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Coronavírus

A pandemia e a saúde mental

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Pandemia de covid-19 impõe aos governos do mundo a necessidade de maior investimento em saúde mental

Claudia Henschel de Lima

Rio de Janeiro (Brasil)
2020-05-22T18:15:49.000Z

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“(...) luto pela perda de entes queridos, choque com a perda de empregos, isolamento e restrições à circulação, dinâmicas familiares difíceis, incerteza e medo do futuro. Problemas de saúde mental, incluindo depressão e ansiedade, são algumas das maiores causas de miséria no nosso mundo. (...) Após décadas de negligência e de investimento insuficiente em serviços de saúde mental, a pandemia de covid-19 está a atingir famílias e comunidades com um stress mental adicional. (...) Mesmo quando a pandemia estiver sob controle, a dor, a ansiedade e a depressão continuarão a afetar as pessoas e as comunidades. (...). Os serviços de saúde mental são uma parte essencial de todas as respostas do governo à covid-19. (...) Apelo aos governos, á sociedade civil, às autoridades de saúde, e à outros, que reúnam com urgência para abordar a dimensão da saúde mental desta pandemia”. (António Guterres. ONU: Serviços de saúde mental devem ser parte essencial de respostas ao coronavírus, maio de 2020) 

O discurso do secretário-geral da Organização das Nações Unidas (ONU), António Guterres,  para o lançamento do relatório Covid-19 and the Need for Action on Mental Health, em 13 de maio de 2020, deixa claro que, apesar da pandemia de covid-19 ser uma crise de saúde física, ela produz uma ampla crise de saúde mental com potencial de agravamento da miséria do mundo.

Epidemias, pandemias, guerras e desastres naturais compõem o que a Organização Mundial da Saúde (OMS) definira como sendo o quadro das emergências humanitárias. Seu impacto sobre a saúde mental é enorme, conforme é destacado Guia de Intervenção Humanitária (GIH-mhGAP):Manejo Clínico de Condições Mentais, Neurológicas e por Uso de Substâncias em Emergências Humanitárias (OPAS, 2020):

  1. O agravamento de sofrimentos psíquicos preexistentes – como é o caso da psicose, do transtorno depressivo moderado a grave e do uso prejudicial de álcool e outras drogas;
  2. O desencadeamento de outras formas de sofrimento, diretamente decorrentes da exposição humana às condições de crise humanitária, como é o caso do estresse agudo, luto, transtorno de estresse pós-traumático.

Sem mencionar, aqui, as situações de conflitos e guerras, a humanidade viveu, nos últimos quarenta anos, sob a pressão de epidemias/pandemias virais com forte impacto sobre o bem-estar psicossocial de indivíduos e comunidades. A tabela 1 apresenta sinteticamente, um traçado histórico das epidemias que irromperam no mundo a partir da década de 1980.

Tabela 1. Breve histórico de epidemias/pandemias a partir da década de 1980.

Se estiver no celular, arraste com o dedo a tabela para o lado

Epidemias/ Pandemias

Ano

HIV/AIDS

1980-1990

SARS

2002-2003

H1N1 (pandemia de Influenza)

2009

EBOLA

2013

ZIKA

2016

covid-19

2019

Fonte: Adaptado de Zhang et al, 2020.

A covid-19 irrompeu no mundo em dezembro de 2019. Provocada pelo vírus SARS-COv-2, primeiramente, fora localizada como uma epidemia regional, localizada na província de Wuhan, na China. Na época, parecia distante do que, ainda, acreditávamos ser o mundo ocidental. No entanto, em 30 de janeiro de 2020, a OMS declara o surto da covid-19, como uma emergência de saúde pública de magnitude e importância internacional alertando para o alto risco de contaminação de todo o mundo. Em 9 de março de 2020, o governo italiano anuncia medidas emergenciais severas de contenção do vírus; em 11 de março de 2020, a OMS decreta como pandêmica a covid-19. 

