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Homenagem de um site sirio de fotojornalismo de oposição a um fotógrafo morto em serviço em abril de 2014: repórteres encontram-se espalhados por Damasco e arredores
Em Damasco e sua área rural, movimentar-se de uma rua para outra significa passar por um ou mais postos de controle estabelecidos por militares ou forças de segurança. Na maioria dos casos, qualquer um que tente obter alguma informação falando com civis ou soldados, ou tirar fotos em lugares públicos, corre o risco de ser classificado pela mídia ou serviços de inteligência como um agente hostil. No entanto, repórteres da oposição, seja da mídia local ou estrangeira, continuam a transmitir notícias e informação de testemunhas da da capital e seus subúrbios.
Os repórteres estão espalhados pelos bairros de Damasco e nas várias frentes de combate no entorno da cidade. Eles pertencem aos canais de mídia, websites e páginas da mídia social da oposição que proliferaram nos últimos três anos, tais como as páginas no Facebook do Orient News e da Revolução Síria, e também Safa, Souria al-Shaab, Souria al-Ghad e outros. Isso se soma aos canais de mídia árabes e estrangeiros que se inclinam pela oposição e foram proibidos de trabalhar na Síria desde o despontar da crise, como a Al-Jazeera, Al-Arabiya, France 24, e outros.
Na maior parte, os repórteres desses órgãos trabalham em segredo, exceto uma minoria deles que atua abertamente em áreas sob controle da oposição. Seus escritórios e redações estão espalhados pelas cidades e capitais de países vizinhos e da região, em Istambul, Beirute, Amã, Riad, Doha, Dubai e outras. Assim tem sido desde que o governo os proibiu de trabalhar na Síria.
De acordo com fontes no Ministério da Informação da Síria, “eles lançaram uma guerra de mídia contra o governo sírio e o símbolo de sua soberania, representado pelo Exército. Nenhuma pessoa em sã consciência iria aceitar a mídia de seu inimigo atuando em seu território, ou acreditaria no argumento hipócrita de que são justos e objetivos”.
Cursos intensivos
Por causa da dificuldade de envio de repórteres estrangeiros para a Síria, as organizações da mídia oposicionista treinam um grupo de sírios em reportagem e uso de modernos meios de comunicação. Segundo fontes na oposição, centenas de jovens sírios da oposição participaram de cursos intensivos, principalmente em Istambul e Beirute. Mas o treinamento não se limita ao jornalismo.
“Além do treinamento em reportagem, edição e fotografia”, habilidades ensinadas a todos os alunos, “alguns deles estavam ligados a organizações de mídia da oposição e redes militares dentro da Síria”, disse Hassan al-Maydani (pseudônimo), que foi treinado em Istambul, em declaração ao “Al-Akhbar”. Segundo ele, para “facilitar as comunicações e a mobilidade e resolver o principal problema, de entrar e sair das áreas libertadas.”
Hassan descreveu algumas das técnicas ensinadas. Por exemplo, fotografar alguns eventos meramente para documentá-los ou garantir a autenticidade de um material específico para a mídia iria requerer câmeras pequenas, tais como as de telefones celulares ou aquelas em formato de caneta no bolso do repórter. “Esses métodos tinham sido usados antes para tirar fotos de manifestações e deslocamentos dos militares e da segurança nas ruas e regiões controladas pelo governo.”
Hassan indicou que “tarefas especiais”, que envolvam comunicação com outros combatentes, não são dadas a todos os trainees ou mencionadas diretamente nas palestras técnicas. “Em alguns casos, incluíam alguma motivação política”, acrescentou Hassan. “Um dos professores era um libanês que tinha um grande ódio do regime sírio. Ele costumava passar três quartos do tempo falando de política e dava sua palestra rapidamente no restante do tempo.”
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Reprodução da página no Facebook do Orient News, canal de TV via satélite com base nos Emirados Árabes: alternativas facilitam as comunicações em áreas libertadas
Câmeras escondidas
Recentemente, a TV estatal síria pôs no ar as confissões de Shayar Khalil, que transmitia de Damasco e entorno para o canal de TV via satélite “Orient News”. Ele foi preso em uma cafeteria no mercado de Sarouja, centro de Damasco. Levava consigo todo o equipamento e dados obtidos durante o trabalho. Sua aparição na televisão estatal, como repórter de uma estação “tendenciosa” conforme descrito pela mídia oficial, despertou o interesse de grande número de pessoas entre vários segmentos de espectadores.
O motivo do interesse foi o fator credibilidade no que Khalil dizia. Suas confissões tinham sido documentadas em vídeo e áudio. Depois de treinar em Istambul, ele conseguiu entrar em Ghouta, no leste da Síria, para reportar os acontecimentos de lá e se encontrar com comandantes insurgentes. Em um vídeo transmitido pela televisão síria, combatentes do grupo Exército Livre da Síria (ELS) parecem estar armando um confronto, alegando agir contra o Exército do país. Isso se somou aos vídeos pessoais mostrando Khalil e seus amigos trabalhando na preparação de reportagens.
Na mesma aparição na TV, Khalil diz que muitos jovens são convencidos a fazer esse trabalho perigoso, principalmente por receberem salários considerados altos na Síria, em torno de US$ 1.500, com a possibilidade de aumento. Para contrabandear equipamento para as áreas sob controle da oposição, a mídia oposicionista paga em média US$ 1.000 para a pessoa que puder transitar entre as áreas seguras e a zona de guerra. As câmeras, por exemplo, são escondidas, no carro, em uma caixa sob o banco do motorista.
No início, a mídia oposicionista começou de um modo desordenado, de acordo com observadores, e dependia do fenômeno das “testemunhas”. Mas qualquer pessoa podia contatar uma emissora e alegar ser uma “testemunha”, dando seu nome verdadeiro ou um pseudônimo.
Uma família relatou ao Al-Akhbar a história do filho de 15 anos. Os pais ficaram surpresos ao ouvir o nome do filho na Al-Jazeera descrevendo uma das manifestações. Começaram a procurá-lo e o encontraram em seu quarto falando no celular com a emissora. Ele tinha visto o número de telefone da TV na tela e lhes deu seu nome verdadeiro sem pensar nas consequências de seus atos.
Tradução Maria Teresa de Souza
Este artigo é uma tradução editada da edição árabe do Al-Akhbar, publicação eletrônica libanesa com foco em notícias e análises sobre países do Oriente Médio.