Pela segunda vez na história do Mundial de Futebol, o Brasil é o país anfitrião do maior evento esportivo do planeta. Talvez a principal diferença entre o torneio de 1950 e o de 2014 esteja no alcance e na instantaneidade com que bilhões de pessoas acompanham os jogos, resultados e fatos relacionados à Copa.
Ao mesmo tempo em que o futebol e as Copas ganharam cada vez mais adeptos e torcedores, maior passou a ser a cobertura da mídia do evento que acontece a cada quatro anos. No caso do Brasil de 2014, são cerca de 20 mil jornalistas de todos os cantos do mundo relatando, fotografando e mostrando o que acontece no país.
A Samuel, agora em sua versão eletrônica, também dedica o período da Copa a trazer o que a mídia independente do Brasil e do mundo vem registrando sobre o antes, o durante e o depois do evento, seus participantes e espectadores. Textos e vídeos postados diariamente darão a medida dos diferentes olhares e observações que irão marcar o cotidiano dos 32 países representados no evento.
Veja todo o material do especial Samuel na Copa:
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Seleção australiana tem música oficial gravada por cantora pop
“Allez les bleus! Viva l'Algérie!”
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Honduras: onde o futebol explica a sociedade
Um amor tão grande pela Itália
Somos gigantes, somos fortes, somos os nigerianos
O bem-humorado fantasma uruguaio
Reprodução
A imagem do “Die Welt” mostra a equipe da seleção suíça de futebol desfalcada dos estrangeiros
Às vezes para evidenciar uma contradição basta o Photoshop. Foi o que fez o jornal alemão “Die Welt” há alguns meses, quando publicou uma imagem muito peculiar da equipe suíça. Somente Michael Lang, Fabian Schar, Reto Ziegler e Steve Von Bergen estavam presentes. Todos os outros jogadores tinham sido deletados. Alguns dias antes, o país tinha votado um referendo anti-imigração para limitar a presença de estrangeiros no território helvético. “Vejam o que essa mentalidade faria com a seleção de vocês”, era a mensagem da foto.
A Suíça é cabeça de chave do grupo E, e enfrentou os vizinhos da França, o Equador eHonduras no dia 25 de junho. Pelo menos no papel o caminho dos confrontos iniciais é sereno, portanto é válida a ambição de repetir o feito de 60 anos atrás, quando os suíços chegaram, em casa, às quartas de final. Coisa impensável até pouco tempo atrás, até que dois fatores se cruzaram e assim iniciou o apogeu futebolístico do país.
Em primeiro lugar, o trabalho de Ottmar Hitzfeld começou a dar frutos. O alemão, com 65 anos, é um dos treinadores com mais vitórias no futebol recente e um dos poucos a ter um estádio batizado em sua homenagem ainda em vida: o Ottimar Hitzfeld Stadium é o mais alto da Europa, situado nos dois metros metros de altitude de Zermatt, no sul da Suíça. Depois da Copa do Mundo, Hitzfeld deixará nas mãos do bósnio Vladimir Petkovic, ex-treinador do Lazio, um time surpreendente.
Carlos Latuff/Opera Mundi
Charge do Latuff: Em fevereiro, referendo na Suíça pelo “fim da imigração em massa” teve apoio de 50,4%
O outro fator determinante é representado pela ossatura da equipe, composta pela geração de talentos que em 2009 venceu o Mundial Sub-17. Naquele grupo havia poucos nomes que refletissem o trilinguismo em vigor no país. Haris Seferovic, Granit Xhaka, Ricardo Rodriguez são alguns dos jogadores deletados pelo “Die Welt”, mas a lista é longa.
Equipe multinacional
Entre os 30 jogadores convocados por Hitzfeld em 2013, 17 têm origens estrangeiras. O capitão é Gokhan Inler, que disputou uma partida no campeonato sub-21 contra sua Turquia de origem com a camisa suíça. “Meu pai se mudou para a Suíça por razões de trabalho quando eu ainda nem era nascido”, contou depois do referendo. “Passei toda a minha infância aqui. Na seleção não nos interessam as origens de cada jogador: somos todos suíços, fazemos parte do mesmo time e temos os mesmos objetivos”.
Na seleção e no Napoli, Inler divide o campo com Blerim Dzemaili, nascido na Macedônia em uma família albanesa, e Valon Behrami, também albanês, nascido no Kosovo. Uma história parecida à de Xherdan Shaqiri, talentoso meio campista do Bayern de Munique, além de Johan Djorou, zagueiro do Hamburgo, nascido em Abidjan, na Costa do Marfim, em 1987, foi adotado aos 17 meses de idade e passou a infância em Genebra.
A lista é longa: Gelson Fernandes vem de Cabo Verde; Philippe Senderos é metade sérvio, metade espanhol; Josip Drmic, Mario Gavranovic e Admir Medmedi vieram todos da ex-Iugoslávia. Os pais do goleiro Diego Benaglio eram de San Fedele Intervi, na província de Como, na Itália, o que tecnicamente faz dele um imigrante de segunda geração. Não é um fenômeno novo em um país em que os fluxos migratórios prosseguem há quase dois séculos e mais de 20% da população é composta por novos suíços. Alguns dos jogadores que fizeram a história da seleção têm sobrenomes como Turkyilmaz ou Yakin.
Tendência multiétnica
Nos últimos anos as políticas esportivas da confederação aceleraram o processo, investindo nas naturalizações. O resultado é um mix de tática e força física de fazer inveja a grandes nomes do futebol mundial.
A presença de equipes multiétnicas é um dos aspectos mais interessantes da Copa brasileira. Quem inaugurou a tendência há alguns anos foi a Alemanha. Depois do sonho desfeito de erguer a taça sob o céu berlinense em 2006, mudou-se a tática, e buscou-se privilegiar o rejuvenescimento da equipe e a integração. O resultado foi a maravilhosa geração de Ozil, Khedira e Boateng.
Nos últimos anos esse aspecto foi imitado por quase todos. Em parte pela Itália, seguindo outras dinâmicas, mas especialmente Bélgica, Estados Unidos e, finalmente, Suíça.
Quem torce o nariz para essa equipe pouco tradicional poderá reservar sua torcida a Fabian Schar. O zagueiro é a exceção no time de Hitzfeld. Nascido há 23 anos em Wil, em São Galo, cantão da Suíça profunda, até dois anos atrás jogava no time de sua cidade, onde se dividia entre o campo de treinamento e a agência bancária onde trabalhava meio-período. Logo se lançou e acabou no Basileia, onde há pouco venceu pela segunda vez o título helvético. Barcelona, Dortmund, Inter e Arsenal se estapeiam por ele. É mesmo um excelente jogador, mas não o suficiente para vencer um mundial sozinho.
Tradução Carolina de Assis
Texto originalmente publicado em Il Fatto Quotidiano, jornal impresso diário, criado em 2009, com sede em Roma.
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