleitoral. “Qualquer mudança que vier do resultado das eleições pode afetar nossos projetos. Achamos que a possibilidade é pequena, porque o país precisa de infraestrutura e de alimentos. Parar o que estamos fazendo é remoto, porque não vejo como não avançaríamos nesses aspectos”, analisa.
Ele deposita a confiança dos investimentos na Venezuela na estratégica relação construída com o Brasil desde 2005, com a assinatura de um convênio bilateral entre o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e Chávez. “Nós nos inserimos nesse processo de apoio”, destaca Martins Jr. Segundo o empresário, o cuidado constante de ambos os países com o intercâmbio comercial se reflete no aumento dos contratos assinados. “Nós viemos para ficar”, conclui.
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