Da Ásia à Europa, à África e às Américas, foram apenas três meses, sucumbindo o mundo em uma emergência humanitária veloz, dado o grau de contaminação da SARS. O vírus mostra, então, como a distinção entre a China e o Ocidente não faz o menor sentido. No caso específico do Brasil, desde janeiro de 2020, a OMS dá suporte ao Ministério da Saúde para a produção de respostas à covid-19. Nosso primeiro caso foi registrado em São Paulo, em 26 de fevereiro de 2020.

Estamos, certamente, longe de um horizonte de solução da pandemia de covid-19 no mundo, por meio de medicamentos antivirais e desenvolvimento de vacina que impeçam a infecção viral. Mas, se de um lado, hoje, ainda estamos neste ponto no campo da saúde física, de outro, dispomos de uma experiência histórica sobre o impacto de situações de emergência humanitária na saúde mental de indivíduos, família e sociedade. 

Hailey Kean/Unsplash
Pandemia impõe que governos pensem na saúde mental da população

Sabemos, pelos registros históricos de outras situações de emergência humanitária, como é o caso da I Guerra, a relevância da preocupação com a irrupção de uma crise de saúde mental. 

No contexto imediato do final da I Guerra, denominada por muitos de inferno, o médico fundador da psicanálise Sigmund Freud (1918) avaliara a saúde de soldados do front e da própria população sobrevivente. Alertando para a miséria do mundo que se abria para a humanidade naquela época, com o aumento dos casos de neurose, dos sentimentos de desamparo e angústia, Freud (1918) prevera uma equivalência epidêmica dessas formas de sofrimento mental à própria tuberculose. 

No contexto da pandemia de covid-19, o estudo de Lai et al (2020) registra na república da China, altas taxas de ocorrência de depressão (50%), ansiedade (45%) e insônia (34%) em profissionais da saúde. E isso também se verifica na população em geral. A ONU (2020) cita dois estudos recentes na Etiópia e no Canadá. Os dados de Ambaw et al (2020), referentes a população do estado de Amhara, na Etiópia, estimaram um percentual de 33% de sintomas consistentes para transtorno depressivo no contexto da pandemia de covid-19, representando um aumento de 3 vezes em comparação com as estimativas da Etiópia antes da pandemia. Essas estimativas ganham uma gravidade adicional quando se verifica que, para lidar com o fator estressor da pandemia, os indivíduos recorrem ao uso de substâncias psicoativas, ou desenvolvem comportamentos aditivos relacionados a internet. A estatística do Canadá sobre consumo de álcool evidencia que 20% da população entre 15 e 49 anos aumentou o consumo durante a pandemia de covid-19. 

Esses dados recentes corroboram o próprio quadro sintomático já identificado no primeiro trimestre de uma emergência humanitária tal como é apresentado pelo documento da Fiocruz (2020) - Saúde mental e Atenção psicossocial na Pandemia covid-19: Recomendações Gerais. O documento prevê a ocorrência de reações similares na pandemia de covid-19, considerando a data de início do primeiro trimestre em cada região:

  1. Medo: de adoecer e de morrer pela doença; de infectar outras pessoas; de perder entes queridos; de perder os meios de subsistência e a renda; de ser excluído socialmente ou por ter a doença ou por ser um profissional da linha de frente.
  2. Sensações de: incerteza quanto ao futuro, impotência frente aos acontecimentos, desamparo, solidão, tristeza, luto e ansiedade.
  3. Alterações comportamentais: alimentares (ter mais apetite ou menos apetite), no sono (insônia ou sono em excesso, pesadelos).
  4. Agravamento de conflitos interpessoais com familiares, no trabalho.
  5. Alterações no pensamento: pensamentos recorrentes sobre a pandemia, a saúde dos entes queridos, a morte e o morrer.

