No programa 20 MINUTOS ANÁLISE desta terça-feira (07/12), o jornalista e fundador de Opera Mundi, Breno Altman, refletiu sobre quem deveria ser o vice do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em uma possível chapa para 2022, após intensas especulações à direita e à esquerda, e antes mesmo do líder histórico do Partido dos Trabalhadores ter confirmado sua própria candidatura.
Ele explicou que dentro do PT e da esquerda há dois pontos de vista a respeito da aliança que deve ser feita: o de uma ampliação rumo ao centro para garantir a vitória e a estabilidade de um novo governo, indicando um velho quadro do conservadorismo, como Geraldo Alckmin; e o de uma identidade progressista que gere mobilizações fortes o suficiente para garantir a eleição e a governabilidade.
Para os adeptos da primeira opção, “tanto o programa quanto o discurso de Lula deveriam estar adaptados à necessidade dessa aliança, tanto para vencer quanto para governar o país”. “O objetivo que importa seria o de derrotar [Jair] Bolsonaro ou ´Sergio] Moro. Uma nova administração petista, nessa lógica, seria vista como uma espécie de governo transitório”, enfatizou.
Para os adeptos da segunda opção, o jornalista destacou que uma aliança com o centro, marcada por concessões programáticas, poderia resultar no arrefecimento e confusão da militância de esquerda. Além de que esse grupo também considera um enorme risco para a governabilidade a indicação de um vice vinculado ao bloco golpista e neoliberal.
A partir desse cenário, Altman ponderou: Lula precisa de alianças para se eleger presidente?
“No que diz respeito ao segundo turno, os dois blocos concordam que sim. O arco de apoios teria que ser ampliado a todos os que estivessem dispostos a combater Bolsonaro ou Moro. Normalmente as concessões são menores para alianças no segundo turno, pois não incidem sobre horário eleitoral ou recursos de campanha. Também há acordo entre os dois pontos de vista de que não há como Lula ficar fora do segundo turno, se ele já não liquidar a fatura já no primeiro turno. As divergências estão exatamente em como disputar o primeiro turno”, expôs.
Ele relembrou que os defensores da aliança com a centro-direita consideram que deve ser feito tudo o que for possível, com os acordos e concessões necessárias, para que Lula ganhe ainda no primeiro turno, sob uma perspectiva “de pacificação e normalização da vida política, em vez de transformação econômica e social”. Se isso não for possível, o ideal, de acordo com o jornalista, seria entrar no segundo turno com um pacto já firmado.
A crítica a esse setor, segundo Altman, é considerar que a campanha do primeiro turno deve ser feita “com plena identidade programática” para deslocar à esquerda o maior número possível de eleitores, “isolando a extrema-direita e desidratando o centro”, reduzindo a necessidade de concessões mesmo num segundo turno.
“Avaliam que a radicalidade da disputa contra o bolsonarismo exige mobilização popular de alta intensidade, nas quais o povo organizado possa exercer potente pressão sobre as instituições, com um discurso que faça a fusão entre reconstrução democrática, soberania nacional e transformação econômica, o que seria, a seu juízo, impraticável com uma aliança envolvendo a chamada centro-direita. Também consideram que sua opinião facilita a eleição de mais deputados petistas e de esquerda”, apontou.
1989 ou 2002
Para entender melhor os posicionamentos e decidir uma estratégia, Altman comparou o momento atual com outras duas importantes disputas eleitorais vividas pelo ex-presidente. A primeira, quatro anos depois do final da ditadura militar, em 1989, quando havia uma profunda crise sistêmica, política e econômica. O jornalista narrou que os dois candidatos de esquerda – Lula e Leonel Brizola – “representavam uma confrontação radical ao sistema”. Enquanto o centro “naufragava”, assumiu a dianteira um oponente de direita, Fernando Collor, “que fazia da bandeira anticorrupção seu mote de enfrentamento aos partidos da Nova República e do anticomunismo seu discurso contra a esquerda”.
