As chamas que “apagaram” anos de pesquisas, de ciência e
cultura do Museu Nacional são uma face do sucateamento planejado que vem acometendo
universidades, centros de memórias, de pesquisas e escolas por todo o país. Por
trás do discurso de crise, há um projeto escancaradamente entreguista e que
considera a Educação, a Ciência e a Tecnologia como gastos, não como
investimentos. Esta premissa é uma insígnia golpista que incendeia direitos e
mata pessoas diariamente.
Mas o fogo também traz lições. No final de 2016 houve
mobilizações contra a implementação desses cortes em todo o país organizadas
principalmente por grupos de estudantes. Ocorre que essas mobilizações
encontraram o que costumo chamar de resistência invertida, uma vez que elas vieram
justamente daqueles que seriam os mais afetados pelos cortes, mas que, ao invés
de confrontarem o autoritarismo do governo, fizeram o inverso imponto objeções à
luta dos estudantes. O resultado? Não é difícil recordar.
Contradições como essas ascendem perguntas incômodas. Por
que a composição de um verdadeiro fronte por todo o país não ocorreu mesmo
diante da certeza do que viria acontecer? Por que tantos professores,
pesquisadores, trabalhadores da educação e não muito raro, sindicatos, naquela
ocasião simplesmente ficaram de braços cruzados ou até mesmo criminalizaram aqueles
que tentaram fazer alguma coisa? Faltou clarividência?
Não demorou e pouco tempo depois os cortes vieram. No caso
do orçamento em Ciência e Tecnologia, de acordo com o Instituto de Estudos
Socioeconômicos (Inesc, 2017), o corte alcançou a marca absurda de 76% (de 6,2 bilhões
em 2015 para 1,5 bilhão em 2017). Chaleiras do governo defenderam esses cortes
com justificativa amparada na crise econômica. Mas, enquanto isso, esqueceram de
criticar medidas como a MP 795, votada na câmara em 2 de dezembro de 2017. Essa
medida concede isenção de impostos a petrolíferas estrangeiras e fará o país
deixar de arrecadar 1 trilhão à União nos próximos 25 anos. Além disso, não
podemos esquecer que o governo concedeu isenção de 1,3 bilhão às empresas que
despejam agrotóxicos país afora. Tudo na contramão.
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Mesmo diante de políticas tão absurdas e disparatadas, por
que a anestesia tem sido maior que a resistência entre aqueles que tanto
lamentam? Será que o luto pelo museu e as lágrimas de quem coerentemente
pranteia a perda serão convertidas em luta e defesa do que resta? Se a inércia
continuar predominando, não é difícil prever outras tragédias. Algumas delas
trarão danos imensuráveis, a exemplo da educação pública que sofre fortes
ataques por meio de reformas autoritárias como a do Ensino Médio.
O que mais é preciso para que a comunidade científica,
professores, estudantes e trabalhadores da educação, da ciência e tecnologia de
todo o país se mobilizem para defender a ciência, a educação pública e evitar
que dramas maiores aconteçam?
Produção do conhecimento e garantia de uma ciência pujante às
gerações futuras não se fazem apenas aguardando auditoria ou esperando a boa
vontade de uma mesa de negociações. Não é assim que se negocia com parasitas. O
caminho é outro, mas demanda protagonismo, união, diálogo, construção coletiva
de ações e clarividência de quem são os verdadeiros inimigos. Ou compreendemos as
lições das chamas ou esmoreceremos na inércia das cinzas.
*Denis Castilho é doutor em Geografia e professor da
Universidade Federal de Goiás