Solly Boussidan/Opera Mundi
Casas de sapé nas montanhas próximas a Maubisse. Ao fundo, o Monte Ramelau
Engana-se quem imagina que uma visita a Timor Leste se resume a conhecer Díli, capital do país e seus arredores. O interior timorense – nos chamados “distritos” – reserva excelentes surpresas. Entre paisagens espetaculares, os resquícios da colonização portuguesa e da brutal ocupação indonésia são ainda visíveis. Vilas típicas, arrozais e praias semivirgens pontilham a pequena nação do Sudeste Asiático, mas veículos 4×4 são necessários para transpor as pequenas estradas e trilhas off-road que levam aos pontos mais interessantes – um prato cheio para quem curte turismo de aventura.
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Criança timorenses em vila à beira da estrada – curiosidade e simpatia com turistas
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Por toda a costa, pontos de mergulho com barreiras de corais intocadas são um dos principais chamarizes de Timor Leste que, aos poucos, começa a aparecer no radar de mergulhadores mais intrépidos. A cultura local, com seu sincretismo entre o catolicismo e o animismo, toma contornos mais nítidos conforme a distância para a capital aumenta. Entre a montanha e o mar, Timor Leste apresenta um repertório exuberante de atrações e cultura.
Monte Ramelau
A cerca de 100 km a sudoeste de Díli, o Monte Ramelau – conhecido como Foho Tataimailau na língua Mambai falada localmente – é o ponto mais alto do país. Mais do que isso, ao longo de 153 anos foi também a maior montanha de Portugal e ainda hoje, do alto de seus 2.963 metros, ocupa a segunda posição entre as ex-colônias portuguesas (somente o Pico da Neblina, com 2.994 metros, no Brasil, o supera).
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A montanha é facilmente escalável em cerca de duas horas e, do alto, é possível ver as costas sul e norte do país. No entanto, parte da aventura de escalar o Ramelau é chegar até o monte.
As estradas tortuosas e esburacadas são intransponíveis durante a época de chuvas (outubro a março) e repleta de obstáculos durante o resto do ano – além de pedras e pontes improvisadas, elas são compartilhadas com búfalos, porcos, cabras e cães. Alguns “microlettes” – os micro-ônibus multicoloridos que preenchem o vácuo gerado pela precariedade de transporte local – também são uma opção.
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“Microlettes” coloridos e abarrotados de gente e carga cruzam as estradas do interior do país em alta velocidade
Durante o caminho pode-se ver diversas aldeias que ainda conservam de maneira muito viva as tradições e cultura timorenses – não é incomum se deparar com algum pequeno festival, com mulheres cantando e homens portando catanas (facões típicos) e trajando roupas típicas. Muitas das vilas possuem ruínas de fortes e igrejas portuguesas.
Aos poucos, as aldeias vão se espaçando e cafezais começam a surgir junto à estrada. O terreno fica mais íngreme e as montanhas começam a surgir. Aproveite o caminho para conhecer o Memorial de Dare, a cerca de 20 km de Díli, que reconta as incursões australianas com ajuda timorense durante a II Guerra Mundial.
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Mulher colhe café ao longo da estrada
Na marca dos 70 km, em meio a montanhas verdejantes, a encantadora vila de Maubisse é um excelente ponto de descanso, com vista para o Ramelau. A Pousada de Maubisse era a antiga residência do governador e é a melhor opção local para refeições e hospedagem, além de oferecer vistas panorâmicas das montanhas e da cidadezinha.
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Os últimos 18 km de estrada são também os mais desafiadores – o asfalto dá lugar à terra batida, mas a vegetação se torna ainda mais exuberante com alecrins e pessegueiros. A parada final é a aldeiazinha de Hatubuiliku, aos pés do monte. A vila serve como ponto de partida para a subida da montanha e não oferece muita infraestrutura, além de duas pequenas pousadas e um mercadinho. Ainda assim, é possível visitar algumas cascatas, além de ruínas de pontes, escolas e instalações militares da Indonésia.
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Ponte indonésia e flores no entardecer de Hatubuiliku
Grande parte dos visitantes opta por ver o sol nascer do cume do Ramelau – a subida geralmente se inicia por volta das 3h, e guias locais podem ser contratados para acompanhar os turistas.
Paraíso amaldiçoado
Na direção oposta ao Monte Ramelau, no extremo leste de Timor, o paraíso atende pelo nome de Jaco (ou, como preferem os nativos, Ilhéu de Jaco, uma ilhota com área de 10 km2 separada do restante de Timor Leste por um pequeno canal) e que exige sacrifícios para chegar.
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Corais e muitos peixes coloridos a poucos passos da areia tornam Jaco excelente ponto de snorkel e mergulho
Leva-se pouco mais de oito horas para se percorrer os pouco menos de 200 km que separam Díli e Walu, na extremidade da ilha de Timor – para chegar a Jaco é preciso contratar um barco de pescadores, o qual realiza uma travessia de 3 km.
O caminho exige espírito de aventura, com curvas e precipícios se sucedendo por uma estrada de difícil tráfego. Mantenha a câmera fotográfica à mão – arrozais e casas sagradas animistas aparecem por todo o caminho. A vila de Ioro é especialmente fotogênica.
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Praia de Jaco faz com que visitante se sinta em um cartão postal
Baucau, segunda maior cidade de Timor-Leste, está a 122 km de Díli e é um bom ponto para fazer uma pausa na jornada. A única atração realmente turística da cidade é o antigo mercado municipal português, mas há também uma bela praia com bons pontos de mergulho e snorkel a 5 km do centro. É recomendável procurar informação localmente antes de entrar no mar, pois com frequência há crocodilos de água salgada nas redondezas.
A suntuosa Pousada Baucau é um dos melhores hotéis de Timor Leste e possui um excelente restaurante especializado em gastronomia portuguesa – como sobremesa há a opção do creme de natas (versão lusitana do crème brûlée) preparado em quantidade reduzida e comumente reservado com antecedência por hóspedes e turistas.
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Vista de Walu a partir de Tutuala
Seguindo para o leste, a estrada literalmente termina na vila de Tutuala, a cerca de 2h de viagem, onde há uma vista espetacular de Jaco e da praia de Walu, 8 km morro abaixo. É impossível realizar a descida sem um veículo com tração nas quatro rodas. A trilha é feita de pedregulhos e lamaçais, tomando no mínimo 1h para ser transposta.
Após tantas dificuldades, o prêmio vem na forma de uma praia espetacular. Não espere muita infraestrutura – Walu possui apenas duas pequenas pousadas sem chuveiro ou água encanada, mas dormir (geralmente em barracas) de frente para o mar turquesa vale os inconvenientes.
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Casas sagradas, em arquitetura típica, na estrada que liga Díli a Baucau
A pequena ilha de Jaco está bem diante das pousadas, mas não é possível pernoitar lá – os timorenses acreditam que a ilha é ao mesmo tempo sagrada e amaldiçoada por espíritos ancestrais e por inúmeras vítimas assassinadas aí pelos indonésios. Durante o dia é possível contratar pescadores para realizar a curta travessia por cerca de seis dólares por pessoa.
Pisar em Jaco é como ser transportado para dentro de um cartão postal – uma praia deserta de areia branca e fina, emoldurada pelo mar, que brilha em múltiplos tons de azul. Não é preciso sequer entrar na água para avistar corais e peixes multicoloridos. A perfeição, entretanto, ganha contornos de magia com a frequente visita de grupos de até 50 golfinhos – o surrealismo da paisagem é suficiente para convencer os visitantes de que Jaco é realmente um sinônimo de paraíso.