O México é um país cuja história pode ser explicada por meio da gastronomia. A cozinha mexicana é resultado da mestiçagem que o país experimentou desde a chegada dos espanhóis até o México Contemporâneo, com o desembarque de especiarias do Oriente e Europa. No período da Revolução Mexicana, o país rompeu com as influências europeias – presentes desde o século XIX – e iniciou a celebração da gastronomia típica, bastante admirada ao redor do mundo.
Por meio do constante movimento da história mexicana, a culinária foi se enriquecendo com diversos ingredientes que a integraram de maneira harmônica, porém, foram as civilizações pré-hispânicas que definiram as bases do que é hoje a gastronomia do México, com alimentos como milho, pimentão, feijão, cação, abacaxi, goiaba, mamão, ameixa, veado, coelho, tatu, peru, gusano de maguey (larvas) e codorna.
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Mexicana prepara tortilhas, espécia de panqueca feita à base de milho e bastante popular em todo o país
“A gastronomia mexicana tem uma raiz profunda: a cozinha pré-hispânica, encontrada pelos europeus quando chegaram ao México” explica Yuri de Gortari, chefe de cozinha e pesquisador gastronômico da Escola de Gastronomia Mexicana.
No México pré-hispânico, a comida estava relacionada com a vida religiosa e a adoração dos deuses. A oferenda de alimentos às divindades e aos mortos era uma das características rituais mais importantes dessas culturas. Todo 2 de novembro os mexicanos preparam para seus mortos uma grande oferenda feita à base de comidas, bebidas e flores.
A primeira mudança importante na culinária mexicana aconteceu com a ida dos espanhóis ao México. Eles levaram em suas embarcações uma porção de novos ingredientes, como cana de açúcar, cebola, arroz, uvas, especiarias trazidas das Índias e o gado bovino, entre outros.
Se o encontro desses mundos – indígena e espanhol – foi selvagem e brutal, o dos alimentos foi harmônico e suave, dando origem à cozinha mexicana atual.
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História de sabores
Durante o vice-reinado, período da história do México em que o país foi governado por um vice-rei espanhol, foram criados os grandes pratos. Os conventos das monjas foram berços de importantes pratos que surgiram graças às grandes festividades em homenagem às classes políticas e religiosas do país.
Da cozinha convencional, por exemplo, nasceu o mole, um molho exótico e espesso, feito à base pimentões, chocolate, amendoim, gergelim e canela, e um dos pratos mexicanos mais famosos.
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Durante o período revolucionário, as tropas insurgentes se alimentaram graças às soldaderas, mulheres soldados
Com a instalação do império do austríaco Maximiliano de Habsburgo no México entre 1863 e 1867, a comida mexicana experimentou sua terceira importante transformação: o sabor francês. A influência da França culminou na introdução de uma alta cozinha de grande influência européia, sobretudo na confeitaria, com a chegada de pratos e ingredientes da França, Itália e Áustria.
O culto à cozinha européia, sobretudo a francesa, chegou a seu ponto mais alto em 1877, quando o país foi governado durante quase três décadas pelo general Porfírio Diaz. O ex-ditador mexicano foi conhecido pela grande admiração pela cultura francesa, onde a culinária tinha um papel muito importante. Diaz tinha às suas ordens o chefe Sylvain Dumont, que planejava os menus do Palácio Nacional completamente em francês.
“Nessa época o creme é integrado à culinária mexicana e as cozinhas começam a fazer sopas cremosas. Na confeitaria, na pastelaria e na padaria se percebe a influência francesa no México começamos a ter esse afrancesamento, mas conservando-se as fórmulas originais e as técnicas da cozinha pré-hispânica” explica De Gortari.
Revolução na cozinha
A ditadura de Porfírio Dias e a crise econômica em que se encontrava o país deram espaço para o nascimento de diversos movimentos operários, camponeses e intelectuais no México, que culminaram na Revolução Mexicana. Durante uma década o país viveu um severo conflito armado que afetou diretamente a gastronomia.
“O estouro da revolução colocou o México de cabeça para baixo. Os campos de cultivo se transformaram em campos de batalha e havia escassez de dinheiro, tanto que pessoas da classe alta muitas vezes não podiam comprar alimentos”, assinala De Gortari.
A crise, que gerou a guerra da Revolução e provocou a queda de Porfírio Diaz marcou uma clara perda dos laços e influências que o país tinha, tanto no aspecto gastronômico, como no cultural e social. “Com a Revolução e todo o caos generalizado, os laços com a França são perdidos, nos melhores restaurantes que se tinha no México”, afirma Enrique Olvera, chefe e dono do restaurante mexicano El Pujol, o único de comida mexicana que estava na lista S. Pellegrino dos 50 melhores restaurantes do mundo.
Durante o período revolucionário, as tropas insurgentes se alimentaram graças às soldaderas, mulheres soldados que cuidavam dos feridos, faziam comida e chegavam a combater ao lado dos homens. Elas encarregadas de transportar cozinhas portáteis para preparar alimentos básicos como feijões, tortilhas e molhos feitos de pimentão.
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No vice-reinado nasceu o “mole”, molho espesso preparado com chocolate e especiarias
“Nessa etapa, o México experimentou um desabastecimento, um período nada glorioso da cozinha mexicana. Buscava-se todo tipo de alimentos na hortas, inclusive grilos e outros insetos”, conta Ricardo Muñoz Zurita, chefe e dono do prestigioso e tradicional restaurante mexicano Café Azul y Oro.
O México teve de pagar um preço culinário alto no período da guerra da Revolução, mas depois experimentou um verdadeiro renascimento, com o restabelecimento do cultivo e da produção de alimentos. “Renasceu uma cozinha mexicana ligada às receitas ancestrais e aos costumes e então terminamos de gerar o que chamamos de cozinha tradicional mexicana” aponta Muñoz Zurita.
Dias de hoje
Nos últimos 10 anos, explica Enrique Olvera, o desenvolvimento da vozinha mexicana fez com que ela atingisse o nível das grandes cozinhas mundiais. “A cozinha mexicana tem uma identidade tão forte que é difícil copiar”, afirma o chefe Olvera.
Para celebrar a riqueza gastronômica do México e em razão do Bicentenário da Indepedência, alguns chefes em conjunto com as autoridades mexicanas desenvolveram durante o ano tours culinários para apresentar os grandes pratos da cozinha do país a seus cidadãos.
Veja a cronologia da Revolução Mexicana:
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