Lust Lady: clube foi pioneiro na sindicalização e tornou-se uma cooperativa controlada pelas funcionárias
Saiba o que mais foi publicado no Dossiê #05: Mídia
Leia as outras matérias da edição nº 5 da Revista Samuel
Na última vez em que dancei num clube de strippers em Manhattan, paguei 80 dólares de “comissão da casa” para trabalhar. Levei broncas por me espalhar no sofá e por almoçar na hora errada, e voltei para casa com 40 dólares a menos do que tinha no começo do expediente. Depois de atuar tanto tempo nesta indústria marcada pela exploração, quis criar uma iniciativa que melhorasse as condições de trabalho para as strippers. Mas ao procurar outros ativistas envolvidos em campanhas pelos direitos dessas trabalhadoras, a reação geral foi um retumbante “não faça isso!” Eles não estavam completamente enganados.
Quando as dançarinas do Lusty Lady, um clube de peepshow em São Francisco, criaram um sindicato em 1997 chamaram a atenção para os direitos trabalhistas das strippers. A sindicalização e a consequente reformulação do clube, que acabou se tornando uma cooperativa controlada pelas funcionárias, foram vistas como o início de um movimento em que as profissionais dariam um fim às práticas discriminatórias que assolam o setor.
Quinze anos depois, o clube de São Francisco continua sendo o único do gênero sindicalizado nos Estados Unidos. Na maioria das boates, as condições de trabalho estão ainda piores, com dançarinas pagando até 300 dólares por turno para trabalhar e frequentemente voltando para casa endividadas com seus empregadores.
“Nunca conheci alguém que faça esse tipo de trabalho por qualquer outra razão que não ganhar o máximo de dinheiro no menor período de tempo possível”, diz Tempest, uma das profissionais envolvidas na sindicalização do Lusty Lady. Hoje, acredita que o esforço tenha sido contraproducente e coloca uma questão que as moças não podem ignorar: “Os clubes sindicalizados são compatíveis com o lucro?”
Apoie a imprensa independente e alternativa. Assine a Revista Samuel.
Processos trabalhistas
Tempest diz que a sindicalização do Lusty Lady piorou a vida das strippers, pois desencorajou os proprietários das boates em contratá-las legalmente. Para eles, o que aconteceu no Lusty Lady pode facilmente ser visto como um exemplo do que não deve ser feito.
Independentemente de a mudança na classificação das strippers — de funcionárias da casa para trabalhadoras independentes — ter ou não sido resultado do temor da sindicalização, ela certamente dificultou a organização pelos direitos trabalhistas das dançarinas. Nos Estados Unidos, por lei, trabalhadores independentes não podem se sindicalizar. E a eterna competição por gorjetas enfraquece a solidariedade entre colegas, necessária em qualquer tipo de organização no âmbito profissional.
Embora o status de trabalhadora independente tenha significado um enorme retrocesso no movimento pelos direitos das strippers, elas ainda não desistiram — apenas levaram a luta aos tribunais. Desde que os proprietários de boates se deram conta de que poderiam aumentar sua margem de lucro contratando as dançarinas como trabalhadoras independentes e cobrando “comissões da casa”, strippers de todo o país têm contestado a legalidade de tais práticas, processando clubes e alegando que elas são, de fato, funcionárias dos locais e não deveriam estar pagando para trabalhar. Os resultados dessas ações variam, mas na maioria dos casos os juízes decidem a favor das dançarinas, que recebem compensação pelas taxas que tiveram que pagar durante os anos de trabalho, assim como os salários aos quais têm direito como funcionárias.
Terceira via
É possível argumentar que se as dançarinas ganhassem tão mal assim elas já teriam desistido do trabalho. Mas para muitas de nós um emprego formal não é uma opção. Muitas strippers nos Estados Unidos são imigrantes ilegais, e várias não têm qualificação profissional ou experiência fora da indústria do sexo. Para essas mulheres, perder dinheiro três noites por semana para finalmente conseguir um cliente e voltar para casa com 250 dólares é melhor do que nada. Enquanto isso, as boates cobram suas comissões e sempre se dão bem.
O que fazer, então, se nenhuma de nós quer abrir mão dessa liberdade, mas seu custo está acabando conosco? Pode haver uma terceira via entre a sindicalização e os processos por direitos trabalhistas. Soube recentemente de uma boate na Califórnia que tem conseguido manter o equilíbrio entre liberdade e condições de trabalho justas. Não por acaso, é um clube criado e gerenciado por duas ex-strippers. No Ruby’s (nome fictício, a pedido das fontes), as dançarinas pagam a “comissão da casa” como trabalhadoras independentes. A diferença é que elas realmente são tratadas como tais, o que significa não ter compromisso com o clube, nem horários fixos.
Quando as garotas do Lusty Lady iniciaram o movimento por seus direitos em 1997, elas tinham um projeto e uma ideia de como as coisas poderiam evoluir. Hoje, muitas dançarinas não se entusiasmam tanto com a sindicalização, mas definitivamente também não estão interessadas em manter as coisas como estão.
Tradução por Carolina de Assis
* Texto publicado originalmente na revista norte-americana In These Times
NULL
NULL