Nesse cenário, ele recordou que Lula, aliado apenas ao PCdoB e ao PSB, superou Brizola e conseguiu 47% dos votos no segundo turno, com um discurso claramente antilatifundiário e anti-imperialista numa época em que o PT tinha apenas 16 deputados, nenhum governador, nenhum senador e poucos prefeitos.
“Na campanha de 2002, o cenário era bastante distinto. Havia uma crise das políticas neoliberais e um desgaste do governo FHC, mas não havia uma onda antissistema, a situação econômica do país não era de colapso, apesar das dificuldades. Os eleitores que queriam mudanças não estavam dispostos a rupturas ou maiores riscos. Queriam mudanças no sistema, mas não de sistema”, sustentou Altman.
Ricardo Stuckert
Altman explicou os dois pontos de vista a respeito da aliança que deve ser feita por Lula
Nesse cenário, ele lembrou que o PT adaptou sua tática eleitoral, indicando José Alencar, “um grande empresário crítico do neoliberalismo”, para a vice-presidência, além de emitir a conhecida Carta ao Povo Brasileiro. A estratégia deu frutos e Lula sagrou-se vitorioso, com 46% dos votos na primeira volta e 61% na segunda.
“Os defensores da aliança de centro-direita para 2022 consideram que o cenário atual deve ser tratado como o de 2002, a partir da constatação de que o PT venceu apenas quando se aliou com a centro-direita – ou seja, em 2002, 2006, 2010 e 2014”, analisou.
Já os críticos dessa posição interpretam, como afirmou o jornalista, que o cenário atual é “completamente distinto”, pois o país estaria em uma crise de sistema.
Quem deveria ser o vice de Lula?
Altman concordou que o cenário atual não é o mesmo de 2002. Ele retomou alguns processos históricos: de 1995 a 2015, todos os processos eleitorais teriam sido marcados pela disputa entre a variável neoliberal e a alternativa progressista. Mas a partir de 2016, com o golpe contra Dilma Rousseff, a normalidade democrática da VI República, fundada pela Constituição de 1988, teria sido rompida, “abrindo espaço para um agressivo programa de reformas liberais, com a direita tradicional perdendo o comando do campo conservador e se submetendo à extrema direita”.
“O país teria sido jogado, desde então, em uma crise de alta intensidade, agravada pela pandemia, muito mais próxima do cenário de 1989 do que da situação na qual se vivia em 2002”, defendeu.
Assim, para os críticos da possível aliança com a centro-direita, “o jogo voltou a correr pelas pontas”, com a possibilidade de derrotar o centro e atuar mais de acordo com o PT de 1989. Além de que, para esse grupo, conforme explicou o jornalista, colocar-se ao lado das forças de direita seria deixar o discurso antissistema apenas na mãos da extrema direita, “sem oferecer um rumo radicalmente diferente ao país”.
Mas então qual seria a alternativa, “quem deveria ser o vice de Lula?”, se perguntou o jornalista.
Ele reforçou que, para os defensores da aliança frente amplista, valeria qualquer nome que pudesse colocar a candidatura de Lula como representante da VI República, “atualmente reluz o de Alckmin”. Que, se fosse o caso, não poderia continuar no PSDB.
Já os defensores de uma frente do campo progressista, pedem alguém como Flávio Dino, “que deixaria eventuais alianças mais amplas para o segundo turno, sem comprometer as tarefas de identidade e mobilização da primeira volta”.
“Mais que enfraquecer a candidatura Lula, para os que não estão de acordo com a política de ‘frente ampla’, o risco maior seria facilitar o movimento da burguesia para aprisionar e colonizar o seu eventual governo, reduzindo espaços para a mobilização de sua base social, grande omissão que detectam no anterior ciclo petista no governo. Isso poderia tornar o presidente refém de um arranjo institucional extremamente desfavorável, como ocorreu com Dilma Rousseff, com uma centro-direita revigorada e reabilitada, que a qualquer momento poderia se acertar com a extrema-direita”, concluiu.