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Análise

Intentona golpista expõe vísceras de um império em acentuado declínio

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Este 6 de janeiro entra para a crônica como uma das datas que os historiadores do futuro tomarão como referência para narrar a longa agonia de um império, cujo fim se aproxima cada vez mais

José Reinaldo Carvalho

Resistência Resistência

São Paulo (Brasil)
2021-01-07T14:12:00.000Z

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O processo de declínio dos Estados Unidos teve neste 6 de janeiro de 2021 um momento marcante. Dele fez parte uma inaudita ofensiva antidemocrática e golpista que se traduziu literalmente por atos de violência que podem ser equiparados a incêndios já perpetrados por outros chefes decadentes de impérios de antanho. 

Sob a conclamação e incitação do chefe de turno da superpotência imperialista, hordas de milicianos supremacistas, agentes de um novo tipo de fascismo que grassa no país norte-americano e se espalha pelo mundo, atacaram o Capitólio, sede do Poder Legislativo daquela que se considera a mais sólida democracia no mundo e apanágio das liberdades individuais e coletivas. 

O que muitos intuíam em silêncio, mas se recusavam a crer, finalmente aconteceu: a intentona de golpe nos Estados Unidos, que começaria pela anulação dos resultados eleitorais, sob o pretexto de que foram fraudados. Muito embora sem o apoio das instituições permanentes e mesmo da maioria dos políticos reacionários que acompanharam Trump em sua eleição há quatro anos e compartilharam com ele seu mandato, respaldando as suas decisões, e ainda que momentaneamente conjurado e fracassado, o episódio reveste-se da maior gravidade. Expõe as vísceras apodrecidas do sistema político estadunidense. 

Doravante, a vida política nos Estados Unidos será marcada pelo fato de haver sido feita pelo chefe de Estado e de Governo, com respaldo em setores fanatizados de massas, uma intentona golpista num país que sempre se jactou de ser não apenas modelo de democracia, mas também de estabilidade política. E, mesmo considerando a repercussão mundial negativa na maioria dos círculos políticos dominantes, é incontornável que a instabilidade revelada no coração do sistema imperialista vai extravasar para outros países. 

A consequência mais previsível, no plano interno, é que o mandato de Joe Biden, finalmente ratificado pelo Congresso na madrugada desta quinta-feira (07/01), sofrerá as injunções dessa crise política. No plano externo, a intentona golpista, com todos os atos violentos típicos dos grupos do neofascismo emergente insuflados por Trump, assanha os neofascistas de outras latitudes, cuja metodologia de ação, com aclimatação de formas, tem seus replicantes mundo afora. 

O Brasil, cujo governo se comporta como um inescrupuloso sabujo de Trump, talvez seja o exemplo mais evidente disso. Por aqui o titular do Poder Executivo já emitiu todos os sinais de que está disposto, com seu clã e milicianos, a atacar a democracia e os direitos do povo, caso sofra derrotas. O cariz do regime que pretende impor ao Brasil torna essa possibilidade factível. 

Mas voltemos ao olho do furacão. A intentona golpista fracassou, refletindo a derrota política das forças mais reacionárias, o que faz parte do prolongado processo de declínio do imperialismo estadunidense. Mas os fatores que lhe deram origem permanecem e não se extinguirão com o afastamento de Trump da Casa Branca.

Quando a União Soviética foi extinta, a superpotência do Norte sentiu a embriaguez do triunfo. George H. Bush proclamou então que “com a graça de deus”, finalmente os Estados Unidos se tornaram a única potência dominante no mundo. Nas três últimas décadas, mesmo sob Clinton (1993-2001) e Obama (2009-2017), e principalmente com George W.Bush (2001-2009), teve lugar a aplicação de uma política unilateral pretensamente voltada para a consolidação do domínio hegemônico dos EUA, designado como “unipolar”. Foi uma política de força e agressividade que suscitou inquietação e insegurança nos demais atores da política internacional. Trump levou a tentativa hegemônica ao paroxismo, no momento em que era visível que estava sendo perdida.

