A África no carnaval carioca de 2025
Da negritude no centro do Rio de Janeiro à cultura Yorubá, Mangueira e Imperatriz Leopoldinense trarão a África para o carnaval carioca
Na coluna de hoje, vamos explorar como a rica cultura africana se manifesta nos enredos de algumas das principais escolas de samba do grupo especial.
Começando pela minha escola do coração: a Estação Primeira de Mangueira! Com seu enredo “À Flor da Terra – No Rio da Negritude Entre Dores e Paixões”, a escola cujo cenário é uma beleza nos leva a uma viagem pela influência negra no centro do Rio, desde a cultura bantu até os desafios atuais da população negra. Podemos citar alguns trechos interessantes desse samba incrível, a começar pelas citações a Luanda, Benguela e Cabinda, regiões de portos importantes de vinda do povo Bantu nos sequestros do tráfico Atlântico de escravizados, mas em especial a parte “morte e vida no oceano”, uma referência direta à cosmologia da filosofia Bakongo. Importante para os povos Bantu, que veem inclusive o mar como a Kalunga Grande, a filosofia é o mistério ancestral, o lugar que separa o mundo dos vivos do mundo dos mortos.

(Foto: Tânia Rêgo/Agência Brasil)
O Cais do Valongo, também citado no samba, é o porto que mais recebeu africanos escravizados no mundo, no centro do Rio: mais de 1 milhão de africanos podem ter desembarcado lá, vivido e morrido na Pequena África, nome criado pelo multi-artista Heitor dos Prazeres. Entre citações de divindades negras como Matamba, dos ventos e o Deus supremo Zambi, o samba recria um caminho de orgulho da população negra que faz sim macumba, bate folha, ouve os ensinamentos da mãe preta e hoje é invejada.
Ironizando os playboys que querem imitar o riscado do passinho, descolorir o cabelo e seguir a religião preta, a Mangueira em seu samba afirma: podemos sim ser o alvo que a bala insiste em achar, mas lamentamos informar; somos sobreviventes.
Saindo do mundo Bantu, e celebrando a cultura Yorubá, temos a Imperatriz Leopoldinense com o enredo ‘Ómi Tútu ao Olúfon – Água Fresca para o Senhor de Ifón’
Esse enredo é um verdadeiro portal para a cultura africana. Sob o comando de Leandro Vieira, a escola vai narrar a saga de Oxalá, o orixá da paz e da criação, em sua jornada ao reino de Oyó para visitar Xangô, o senhor da justiça e do trovão. O samba se trata de um itã Yorubá cantado, um relato sagrado que pulsa a ancestralidade africana!
O ‘funfun’, que no samba simboliza o branco de Oxalá, é uma referência direta à estética Yorubá, onde o branco significa pureza e conexão com o divino – na Nigéria, até hoje, sacerdotes de Oxalá vestem roupas brancas em rituais. A Imperatriz traz o candomblé para a Sapucaí, celebrando a espiritualidade que atravessou o Atlântico. É Exú abrindo e testando caminhos – aliás, na África, Exú é o guardião das encruzilhadas, essencial para qualquer jornada! Oxalá enfrenta provações com humildade, e a ‘água fresca’ do título é um símbolo de purificação que ecoa os ritos de Ifón, cidade real na Nigéria, onde Oxalá é reverenciado.
Ao cantar um orixá, a Rainha de Ramos exalta a cosmovisão iorubá, mostrando que o samba é resistência, é África viva na avenida! Então, se joga nessa energia, porque em 2025, a Imperatriz e a Mangueira vão fazer a Sapucaí tremer com a força dos orixás! Axé!
(*) João Raphael (Afroliterato) é escritor, professor e mestre em educação pela UFRJ. É apresentador do programa “E aí, professor?” do Canal Futura.
