No programa 20 MINUTOS INTERNACIONAL desta quinta-feira (17/06), o jornalista Breno Altman entrevistou Qu Yuhui, ministro-conselheiro da Embaixada da China no Brasil, sobre a atual política interna e externa do país.
Muitos analistas, inclusive de esquerda, classificam a China como imperialista. Yuhui rejeitou essa definição: “Quando um país é poderoso, existe a tendência de classificar esse país como imperialista, mas quais são os critérios que definem um país imperialista? Não é o poder que certo país dispõe, é como ele vai usar esse poder”.
Como ele apontou, um país imperialista usa seu poderio militar para se expandir para fora de seu território nacional. Na área econômica, busca determinar as regras. Na diplomacia, tem tendências unilaterais.
“A China não tem nenhuma base militar fora da China. Não teve, não tem e não terá nenhuma colônia. No nosso dicionário da diplomacia, não existe o termo coerção. Em termos econômicos, nunca cobramos políticas internas específicas para desenvolver parcerias, nem queremos usar nossas parcerias como ferramenta política”, explicou o ministro.
Em comparação com as posturas adotadas pelos EUA, cuja diplomacia “inclui palavras como hegemonia, envolvimento, podemos classificá-los como imperialistas”. Apesar disso, e de que a nível internacional EUA e China sejam consideradas as principais potências mundiais concorrentes, Yuhui assegurou que a China “não tem a intenção de provocar os EUA, tampouco tem a intenção de substituir os EUA na geopolítica e na geoeconomia. Não queremos reverter a atual ordem internacional”.
No entanto, para o ministro, é importante que os EUA e seus governos “abandonem a mentalidade de Guerra Fria”, referindo-se à política de competição com a China, mais agressiva durante o governo de Donald Trump (2017-2021), mas que continua, de forma mais sofisticada, com Joe Biden.
“Eles precisam olhar para o mundo de hoje e saber que é diferente. Não podem sempre pensar em como conter o crescimento desses outros países, precisam respeitar o direito legítimo de outros países de se desenvolver, sem criar inimigos imaginários. Hoje falar bem da China nos EUA é considerado politicamente incorreto. Temos que sentar para conversar e ver onde podemos cooperar e onde devemos competir, mas de forma amistosa, sem golpes baixos”, ponderou.
Não é apenas com os EUA, contudo, que a China tem relações complexas. Yuhui afirmou que há intervenções internacionais em assuntos internos chineses, por exemplo no que diz respeito a Hong Kong e Taiwan.
“Ninguém se preocupa mais pelos interesses de Hong Kong e Taiwan do que a China. Respeitamos o modelo político de outros países e pedimos que respeitem o nosso”, disse.
No que diz respeito ao Brasil e aos ataques que o governo de Jair Bolsonaro vem proferindo à nação, o ministro ressaltou a importância da relação entre ambos países e se mostrou confiante com a evolução das parcerias.
“Mas cabe fazer esforços conjuntos para manter boas relações políticas. Combater desinformação e teorias de conspiração para que possamos estender nossas relações, assim vamos alcançar um patamar mais elevado. A nossa cooperação ainda é tímida comparada ao que pode chegar a ser”, refletiu.
Combate à pandemia
“A pandemia é o inimigo comum da humanidade. É nosso principal desafio. O governo tem adotado uma atitude científica para combater a pandemia, investindo em pesquisa, desenvolvimento tecnológico, sempre priorizando a vida humana. O maior foco do governo chinês é implementar medidas rigorosas de controle e rastreamento da pandemia. À base disso, tentamos equilibrar o desenvolvimento econômico”, contou Yuhui.
Wilson Dias/Agência Brasil
Qu Yuhui, ministro-conselheiro da embaixada da China no Brasil, foi o entrevistado de Breno Altman no 20 MINUTOS INTERNACIONAL
Em conjunto com o desenvolvimento de seis vacinas próprias, como a CoronaVac, o governo está realizando uma grande campanha de vacinação. O objetivo, de acordo com o ministro, é ter 90% da população com mais de 18 anos vacinada até o fim do ano.
Para controlar a transmissão do vírus, o país está adotando uma estratégia de controle de precisão, com lockdowns localizados, além de manter como obrigatório o uso da máscara em ambientes públicos fechados e determinar períodos de quarentena para pessoas que chegam à China: “A nossa preocupação agora é com os casos importados”.
Do ponto de vista da economia, Yuhui celebrou o fato de que o país já está conseguindo se recuperar, sendo a única economia do mundo a apresentar um crescimento positivo em 2020.
“Estamos confiantes de que a China vai sair mais sofisticada da pandemia porque temos várias vantagens. Possuímos um dos maiores mercados do mundo. São 400 milhões de pessoas. Só com essa demanda interna, conseguimos nos sustentar. Somos o único país do mundo que consegue manter um setor industrial completo. Isso faz com que a economia da China consiga se proteger contra as volatilidades da economia mundial”, explicou.
Socialismo moderno
Conforme narrou Yuhui, a meta da China é alavancar o país a um “socialismo moderno” em 35 anos. Isso inclui, por exemplo, a incorporação de um crescimento sustentável, dando maior atenção à questão ambiental, “porque entendemos que a economia não pode ser desenvolvida em desrespeito ao meio ambiente. Também deixamos de avaliar o desempenho da economia chinesa apenas pelo crescimento do PIB”.
Ele citou a mudança da matriz energética como um resultado imediato dessa nova política. A China dependia muito do uso do carvão, que atualmente está sendo substituído por energias renováveis, como a hidrelétrica, eólica e solar. Mas admitiu: “A construção socialista é um tema sem respostas prontas. A China levou muito tempo para aprender as lições e ainda não temos as respostas”.
Yuhui elogiou a liderança de Xi Jinping, cujo governo, segundo ele, sabe equilibrar o papel do governo, como agente regulador, e o papel do mercado.
“Não há governo que não intervenha na economia e não tem como um país tão grande como a China ser composto só por uma economia ou outra. Não é interferir, é gerenciar. Focamos muito na elaboração de planos estratégicos de desenvolvimento. O setor privado não vai prover o desenvolvimento da economia, esse papel só pode ser exercido pelo governo”, reforçou.
Para Yuhui, ter um Estado forte vai além da questão econômica, é uma questão social e política e é o que define o socialismo chinês, criticado internacionalmente por estar supostamente se enquadrando nos princípios capitalistas.
“Cada país tem suas particularidades. Não há um padrão para dizer qual é o caminho único e legítimo do socialismo. A China é um país socialista, mas o socialismo passa por várias etapas. Ainda estamos na fase inicial e vamos seguir nela enquanto a nossa economia não estiver consolidada. Não podemos simplesmente eliminar a economia de mercado”, defendeu.
Além disso, o que difere a China é que “a nossa democracia não é representativa, é consultativa”, impedindo que empresários controlem o poder político. “Eles podem participar, mas quem vai definir o futuro do país não são eles”.