Durante o período “áureo” da “globalização” liderada pelos EUA, a economia parecia dar razão aos que acreditavam na perenidade da hegemonia norte-americana. Esse equívoco foi praticado não só por direitistas e conservadores, mas também por centristas e sociais-democratas e até alguns “neocomunistas”, facilmente adaptáveis aos cânones da Academia e do Departamento de Estado estadunidense. Não se davam conta de dois fenômenos que estão na raiz da profunda crise que assola o país: a polarização social, o crescimento em flecha da pobreza e da desigualdade, no rastro da crise econômica e financeira; e a perda de força econômica e geopolítica, com a emergência de outros atores de peso no cenário mundial. 

Hoje, com a obra realizada, tornou-se mais visível o fenômeno que muitos queriam contornar, mas já não podem: o declínio estadunidense e a emergência da China, um país socialista que, com suas peculiaridades, soube tirar proveito da nova realidade econômica. 

O fenômeno Trump é resultado desta realidade em movimento. Seu mandato representou o empenho para evitar o declínio do imperialismo estadunidense e enfrentar os problemas ligados à polarização social intensificando os aspectos mais sórdidos e reacionários da sociedade americana. 

A exacerbação do supremacismo branco, a violência e o golpismo são algumas manifestações políticas e ideológicas disso, que poderá resultar em guerra civil e na realização de guerras de agressão contra os países que estão indexados como inimigos dos interesses nacionais estadunidenses. 

Por ser um corolário de uma situação objetivamente incontornável, são fenômenos que tendem a permanecer, porque o trumpismo não vai desaparecer depois da saída de seu chefe da Casa Branca, mesmo nas circunstâncias em que a partir de 20 de janeiro será empossado um governo que poderá portar com habilidade e astúcia as bandeiras da democracia, dos direitos humanos e do multilateralismo em política externa.

Eleições 2020 nos EUA

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Análise

Patentes na OMC é uma derrota para os países do Sul Global

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Pandemia de covid-19 reativou a debate sobre a quebra de patentes para medicamentos e vacinas. Apesar de sua união em torno do tema, países subdesenvolvidos sofreram uma derrota

Alessandra Monterastelli

Outras Palavras Outras Palavras

2022-07-06T22:35:00.000Z

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No dia 17 de junho, saiu fumaça branca das chaminés da Organização Mundial do Comércio (OMC). A entidade, responsável pela regulação de patentes internacionais, anunciou que chegara a uma conclusão sobre as vacinas contra o coronavírus. Tratava-se do pedido de isenção do acordo TRIPS – sigla em inglês para Aspectos dos Direitos de Propriedade Intelectual Relacionados ao Comércio. Firmado na virada do século, tal compromisso obriga os países-membros da OMC a adotar padrões mais rigorosos de proteção patentária. Consequentemente, encarece o acesso às inovações tecnológicas, inclusive no setor farmacêutico. Mas a decisão final foi amplamente criticada por ativistas da saúde e movimentos populares em todo o mundo, já que a OMC rejeitou a isenção total do TRIPS. 

Em 2020, diante da disseminação do novo coronavírus, África do Sul e Índia protocolaram a proposta de isenção do Acordo, que obteve amplo apoio dos países em desenvolvimento e de baixa renda – com exceção do Brasil. A nova decisão foi saudada pelo Secretariado da OMC e por representantes de países ricos como um resultado sem precedentes, mas ativistas condenam que, na prática, a decisão não atende as necessidades mínimas da maior fatia do mundo. “Houve um esvaziamento da proposta pelos países mais ricos. O texto perdeu totalmente sua força, não trouxe nada novo”, explica Felipe Carvalho, Coordenador Regional da Campanha de Acesso do Médicos Sem Fronteiras ao Outra Saúde.

A conclusão do órgão concedeu uma exceção temporária à restrição das quantidades de vacinas que podem ser exportadas sob licença compulsória; diagnósticos e tratamentos não estão incluídos e devem obedecer ao limite de exportação durante o tempo de licença compulsória – decretada durante emergências sanitárias, como é o caso da pandemia. Além disso, a concessão vale apenas para responder à covid-19 e não tem validade diante de outras crises de saúde. O acordo final não inclui o compartilhamento de segredos comerciais e know-how de fabricação, o que prejudicará a produção de vacinas com tecnologia avançada por países de baixa renda – como é o caso dos imunizantes de RNA.

