Cláudia, a heroína do mestre Milo Manara, em Clic
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Os quadrinhos para adultos perderam uma de suas principais vocações: estimular a masturbação. Autobiográficos ou irreais, eles colocam as fantasias para trabalhar e enterram de uma vez por todas as menininhas bobas e as festas eróticas com convidados fantasiados que os faziam parecer ultrapassados. Os quadrinhos eróticos e pornôs não se escondem mais no fundo das livrarias e exibem, agora, universos gráficos e roteiros elaborados.
Esse retorno literário erotiza-se sob as canetas e pincéis de Chester Brown e de seu esplêndido Pagando por sexo. Os quadrinhos contam como, depois do fim de um relacionamento e três anos de abstinência, Chester Brown decide só fazer amor com prostitutas. Na história, os corpos nus servem à autobiografia e às reflexões incessantes do herói.
Chester Brown não é um autor de quadrinhos eróticos propriamente dito, mas ele personifica bem uma das evoluções autobiográficas do gênero e um erotismo ultracerebral no qual também se destacam Loïc Néhou e Frédéric Poincelet, com o Essai de sentimentalisme.
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Kitsch e irreal
Com uma diagramação bem atraente e muito provocante, Joan Sfar lança um novo álbum, Tokyo, no qual ele “tenta voltar às coisas mais imbecis e mais poderosas que existem em quadrinhos, ou seja, o sexo e a violência”.
A revista em quadrinhos mistura fotos e desenhos. Sem ter nada de pornográfica, é, sem dúvida, a obra mais sexy de Sfar. Ela junta histórias sexuais e piadas sujas de todos os tipos, e traz desenhos de garotas com shorts curtos, armas de fogo e crocodilos em ambiente de filme pornô.
Bem mais quente, a nova coleção BD Cul da editora francesa Requins Marteaux aposta em autores inesperados, como Aude Picault ou Bastien Vivès. Com uma nota de nostalgia, os álbuns trazem de volta os formatos pequenos das revistas em quadrinhos baratas, impressas a partir dos anos 1950.
Entre os autores atuais, é Morgan Navarro (nascido em 1975) que combina, sem dúvida, com mais singularidade a excitação sexual, as piadas e o trabalho autoral. Seu Teddy Beat pulveriza todas as convenções de um gênero gráfico. Aqui, lidamos com um universo gráfico um pouco surrealista, com mulheres com cabeça de bolha e personagens animalizados.
Toque feminino
Morgan Navarro reivindica poucas influências em matéria de quadrinhos eróticos, mas cita de bom grado Giovanna Cassotto (nascida em 1962), a quem devemos Giovanna! Si! e Pornostar.
Com Aurélia Aurita (Morango e chocolate), Mélinda Gebbie, Nine Antico e Aude Picault, Giovanna Cassotto faz parte das autoras que deram um toque feminino a um gênero que ainda conta com uma maioria esmagadora de homens.
De acordo com Vincent Bernière, diretor da coleção Erotix, da editora Delcourt, e autor de uma bela Anthologie de la bande dessinée érotique, recentemente lançada, os quadrinhos eróticos ou pornôs das desenhistas são, com frequência, mais cerebrais ou menos voltados para a masturbação que os dos homens.
Mangás
O mangá permanece hoje como último bastião do pornô trash, com suas codificações e seus subgêneros: do hentai, que se prolifera na versão de anime nos sites pornô como Redtube ou Youporn, ao ecchi, mais delicado.
Uma enxurrada de mangás hardcore, abertos a todas as práticas sexuais, circula na internet. Bastante hipnotizante, a série Step up love story propõe uma iniciação sexual em um estilo bem suave (mas proibido para os menores de 15 anos). Os corpos não têm pelos pubianos e o desenho de um sexo ereto é propositalmente metafórico.
No total, 19 milhões de exemplares da série já foram vendidos no Japão e o volume 39 foi lançado na França em julho.
Pioneiros
A maioria esmagadora dos desenhistas atuais inspira-se nos pais dos quadrinhos eróticos. Joann Sfar cita álbuns antigos da Métal Hurlant e o RanXerox, herói de Tanino Liberatore. O mesmo faz Morgan Navarro, que cita também Georges Pichard e sua série Paulette.
O fato de vários autores dos anos 1970 e 1980 viverem agora uma segunda juventude, sem dúvida, não é estranho. Pois os quadrinhos adultos — seu mercado, em particular — resistem também graças a um precioso trabalho de reedição.
Sob o selo Drugstore, a Glénat reedita um dos mestres dos quadrinhos eróticos dos anos 80, Milo Manara (Clic, Kamasutra).
Desde 2009, na Delcourt, “a coleção Erotix reedita clássicos que não eram mais encontrados”, destaca seu diretor Vincent Bernière. Quadrinhos que marcaram a história do gênero, como os de Guido Crépax (Emmanuelle, Justine, A História de O. e Valentina) ou Magnus (As 110 pílulas).
Em um estilo abertamente pornográfico, redescobrimos também um óvni como Lost girls, assinado pelo autor de Watchmen, Alan Moore, e sua mulher, Melinda Gebbie. Esse tesouro da perversão foi — depois de muitos problemas de edição — traduzido apenas em 2008.
Quadrinhos sujos
De maneira mais informal, a web também se tornou uma mina de ouro em matéria de quadrinhos adultos.
A excelente plataforma Grandpapier publica histórias online e quadrinhos em diferentes formatos digitais. Vários autores que passam sob o radar dos editores apresentam lá suas criações e alguns entre eles mostram-se bastante inspirados em matéria de erotismo, como Grisfx ou Big Ben.
Além das toneladas de mangás que circulam, é também na internet que os nostálgicos celebram uma das idades de ouro dos quadrinhos eróticos com as Tijuana Bibles dos anos 30, também chamadas de “quadrinhos sujos” ou “oito páginas”, por causa do formato em fascículos baratos.
Os sites de amadores como o Tijuana-Bible ou os blogs de colecionadores são muito ricos e arquivam essa iconografia vintage genial, frequentemente anônima e satírica, que se apropria indevidamente dos ícones populares do entre guerras, em especial.
Entre criações, reedições e transmissões na web, os quadrinhos adultos não apenas ainda se mantêm em forma, mas também têm um belo caminho pela frente.
Tradução Bárbara Menezes
* Texto originalmente na Rue 89
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