Incrustado no polêmico quadrilátero fronteiriço entre Israel, Síria, Iraque e Arábia Saudita, o reino da Jordânia parece um lugar minimamente perigoso à primeira vista. Apesar de todos os preconceitos que teimam com os arredores, a Jordânia é a escolha certa para quem quiser provar a maravilhosa experiência de conhecer um país árabe e superar todos os clichês do choque cultural para imergir na sua fascinante história.
Patrícia Dichtchekenian/ Opera Mundi
Locais tocando instrumentos na arena romana do sítio arqueológico da cidade de Jerash a 50km da capital
Apesar da vizinhança em constante conflito, a Jordânia é um país em paz. A última disputa em que esteve envolvida foi com Israel, em um confronto territorial pela região do Rio Jordão, que corta ambos os países e é importante não apenas pela sua relevância religiosa, mas sobretudo por abastecer a desértica área que atravessa. O fundamento da disputa é claro: a Jordânia é composta 70% por deserto e frequentemente está no ranking dos dez países mais escassos em água do mundo; ao passo que Israel também paga caro para manter suas reservas hídricas regulares.
No entanto, em 1994 os dois vizinhos assinaram um acordo de paz e hoje a Jordânia é o único dos 22 países árabes do mundo que mantém relações estáveis com Israel. Tanto é que uma das maneiras mais interessantes de se chegar lá é por meio de uma das três passagens terrestres que liga os dois Estados. Os trâmites fronteiriços para atravessar são demorados, pois os países realizam uma vistoria rígida para evitar potenciais atentados. Segundo locais, na maior parte dos casos não se desconfia do turista, mas teme-se que grupos árabes extremistas coloquem bombas escondidas embaixo da roda de ônibus de turismo – situações que já aconteceram anteriormente.
Na entrada do país, observa-se logo de cara a presença de inúmeros outdoors com fotografias de pessoas sorridentes e altivas por todas as partes. Trata-se de propagandas ufanistas do rei, Abdullah II bin al-Hussein, e de sua família real. Segundo locais, o monarca goza de grande popularidade no país. O nacionalismo também é notado pela quantidade de bandeiras: cada cor representa uma dinastia muçulmana e o triângulo, o triunfo do povo árabe sobre o Império Otomano.
Amã
No caminho para chegar à capital, Amã, a monotonia da paisagem desértica é quebrada pelas tendinhas dos mais de 40 mil beduínos que habitam a Jordânia. Outrora grupos árabes nômades, os beduínos dos tempos atuais geralmente têm uma moradia fixa, mas tentam manter algumas tradições e estilo de vida das tribos passadas. “Hoje, são moderninhos e até tem Wi-fi”, brinca um jordano.
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Vista da capital do país, cuja arquitetura monocromática é um dos seus principais diferenciais
Como cerca de 95% da população é muçulmana, a cada três ou quatro quilômetros há uma mesquita na cidade. Uma das mais fascinantes é a do Rei Abdullah, cuja imensa e bela cúpula azul destoa do cenário de edifícios uniformes de pedras claras da capital. Os terrenos no centro são considerados muito caros pelos cidadãos. Então, uma das alternativas que muitas famílias encontraram foi verticalizar as moradias de acordo com cada geração: no primeiro andar ficam os avós; no segundo, os pais; e no terceiro, os netos. Com a guerra civil na Síria, a Jordânia hospeda cerca de 500 mil refugiados, no entanto, apenas os mais ricos conseguem alugar um apartamento lá – os mais pobres ficam alojados em acampamentos na proximidade da fronteira.
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A mesquita Rei Abdullah é uma das mais belas de Amã e contrasta com os edifícios da cidade
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Quando fundada, Amã chamava-se Philadelphia. Em pleno desenvolvimento econômico, a capital não tem um mote propriamente turístico. Contudo, é uma experiência interessante passear pelo seu centro revitalizado circundado por prédios monocromáticos que disputam espaço com novos arranha-céus de vidro espelhado. Igualmente surpreendente é a quantidade de shopping-centers com lojas típicas do Ocidente. É comum ver homens de roupa casual, fumando um narguilé, acompanhados de mulheres completamente vestidas de burcas tomando um café no Starbucks.
Nas compras, nada tem um preço fixo e tudo é passível de barganha, tirando o álcool, que é caro por lei (uma latinha de cerveja local tem o custo mínimo de US$ 7 – quase R$17). “Podem-se negociar artesanatos, joias, ouros, casas, e até mulheres”, diz um nativo. Apesar de ser permitido ter mais de uma esposa no país, os habitantes afirmam que essa prática é rara, já que varia de acordo com as crenças e, principalmente, com o dinheiro, pois há diversas leis que protegem as mulheres. Ali, elas têm a liberdade de ser mais ou menos religiosas, mas a lei exige que ela se vista com pelo menos um lenço – e até a publicidade dos outdoors respeita isso.
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Desenvolvimento econômico da metrópole apresenta comércio com influências de lojas do Ocidente
Jerash
De maneira geral, Amã é uma região de passagem para o turismo, mas de parada obrigatória, pois é uma das mais importantes capitais do mundo árabe. Uma preciosidade turística é também conhecer os resquícios de um bem-conservado teatro romano nas proximidades do centro. Entretanto, para quem se interessa em construções da era romana, a melhor alternativa é visitar a cidade de Jerash, a apenas 50 quilômetros de Amã.
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Ruínas de Jerash: uma das cidades romanas de província mais bem preservadas
A herança romana faz de Jerash o segundo destino mais visitado da Jordânia, ficando atrás apenas de Petra. A cidade, que tem uma história de presença humana que data de mais de 6.500 anos, foi fundada no século 1 a.C., mas seus monumentos são datados a partir do século 2 d.C. A era de ouro de Jerash foi durante o domínio romano e o local é hoje reconhecido como uma das cidades romanas de província mais bem conservadas do mundo, apesar de ter passado por dois terremotos que destruíram parte do local nos séculos VIII e XX.
Escondida durante séculos na areia, Jerash foi escavada e restaurada nos últimos 70 anos. O curioso é que as ruínas ficam situadas no meio de uma cidade movimentada, com trânsito e comércio movimentado. Entre as principais atrações do sítio arqueológico estão o hipódromo; as ruínas da Cardo, a rua principal da cidade; os 12 portais de entrada; o fórum; e, principalmente, as arenas, onde acontecem exibições de shows até hoje.
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Uma das arenas do sítio arqueológico fundado no século 1 a.C. e restaurado há 70 anos