Justiça não, Judiciário
As, digamos, excentricidades de Noronha, já fizeram que, no meio jurídico, se criasse o neologismo 'noronhice'
Na sexta feira (10/07) foi indicado o novo ministro da Educação (?), Pastor Presbiteriano Milton Ribeiro. Escaldado pela coluna anterior, em que comentei um novo ministro que já não era mais quando a coluna chegou ao leitor, vou aguardar uma semana para me manifestar.
Enquanto isso no quartel de Abrantes, o presidente do Superior Tribunal de Justiça, João Otávio de Noronha, aproveitou o período de recesso do judiciário para decidir sobre um caso que normalmente não estaria sob sua decisão e transformou a prisão do famoso Queiroz em domiciliar.
O pretexto foi o estado de saúde do prisioneiro e os cuidados necessários em meio à pandemia. O fato que de o próprio Noronha tenha negado, em decisões recentes, o mesmo benefício a idosos nas mesmas condições causa estranheza naqueles que acham que o Judiciário deve ter algo a ver com o que nós, pessoas comuns, chamamos de justiça, mas não deverá ter qualquer efeito prático.
Para dar um sabor ainda mais picante, o ministro estendeu a prisão domiciliar a Márcia Oliveira de Aguiar, esposa de Fabrício Queiroz. Neste caso o argumento é que a esposa deve levar conforto e “cuidar” do amigo dos Bolsonaros. Para os crédulos na justiça essa decisão constituiria uma contribuição inédita à jurisprudência internacional ao estender o benefício da prisão domiciliar a uma foragida da polícia.
Numa análise mais prática e realista esta decisão traz mais conforto e alívio aos milicianos no poder do que a própria saída do Queiroz. Afinal eram frequentes os comentários de que a prisão de dona Márcia poderia ser um perigoso estímulo para uma eventual delação premiada.

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As, digamos, excentricidades de Noronha, já fizeram que, no meio jurídico, se criasse o neologismo 'noronhice'
A imprensa está cheia de avaliações de que assim, Noronha se qualifica para uma próxima vaga no Supremo, precisamente aquela que levou Moro a permanecer ministro durante um ano e meio sem, supostamente, perceber o conjunto de ilegalidades cometidas pelo governo de que saiu disparando traques.
As, digamos, excentricidades de Noronha, já fizeram que, no meio jurídico, se criasse o neologismo “noronhice”. Sobre o ambiente judiciário brasileiro – e o carioca em particular – muito há que dizer ainda.
Mas, para além da eventual indignação, talvez uma primeira medida realista pudesse ser o abandono da expressão “justiça” para falar dos processos, valores e decisões do tal poder supostamente independente chamado Judiciário.
Não têm faltado evidências de uma coisa não tem nada a ver com a outra.
Ah, sim, chegamos a 70 mil (mortos) mas isso não importa diante de tantas boas notícias.
*Carlos Ferreira Martins é professor titular do IAU-USP São Carlos