O quadro acima indica como o contexto de emergência humanitária é uma condição de estresse severa e adicional às populações, impactando diretamente no bem-estar psicossocial. No entanto, o conjunto de registros acumulados sobre esse impacto, não impediu que a área de saúde mental fosse das mais negligenciadas pelos governos. O relatório da OPAS, A carga dos transtornos mentais na região das Américas (2018), mostra que na América Latina, Caribe não latino, América do Sul, Canadá e Estados Unidos, problemas de saúde mental são responsáveis por mais de 1/3 do número total de incapacidades. E, no entanto, o relatório registra como o financiamento em saúde mental estava abaixo do necessário, não respondendo à cobertura das necessidades na área. Até 2018, o déficit variava de 3 vezes a mais que os gastos atuais em países das Américas de alta renda a 435 vezes os gastos nos países de mais baixa renda da região (OPAS, 2018).  O que explica a preocupação da ONU em conscientizar os países para reverter a negligência e o baixo investimento em serviços de saúde mental em prol da ampliação da cobertura psicossocial para indivíduos, famílias e comunidades que foram afetadas pelos impactos da incerteza quanto ao desenvolvimento de medicamentos e vacina para a covid-19, da incerteza quanto ao futuro, do isolamento e das perdas de entes queridos que não puderam ser elaboradas por meio do ritual coletivo do luto e do funeral. 

No contexto de uma pandemia da magnitude da covid-19 - em que a medida de isolamento e, mais radicalmente o lockdown, são atualmente as principais direções de prevenção e tratamento para o vírus, e que a incerteza quanto ao futuro se consolida como horizonte em um cenário ainda sem remédio e vacina – é crucial a valorização, pelos países, do investimento na área de saúde mental por meio do incentivo à formação e consolidação de grupos de pesquisa dedicados à investigação ampla, interdisciplinar e transdisciplinar dos determinantes biológicos, psicológicos e sociais do sofrimento psíquico, bem como ao desenvolvimento de medidas para sua prevenção e tratamento. 

(*) Cláudia Henschel de Lima é professora associada da UFF (campus de Volta Redonda) e professora colaboradora do Programa de Pós-Graduação em Psicologia da UFRJ.


Referências 

Freud, S.  Linhas de Progresso da técnica Psicanalítica (1918). In: Freud, S. Edição Standard das Obras Completas de Sigmund Freud. Rio de janeiro: Editora Imago, 1987.

Guterrez, A. ONU: serviços de saúde mental devem ser parte essencial de respostas ao coronavírus, maio de 2020. https://nacoesunidas.org/onu-servicos-de-saude-mental-devem-ser-parte-essencial-de-respostas-ao-coronavirus/

Ministério da Saúde. Fiocruz. Saúde mental e Atenção psicossocial na Pandemia covid-19: Recomendações Gerais. Brasília: FIOCRUZ, 2020.

Organización Panamericana de la Salud. Organización Mundial de la Salud. La carga de los trastornos mentales en la Región de las Américas. Washington DC, 2018. www.paho.org.

Organização Panamericana de Saúde. Organização Mundial da Saúde. Guia de Intervenção Humanitária (GIH-mhGAP): Manejo Clínico de Condições Mentais, Neurológicas e por Uso de Substâncias em Emergências Humanitárias. OPAS, 2020. www.paho.org.

United Nations.  Policy Brief:covid-19 and the Need for Action on Mental Health https://www.un.org/sites/un2.un.org/files/un_policy_brief-covid_and_mental_health_final.pdf

Zhang, J., Wu, W., Zhao, Z., Zhang, W., 2020. Recommended psychological crisis intervention response to the 2019 novel Coronavirus pneumonia outbreak in China: a model of west China hospital. Precision Clinical Medicine, 3(1), 2020, 3-8. https://doi.org/10.1093/pcmedi/pbaa006. pbaa006.

AnáliseSaúde

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Política e Economia

Em 1º discurso após posse, Petro promete reforma na política contra as drogas na Colômbia

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Ao lado da espada de Simón Bolívar, novo presidente colombiano disse que a política antidrogas 'fracassou profundamente', afirmando que a 'paz é possível' no país

Redação Opera Mundi

São Paulo (Brasil)
2022-08-07T22:35:00.000Z

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Ao som ovacionado das milhares de pessoas reunidas na Praça Bolívar, em Bogotá, Gustavo Petro realizou seu primeiro discurso neste domingo (07/08) como novo presidente da Colômbia. Petro reafirmou o compromisso de uma reforma na política contra as drogas no país.

