Militante do Movimento das Trabalhadoras e dos Trabalhadores Sem Terra (MST) desde os 13 anos de idade, a drag queen Ruth Venceremos concorre a uma vaga no Congresso Nacional pelo PT do Distrito Federal e afirma que o interior do armário não é um bom lugar para interromper o avanço neofascista no Brasil.
“O fascismo avança sobre nós, ficaremos caladas?”, questionou em entrevista ao jornalista Breno Altman no programa 20 MINUTOS desta quarta-feira (28/09).
Escancarar as portas do armário, no caso da candidata nascida no sertão pernambucano sob o nome de batismo Erivan Hilário, incorpora em uma só figura as identidades de socialista, petista, militante sem terra, negra, nordestina, homossexual, militante LGBTQIA+ e drag queen, todas elas alvos preferenciais do ódio bolsonarista.
“Uma crítica à esquerda é esta: nós ficamos com medo. A gente tem que enfrentar o fascismo de frente. Não vamos superar conservadorismo e fascismo nos escondendo e não debatendo”, defende a também pedagoga, que dirigiu a Escola Nacional Florestan Fernandes, do MST, e é coordenadora nacional do setor de educação do movimento, a partir de Brasília. “Se eu tivesse voltado para dentro do armário na primeira vez que fosse xingada, estaria negando a mim mesma enquanto pessoa. Amplio esse aprendizado para o resto da vida, inclusive para a política”, ensina.
Erivan Hilário criou Ruth Venceremos em 2015 e afirma que ambos constituem hoje uma síntese, na qual um se complementa na outra: “eu transitava de Erivan em alguns espaços e muitas vezes minha mensagem não era ouvida como é a da drag queen”.
A persona drag, portanto, não é apenas de uma personagem, mas também “sobre mim, Erivan, uma bicha preta”. Morando desde os 13 anos em acampamentos em Pernambuco (onde ficou até os 25 anos, em 2009), a militante explica que se assumiu como LGBTQIA+ desde que se entende por gente.
André Gagliardo
‘O fascismo avança sobre nós, ficaremos caladas?’, questionou Ruth Venceremos em entrevista
Reconhecida no acampamento em que vivia como “uma criança que queria ser professor”, viu crescerem juntas sua consciência e a do MST, a partir de um trabalho de coletividade, senso de justiça e solidariedade. “Não estou dizendo que não sofri. Sofri, mas era diferente, não era alvo de chacota permanente como na cidade.”
Persona política
A pedagoga conta que Ruth Venceremos nasceu em 2015, a partir do qual floresceu a persona sexual e política. “Saio pela primeira vez no carnaval de 2016, em Brasília. Foi aí que fui percebendo que a ‘montação’ estava fazendo com que eu chegasse a lugares onde Erivan e o MST não estavam chegando.” Motivador decisivo para a aparição pública de Ruth Venceremos foi a determinação de denunciar nas ruas o golpe que a presidente Dilma Rousseff sofria naquele ano.
“Levou muitos anos para ser respeitada como militante e dirigente do MST sendo quem eu era, uma bicha preta. Eu tinha medo, imagina se João Pedro Stédile me vir montada, meu Deus. Aos poucos o MST foi entendendo, e hoje é ele que me puxa para dentro do movimento”, disse.
Stedile tomou conhecimento da existência de Ruth Venceremos na eleição de 2018. Segundo ela, o líder sem-terra acompanha as pautas do tempo presente e é um dos grandes entusiastas atuais de Ruth Venceremos, “não só como uma personagem, mas como uma persona que disputa e trava a batalha das ideias na capital do Brasil”.
Ruth Venceremos promete desde já que, caso seja eleita, legislará vestida como drag queen no Congresso Nacional: “acha que vou perder a oportunidade de fazer história? Irei montada, porque a ‘montação’ é minha armadura para enfrentar o racismo, a LGBTfobia e a bancada do agronegócio. Uma bicha preta drag queen sem-terra se levantará para dizer que os destruidores da natureza e os que falam em nome da morte não passarão”. Afirmando que seu programa eleitoral é o programa do MST, ela finaliza: “a revolução será não apenas colorida, será popular e socialista”.