Líderes das principais corporações do planeta e importantes chefes de Estado passaram cinco dias, de 28 de janeiro a 1º de fevereiro, na cidadezinha suíça de Davos, debatendo alternativas para salvar o sistema de liberalização de mercados idealizado no mesmo local, 15 anos atrás. A 39ª edição do Fórum Econômico Mundial chegou praticamente a um consenso sobre a necessidade, e até urgência, de intervenção estatal no mercado financeiro. Isso foi importante? Foi útil? Foi de fato uma novidade ou apenas trouxe à tona uma discussão que já se fazia longe dos microfones?
A conclusão soou como um reconhecimento de culpa – e, pela primeira vez, não destoou das vozes populares do Fórum Social Mundial: o Estado deve ser mais atuante e retomar seu papel de regulador de mercados. “Constitui-se uma ideologia e vendeu-se um consenso segundo o qual o mercado se auto-regulava. Não havia limite legal para a ganância no mercado financeiro. Os economistas que alertavam para isso eram demonizados”, diz o economista Marcos Fernandes Gonçalves, coordenador do curso de Economia da Fundação Getúlio Vargas.
Ele lembra que há mais de uma década, muitos alertavam para os riscos do mercado auto-regulador e considera simbólico que um dos maiores críticos desse sistema, Paul Krugman, tenha recebido o prêmio Nobel de Economia de 2008 – ainda que não por suas críticas, mas por seus trabalhos técnicos em economia regional e urbana. “Os dados eram evidentes, o sistema financeiro estava operando num ambiente instável e qualquer rompimento de contrato levaria ao colapso. Depois que tudo acontece, é fácil todos abraçarem o mesmo discurso. Davos foi importante, mas é patético”.
Em Davos, foi unânime a constatação de que a falta de regulação – especialmente do mercado financeiro norte-americano – foi uma das principais causas da crise. O cientista político Ricardo Caldas, professor do Instituto de Ciência Política da Universidade de Brasília, frisa que o Estado regulador sempre foi aceito tanto por conservadores quanto por liberais intervencionistas. Agora, segundo ele, a discussão refere-se ao tamanho da atuação do Estado.
As medidas emergenciais pós-crise adotadas pelas nações mais ricas do planeta já apontavam a tendência do Estado intervencionista, com injeção de capital em bancos e empresas e até aquisição de ativos. “Davos foi importante porque fez uma mudança de rumo. Os defensores do Estado mínimo saíram enfraquecidos. Prevalece a idéia de que o Estado deve intervir até mesmo na produção”, avalia.
A vez do G20
Ao final, governantes e executivos concordaram sobre a necessidade de cooperação para respostas articuladas à crise e admitiram que o debate sobre os rumos da economia mundial não pode mais se limitar ao G8. A chanceler alemã Angela Merkel chegou a propor a criação de um conselho da ONU (Organização das Nações Unidas) para questões econômicas, nos moldes do Conselho de Segurança criado após a Segunda Guerra Mundial.
De concreto, há o reconhecimento do G20 como instância adequada para tal diálogo. O grupo, criado para articulação entre presidentes de bancos centrais e ministros de finanças das maiores economias desenvolvidas e em desenvolvimento – incluindo o Brasil –, teve seu primeiro encontro de chefes de Estado em novembro passado, em Washington, e voltará a se reunir no dia 2 de abril, em Londres.
“O G7 mais Rússia hoje é irrelevante. A partir de agora, o G20 passa a ser algo relevante. Mas quem tem que liderar esse processo é aquela que continuará sendo a maior economia do mundo, os Estados Unidos”, opina Marcos Fernandes Gonçalves.
Resta saber qual será o impacto das medidas do presidente Barack Obama para sanear e restaurar a confiança na economia norte-americana. O pacote já foi aprovado na Câmara dos Representantes e agora tramita no Senado. O presidente enfrenta dificuldade na negociação com os republicanos.
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