"A política contra as drogas fracassou profundamente. A guerra fortaleceu a máfia e debilitou Estados, levando-os a cometerem crimes e evaporou o horizonte da democracia. Chegou o momento de mudar a política antidrogas no mundo para que seja a vida ajudada e não a morte", disse.

Durante seu discurso, Petro pediu que a espada de Simón Bolívar fosse deixada no palco, ao seu lado. Para ele, o objeto significa "toda uma vida, uma existência" que o auxiliou no processo que culminou em sua eleição à Presidência.

Petro disse não querer que a espada esteja "enterrada", que ela seja a "espada do povo". "Chegar aqui implica recorrer uma vida, uma vida imensa que nunca é sozinha. Aqui estão todas a mulheres colombianas que lutam para superar o machismo e construir uma política do amor. As mãos humildes dos operários, dos campesinos, o coração dos trabalhadores que me apoiam sempre quando me sinto débil", declarou.

Segundo o novo mandatário, os colombianos, "muitas vezes", foram "condenados ao impossível e a falta de oportunidades". No entanto, Petro declarou a "todos que estão me escutando" que, agora, "começa nossa segunda oportunidade". 

"Nós ganhamos, vocês ganharam. O esforço de vocês valeu a pena. Agora é hora de mudança, nosso futuro não está escrito e podemos escrever juntos e em paz. Hoje começa a Colômbia do impossível", disse durante a posse, declarando que sua eleição é uma história contra aqueles que não acreditavam, "daqueles que nunca queriam soltar o poder. Porém o fizemos".

Redistribuição de riqueza

Petro afirmou que a "igualdade será possível" na Colômbia, para que a desigualdade e a pobreza não "sejam naturalizadas", já que, segundo o novo presidente, o país é uma das "sociedades mais desiguais em todo o mundo", afirmando ser necessário mudar este paradigma "se queremos ser uma nação e viver em paz". 

Reprodução/ @FranciaMarquezM
Petro e Márquez tomaram posse neste domingo como o primeiro governo de esquerda na Colômbia

"Vamos ser uma Colômbia mais igualitária e com mais oportunidades a todos. A igualdade é possível se formos capazes de gerar riqueza e capazes de distribuí-la. Para isso, é necessário uma reforma tributaria que gere justiça", afirmou durante o discurso.

O presidente reafirmou que seguirá os Acordos de Paz, assinados em 2016, e também as resoluções da Comissão da Verdade em relação à violência no país. Ele declarou que é preciso terminar "para sempre" com os conflitos armados, convocando "todos as pessoas armadas para buscar um caminho que permita a convivência, não importando os conflitos que existam".

"Encontrar soluções através da busca por mais democracia para terminar a violência. Convocamos todos os armados a deixarem as armas, aceitar jurisdições pela paz, a não repetição definitiva da violência, para que a paz seja possível. Precisamos dialogar, nos entender e buscar os caminhos comuns e produzir mudanças. A paz é possível", afirmou.

Posse de Petro

Petro tomou posse neste domingo em uma cerimônia na Praça Bolívar, em Bogotá. Aos 62 anos, ele é o primeiro mandatário de esquerda a assumir o poder na história do país.

O presidente do Senado colombiano, Roy Barreras, foi o encarregado de ler o juramento a Petro, que fala em "cumprir fielmente a Constituição e as leis" do país. Na sequência, a senadora María José Pizarro, filha de Carlos Pizarro assassinado em 1990 e que foi companheiro do agora presidente na guerrilha Movimento 19 de Abril (M-19), entregou a faixa presidencial ao novo chefe de Estado.

Também na posse, a vice-presidente eleita Francia Márquez realizou juramento, que foi lido pelo agora mandatário da Colômbia.

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