No programa 20 MINUTOS ANÁLISE desta terça-feira (16/11), o jornalista e fundador de Opera Mundi, Breno Altman, refletiu sobre o significado de uma chapa composta pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o ex-governador de São Paulo Geraldo Alckmin para as eleições presidenciais de 2022. Na sua opinião, traria apenas danos à esquerda.
A informação de que a aliança estaria sendo viabilizada foi dada pela jornalista Mônica Bergamo, da Folha de S.Paulo. Mas Altman lembrou que ela foi desmentida pela presidenta nacional do Partido dos Trabalhadores, Gleisi Hoffmann, alguns dias depois
“O ex-presidente Lula, de uma forma sutil, também esvaziou essa tese, embora sem descartá-la claramente. Lembrou que Alckmin era o 22º candidato a vice que indicavam a ele, quando sequer sua própria candidatura está formalmente decidida. Mas o fato é que essa ideia, a ideia Lula-Alckmin, ganhou vida própria”, destacou.
A operação, de acordo com o jornalista, nasceu de Márcio França, filiado ao Partido Socialista Brasileiro e pré-candidato a governador paulista, que a teria transmitido para Fernando Haddad. Esse, por sua vez, teria comentado a hipótese com outros dirigentes petistas. “O diz-que-diz acabaria chegando à colunista da Folha e a outros jornalistas”, contou.
Para ele, o cálculo de França visava seu próprio benefício. Pois, se Alckmin deixasse o PSDB, indo para o PSB ou PSD, sendo vice de Lula, o caminho estaria aberto para que assumisse a cabeça de chapa na disputa pelo governo de São Paulo, convencendo Haddad a ser seu vice ou se candidatar ao Senado.
Frente ampla
Altman apontou que, para além de entusiasmar algumas lideranças regionais do próprio PT, a aliança chegou a agradar setores de esquerda que viram na proposta de França a possibilidade de desenvolver a chamada “frente ampla” contra o presidente Jair Bolsonaro.
“O argumento é de que um acordo com essa amplitude seria essencial para a vitória de Lula, talvez até no primeiro turno. Quem defende essa tese costuma considerar que vale para qualquer situação o senso comum de que partidos abertamente de esquerda ou de direita somente formam maioria quando se dirigem ao centro. Mas isso só se comprova em cenários de baixa intensidade da disputa entre projetos e classes, como ocorreu em 2002”, ponderou.
Porém, em casos de disputas de alta intensidade, o jornalista argumentou que não vale o senso comum de que ampliação é tudo, ganhando mais peso o conceito de identidade. O que, segundo ele, se comprovou na própria eleição de Bolsonaro: “O atual presidente sagrou-se vitorioso sem qualquer concessão centrista. Ao contrário, sua curva de campanha foi de radicalização o tempo todo, tentando se apresentar como uma alternativa anti-sistema”.
Além disso, a possibilidade de uma chapa com Lula e Alckmin também foi celebrada por frações da burguesia, “esgotadas pelo bolsonarismo e desiludidas com os candidatos da chamada terceira via”. Para esse grupo, a candidatura de Alckmin representaria uma “subordinação do futuro presidente aos limites do capital”.
“Se Lula ousasse ir além de mudanças periféricas, Alckmin funcionaria como seu anteparo, aproveitando-se da provável maioria parlamentar conservadora e do controle das demais instituições do Estado para emparedar o líder petista. Ou para simplesmente derrubá-lo, com um novo golpe ou alguma manobra parlamentarista”, explicou.
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Para jornalista, aliança entre Lula e Geraldo Alckmin enfraquece mobilização militante no país
Quem é Geraldo Alckmin?
Altman reforçou os perigos de alguém como Geraldo Alckmin não só em uma chapa com Lula, mas diretamente no governo, por não vir de tradição democrática, estando atrelado a setores “profundamente conservadores, vinculados aos setores mais arcaicos do catolicismo e disfarçado pela reconhecida polidez, pelo discurso hipócrita da compaixão”.
“Mais que qualquer outra liderança do PSDB, porque nunca teve passado progressista, Alckmin representa um programa neoliberal, privatista, de desmonte das conquistas sociais e dos serviços públicos, de submissão tanto ideológica quanto geopolítica ao imperialismo norte-americano”, enfatizou.
O ex-governador de São Paulo foi um dos maiores articuladores do golpe contra Dilma Rousseff, de acordo com o jornalista. Depois de fracassos eleitorais e de perder o controle do PSDB, Alckmin passou a preparar sua saída do partido para disputar o governo paulista em 2022. “Não há qualquer autocrítica programática ou de comportamento frente ao golpe de 2016. Somente se arrepende de ter criado jacaré no tanque, o ambicioso João Dória, que lhe comeu as mãos”, ressaltou Altman.
Apesar de reconhecer que o tucano não se sente cômodo com a extrema-direita bolsonarista, o fundador de Opera Mundi reforçou que ele não possui contradições relevantes com o programa econômico sustentado pelo atual governo.
‘Lula e o PT não precisam de aliança com Alckmin’
“Se Alckmin, ou alguém parecido com Alckmin, for o vice de Lula, a militância petista e de esquerda fará campanha com sangue nos olhos e disposição de dar murros em ponta de faca, ânimo indispensável para enfrentar o bolsonarismo? Se isso ocorrer, alguém pode afirmar com segurança que a parcela do eleitorado mergulhada no desespero econômico e social continuará acreditando que mudanças profundas em suas vidas serão possíveis?”, questionou o jornalista.
Para ele, uma chapa com Alckmin representaria um programa rebaixado, sem as reformas estruturais necessárias para o país, uma “recauchutagem do modelo neoliberal”. Também considerou a opção eleitoralmente contraproducente, já que nenhuma pesquisa indica que Lula e o PT precisaram de uma aliança com o tucano para vencer, nem mesmo no primeiro turno.
Altman afirmou que nem o argumento de construção de um pacto de governabilidade justificaria a formação da chapa. Para o jornalista, se esse pacto viesse a ocorrer, a partir de acordo com Alckmin, o que assistiríamos seria o sequestro do governo por uma coalizão parlamentar conservadora, liderada por uma fração da própria administração federal.
“Sem menosprezar a importância da articulação parlamentar, não dá para fugir da realidade: provavelmente teremos um parlamento com maioria conservadora, como sempre ocorreu em nossa história republicana. Ou seja, um novo governo Lula será de minoria parlamentar, talvez mesmo abaixo dos 171 deputados que funcionam como trava contra o impeachment”, contemplou Altman.
O jornalista frisou que a governabilidade se conquista, nessas condições, somente com permanente mobilização popular, cercando as instituições de fora para dentro, pressionando-as com máxima intensidade o tempo todo, o que seria impossível de se fazer sem uma identidade que “comova corações e mentes”.
Assim, em vez de reforçar o apoio no Congresso a um eventual governo de esquerda, a aliança com Alckmin facilitaria uma terceirização do controle sobre o Poder Legislativo, “diretamente para as mãos das forças políticas que organizaram o golpe de 2016 e as reformas liberais”.