Carvalho conta que o problema é abordado com frequência em reuniões escpecais da OMS e da ONU.  “Existe um consenso entre especialistas e órgãos multilaterais de que as patentes causam constantes crises de acesso e inovação na saúde”. Em maio, o The Guardian divulgou que a Pfizer lucrou 25,7 bilhões de dólares só no início de 2022 – mais da metade do valor está relacionado à venda de vacinas contra a covid-19. Tim Bierley, ativista do Global Justice Now, denunciou ao jornal britânico que apesar do apelo da Organização Mundial da Saúde (OMS) e de outras organizações, a farmacêutica seguia se recusando a compartilhar a tecnologia de produção do imunizante. O diretor da OMS, Tedros Adhanon, afirmou em 2021 que a pandemia estava sendo prolongada por uma “escandalosa desigualdade” diante do acúmulo de doses de imunizantes por países ricos enquanto países pobres não conseguiam avançar em sua meta de vacinação em massa. 

“Desde a criação do acordo TRIPs nós temos um cenário de constantes crises de acesso a medicamentos essenciais”, conta Felipe. Ele relembra o caso emblemático da epidemia de HIV/AIDS, na década de 1990. “Em 1996 surgiu a primeira terapia para a doença. As pessoas pararam de morrer e passaram a conviver com o vírus. Mas essa terapia não chegou nos países onde o cenário era mais grave”, explica. O ano de 1996 foi também quando o acordo TRIPS entrou em vigor, após sua criação em 1994 e preparação em 1995. “A partir daí se criou uma coalizão na sociedade civil, da qual fazemos parte, chamada Movimento de Luta pelo Acesso a Medicamentos. A pergunta era: por que os preços eram tão altos e o tratamento se tornava inacessível para milhões de pessoas? Nos aprofundamos no sistema de patentes e entendemos que o monopólio era a causa”, relembra.

Apesar do TRIPS possuir cláusulas que permitem flexibilizações, elas são de difícil utilização devido a dois fatores principais: sua não-incorporação completa em leis de países-membros e a pressão que as farmacêuticas exercem sobre as decisões da OMC. Na década de 1990, diante da grave situação vivida na África do Sul – país com maior número de mortes pela AIDS na época – o governo então liderado por Nelson Mandela aprovou uma das medidas previstas no TRIPS para importar genéricos. Na ocasião, Mandela sofreu o processo de 39 farmacêuticas que se opuseram à decisão tomada para conter a crise de saúde pública. Apesar da derrota das corporações na justiça, “esse é um exemplo de como essas empresas e seus países-sede tentam barrar as normas legítimas existentes no TRIPS”, exemplifica Carvalho.

A OMC é uma instituição formada por 164 membros e opera com base na tomada de decisões por consenso. “A OMC falhou em fornecer uma isenção. O acordo coloca os lucros à frente das vidas e mostra que o atual regime de propriedade intelectual falha em proteger a saúde e promover a transferência de tecnologia. Essa não-renúncia estabelece um mau precedente para futuras pandemias e continuará a colocar vidas em risco” declarou Lauren Paremoer, médica e integrante do Peoples’ Health Movement na África do Sul. 

A Health Action International, referência no trabalho para expandir o acesso a medicamentos essenciais, argumentou em nota que a decisão da OMC impõe obstáculos ao licenciamento compulsório, uma das poucas flexibilidades existentes no TRIPS, em troca de uma abertura tímida para a facilitação da exportação de vacinas. Outras entidades representantes da sociedade civil já denunciaram a atuação dos países ricos e vêm aumentando a pressão sobre os governos. O objetivo, segundo seus porta-vozes, é que sejam tomadas medidas concretas para desafiar as regras de monopólio farmacêutico da OMC e garantir mais acesso a medicamentos e tecnologias. 

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