No programa 20 MINUTOS ANÁLISE desta terça-feira (01/06), o jornalista e fundador de Opera Mundi, Breno Altman, refletiu sobre a tática da esquerda para enfrentar Jair Bolsonaro, especialmente a política de alianças e a sucessão presidencial.
Para ele, a anulação das sentenças de Lula e a recuperação de seus direitos eleitorais representaram o surgimento de uma nova cena política, “que se consolidou com as importantes manifestações do dia 29 de maio”.
“A decisão do ministro Edson Fachin, confirmada pelo pleno do Supremo Tribunal Federal, que também reconheceu a suspeição do ex-juiz Sérgio Moro em todos os processos envolvendo o líder petista, constitui-se na maior vitória das forças progressistas desde 2014, quando a presidente Dilma Rousseff foi reeleita. Depois de sete anos no sal, a esquerda voltou a ter um triunfo importante”, ressaltou.
A partir desse episódio, o jornalista avalia que houve uma mudança no palco principal da disputa política. “Até então, era ocupado por um confronto entre forças conservadoras: o neofascismo, representado por Bolsonaro, e a oposição de direita, formada pelos velhos partidos burgueses, como o PSDB, o DEM e o MDB, que diferem apenas na via política para implementar a agenda defendida pelo grande capital”, destacou.
Na avaliação de Altman, agora há uma polarização clara entre o neofascismo e o campo progressista, protagonizado por Lula e o Partido dos Trabalhadores. De acordo com ele, outro elemento que consolida a polarização é o enfraquecimento da fração liderada por Ciro Gomes.
“Seu cálculo previa carregar parte dos votos progressistas, capturar segmentos antipetistas ao centro e assumir o comando da oposição no segundo turno das eleições presidenciais, afastando tanto o PT quanto a direita neoliberal. Com a perspectiva de Lula ser candidato, essa estratégia aparentemente foi por água abaixo. O ex-governador cearense decidiu, então, incrementar seus ataques ao petismo, se desassociando do campo progressista e se apresentando à oposição de direita como uma alternativa capaz de resgatar a ‘terceira via’”, ponderou.
Desgaste de Bolsonaro
À reabilitação eleitoral de Lula soma-se ao desgaste do governo Bolsonaro, na análise de Altman, “que gera um efeito gangorra, impulsionando o crescimento de Lula nas pesquisas eleitorais”.
Do ponto de vista da militância, esses fatos estão incitando esperança e indignação: “O gosto da vitória fez com que setores importantes das massas populares recuperassem confiança na sua própria capacidade de luta e fossem regenerados os laços de identidade com os partidos de esquerda, bastante esgarçados com as seguidas derrotas no pós-2014”.
Por isso, na opinião do jornalista, as manifestações do dia 29 de maio, alinhadas pelo Fora Bolsonaro, demonstraram força. “Os partidos de esquerda e os movimentos sociais tiveram o tirocínio e a coragem de fazerem o que deveria ser feito: romper a inércia, retomar a ofensiva, mover multidões, construir na luta a frente e a alternativa de esquerda contra o governo Bolsonaro”, reforçou.
Para ele, não sair às ruas “seria ceder espaço para a continuidade do governo da morte e perder uma janela de oportunidade para consolidar a única saída positiva à classe trabalhadora, aos pobres da cidade e do campo: asfaltar o caminho para um novo governo democrático e popular, disposto a aplicar um programa contra o neofascismo e o neoliberalismo, de reconstrução da democracia e da soberania nacional”.
Celebrando as manifestações, Altman disse que teria sido um erro adiar ir às ruas, mesmo com os riscos, sendo agora a hora de se aproveitar da “vulnerabilidade dos inimigos” para ir à ofensiva, antes de que o bolsonarismo possa se recuperar.
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Na avaliação de Altman, há uma polarização entre o neofascismo e o campo progressista, protagonizado pelo PT
“Como em uma luta de boxe, ataca-se o adversário quando ele está mais frágil, jamais se deve dar a chance de que ele recupere o equilíbrio e as condições de combate”, disse.
Frente ampla ou frente de esquerda?
Mas, então, qual seria a melhor forma de exercer essa ofensiva? Com frente ampla ou frente de esquerda? O atual cenário favorece a construção de alianças, na visão de Altman, que defendeu uma frente progressista.
“Isso não significa excluir acordos e compromissos com lideranças ou setores de fora do campo popular, mas fazê-los a partir de uma clara hegemonia de esquerda e a partir de um objetivo límpido: derrubar o governo Bolsonaro. Não se trata de a esquerda ir ao centro, do PT ir ao centro, mas de estabelecer uma dinâmica onde frações do chamado ‘centro’ sejam atraídas às bandeiras de esquerda ou obrigadas a caminhar nessa direção, para não ficarem a mercê de Bolsonaro e se enterrar de vez na opinião pública”, justificou.
O jornalista rejeitou a possibilidade de abrandamentos programáticos para atrair ditos setores, “separando a luta contra o bolsonarismo do combate ao neoliberalismo”. Ele acredita, inclusive, que esses argumentos valem também para a tática eleitoral.
“Formar uma coalizão de esquerda – cujo arco de alianças incluiria o PT, o PSOL, o PCdoB e o PSB, além de setores progressistas descolados de outras agremiações – sob um claro programa anti-sistema, de oposição ao neofascismo, ao neoliberalismo e ao imperialismo, tem potencial de impulsionar uma tremenda mobilização social, colada à campanha contra Bolsonaro já em curso, capaz de consolidar Lula no segundo turno e levá-lo à vitória, estigmatizando o bolsonarismo como o inimigo a ser abatido no segundo turno”, defendeu.
Para além da vitória nas urnas, ele chamou atenção para a necessidade de aproveitar o atual momento político para se ter governabilidade social, no caso de triunfo, “que possam pressionar as instituições e criar maiorias em favor de reformas estruturais, absolutamente indispensáveis para retirar o país da crise”.
Altman listou a revogação da emenda do teto de gastos, da “regra de ouro”, da independência do Banco Central, a recuperação da Petrobrás e a realização de uma reforma tributária como medidas prioritárias de um novo governo de esquerda, que só terá força para realizá-las com apoio popular.
“Também se revela essencial a tarefa decisiva da reforma do Estado, mudando o sistema político-eleitoral, liquidando a tutela militar e democratizando o sistema de justiça. Esse conjunto de medidas depende da abertura de um novo processo constituinte, cujas possibilidades recaem sobre uma articulação adequada entre o governo popular e sua base social, a ser construída durante as lutas presentes e o processo eleitoral”, agregou.
E concluiu: “O país está arrebentado, no pior período de sua história. O clima de exaustão e indignação também chega aos setores médios, que se radicalizam e estão dispostos a ouvir o PT e a frente de esquerda. Temos diante de nós a possibilidade de uma inversão significativa na correlação de forças, disparando uma ofensiva inédita do campo democrático e popular. Os riscos são grandes, a crise é muito profunda, mas são nessas horas que os povos e suas vanguardas fazem história”.