A Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional do Senado aprovou nesta quinta-feira (29) a entrada da Venezuela no Mercosul. Após 11 senadores rejeitarem o relatório do senador Tasso Jereissati (PSDB-CE), que era contrário à adesão, o voto em separado do líder do governo no Senado, Romero Jucá (PMDB-RR), foi aprovado com 12 votos, contra cinco contrários.
Agora, a matéria segue para votação no plenário, provavelmente na próxima semana. Para a
aprovação, basta maioria simples dos senadores presentes. A adesão da Venezuela depende da aprovação dos congressos brasileiro e paraguaio – neste último, o projeto foi retirado pelo governo Fernando Lugo, pois seria rejeitado. Argentinos e uruguaios já aprovaram.
Embora os líderes governistas continuem confiantes em mais uma aprovação no Senado brasileiro, a disputa deve ser mais acirrada, uma vez que o presidente da Casa, José Sarney (PMDB-AP), manifestou-se contrário à entrada da Venezuela e o líder do PSDB no Senado, Arthur Virgílio (AM), prometeu inclusive obstruir a pauta para atrasar a votação e prolongar os debates.
Jucá defendeu a entrada da Venezuela no Mercosul, primeiramente, pela importância econômica. Lembrou que o país é o sexto maior comprador de produtos brasileiros. Entre 2003 e 2008, as exportações brasileiras para a Venezuela passaram de US$ 608 milhões para US$ 5,15 bilhões, um crescimento de 758%. Cerca de 72% das nossas exportações para a Venezuela são de produtos industrializados.
O senador Francisco Dornelles (PP-RJ) levantou outros dados econômicos. “A Venezuela responde por 10% exportações brasileiras de medicamentos, 8% das vendas de máquinas e equipamentos e 7% das de automóveis. Tudo isso pode se perder se rejeitarmos a entrada de Venezuela hoje”, disse. Segundo ele, com a rejeição o Brasil poderia perder, já em 2011, as preferências tarifárias que tem hoje com a Venezuela. Por exemplo, a tarifa de importação de automóveis brasileiros aumentaria dos 23% atuais para 35%.
Na questão política, Jucá destacou inicialmente que a discussão deve ser sobre a entrada do Estado venezuelano, e não do governo Hugo Chávez, ponto reforçado por todos os senadores que também votaram pela aprovação. “Para o Brasil e para o Mercosul, é bom ou não a entrada da Venezuela? Não estamos discutindo a política interna da Venezuela”, afirmou. Nesse sentido, lembrou também do esforço iniciado pelo ex-presidente Fernando Henrique Cardoso para integrar a Venezuela ao Mercosul. Além disso, rebateu os principais argumentos do relatório de Jereissati sobre os supostos problemas da Venezuela.
Em seu voto, Jucá afirma ser equivocado o argumento de que, antes da eleição de Chávez, a Venezuela vivia uma democracia plena e que, hoje, ela estaria sendo “destruída”. Segundo o líder do governo, a Venezuela vivia há décadas sob o regime do pacto de punto fijo, articulado pelos EUA em 1957, pelo qual os partidos tradicionais e conservadores aceitaram alternar-se no poder, sem permitir a entrada de novos partidos. “Os historiadores comparam o pacto à “política do café com leite” da República Velha brasileira: por trás de uma fachada de democracia, escondeu-se um sistema oligárquico”, afirma Jucá.
Para o senador José Nery (PSOL-PA), não se pode dizer que é uma ditadura um país que realiza eleições a cada dois anos. “É uma falta de reconhecimento da capacidade do povo venezuelano de escolher seus próprios líderes. Muitos no Brasil são incapazes de reconhecer as mudanças que estão ocorrendo na Venezuela, que faz seu povo querer a continuidade de Chávez”, disse.
Redução da pobreza
Sobre a situação interna do país vizinho, Jucá argumenta que a Venezuela tinha, em 1989, cerca de 70% da população vivendo abaixo da linha de pobreza. Dez anos depois da eleição de Chávez, a pobreza diminuiu para 20% dos habitantes, “fato que incomoda sobremaneira as oligarquias políticas que negaram perspectivas promissoras à maioria da população”.
Apesar dos argumentos de Jucá, vários senadores que votaram pela aprovação da entrada da Venezuela fizeram ressalvas aos posicionamentos de Chávez, principalmente na questão da democracia e dos direitos humanos. Todos destacaram, no entanto, que isolar o país certamente não ajudará a própria Venezuela e nem o Mercosul. “Sei que teremos problemas com o Chávez no Mercosul, mas teremos muito mais se rejeitarmos a entrada”, afirmou o senador Flávio Torres (PDT-CE).
O mesmo argumento foi colocado na terça-feira pelo prefeito de Caracas e um dos líderes da oposição ao presidente Hugo Chávez, Antonio Ledezma, que participou de reunião no da Comissão de Relações Exteriores do Senado. “Não é questão de deixar o Chávez entrar no Mercosul, mas sim a Venezuela. Governos são provisórios, temos que pensar no Estado, e a integração com o Mercosul seria muito benéfica para o nosso país”, afirmou.
A oposição, que votou em bloco contra a entrada da Venezuela, argumenta que as supostas violações à democracia e aos direitos humanos são incompatíveis com as regras do Mercosul e sua cláusula democrática. “Se aprovarmos hoje, estamos antecipando a missa de sétimo dia do Mercosul”, afirmou Arthur Virgílio. Jereissati disse que, se tivesse garantias de que Chávez respeitará os acordos já vigentes no Mercosul e a cláusula democrática do bloco, ele mudaria seu voto e aprovaria a entrada, mas disse não acreditar nisso.
O líder do DEM, José Agripino Maia (RN), destacou a questão de Israel, que tem um acordo comercial com o Mercosul e teve recentemente os diplomatas expulsos da Venezuela. “Se o Chávez mudar sua posição e garantir que vai respeitar os acordos do Mercosul com Israel, posso rever e votar a favor no plenário”, disse. Ele pediu também uma abertura, por parte do governo venezuelano, para inspeção por comissões da Organização dos Estados Americanos (OEA) e do próprio Mercosul das condições dos direitos humanos no país.
Convite rejeitado
Na votação desta quinta, os senadores também rejeitaram o convite feito na terça-feira por Ledezma para que um grupo de senadores visitasse a Venezuela para verificar as condições referentes a democracia e direitos humanos.
Jucá criticou a possibilidade dessa visita, defendida pelos líderes da oposição. “Vão fazer o que na Venezuela? Turismo? Vão perguntar ao Chávez se ele vai cumprir o que assinou? O que os senadores da oposição diriam se, em um acordo entre Brasil e Estados Unidos, por exemplo, o senado americano fizesse a mesma exigência ao Brasil?”, questionou.
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