Ao longo da história, apesar de ignorada por alguns setores das esquerdas e vista como mera consequência dos desenvolvimentos econômicos e sociais, a cultura ocupa lugar central nas discussões sobre raça, gênero, classe, e construção revolucionária. Frantz Fanon, Antonio Gramsci, Carlos Nelson Coutinho e Nelson Werneck Sodré foram grandes intelectuais que ajudaram a pensar o papel da cultura no âmbito da formação política da classe trabalhadora, mas também em como essa superestrutura ajudou a moldar as sociedades modernas. Mais recentemente, Tricia Rose, Nei Lopes e Luiz Antônio Simas, citando apenas três grandes nomes, têm criado obras originais, resgatando e reafirmando a cultura negra e periférica no continente americano. Um outro expoente dessa investida é o podcast Balanço e Fúria.
Criado em 2020, em meio à pandemia de Covid-19, por Rodrigo Correa – que é, também, Coordenador Editorial da Sobinfluencia Edições –, o podcast ganhou corpo, espaço, e se tornou um dos principais redutos da internet para se pensar a cultura e a contra-cultura política do século 20. Ainda que a música seja o pano de fundo do Balanço e Fúria – que passa pelo racismo, LGBTfobia, machismo, mas também trata das grandes criações da classe trabalhadora e das minorias sociais –, fotografia, arquitetura, urbanismo, artes visuais e cinema também têm, no programa, um lugar de encontro com as práticas políticas do nosso tempo. Rodrigo, além de um caster, é uma das grandes mentes pensantes desse imbróglio que é a relação entre cultura e política dentro das esquerdas.
Muitas vezes vista como alienação – exemplos são vários, como o futebol e as religiões de matriz africana e populares –, ou como puro vandalismo – caso do graffiti, pixação, skate e rap –, a cultura, no Balanço e Fúria, é vista e discutida, como afirmou Karl Marx, como “força material que se apodera das massas”, assim como é discutido o papel das armas da crítica, ou seja, da superestrutura social e sua recepção pela base material, pela política concreta.
Contando sempre com um ou mais convidados, já passaram pelo programa grandes nomes dos nossos dias, como Rodrigo Ogi, Kiko Dinucci, De Leve, Rodrigo Brandão, Malu de Barros, Lei Di Dai, e outros nomes da cultura popular brasileira. Os temas são amplos, e abrangem uma gama enorme de expressões de resistência e criatividade, oriundas das formas de vida dos povos marginalizados. Longe de pensar essas práticas culturais como um poder idealista de transformação, o Balanço e Fúria coloca a prática cultural em seu tempo histórico, alicerçado pelas necessidades de existência e resistência dos Condenados da Terra.
Além do podcast, das Discotecagem Comentadas promovidas pelo podcast, e de sua loja virtual, o Balanço e Fúria toca o projeto Memória gráfica da contracultura, pesquisa que visa resgatar documentos, cartazes, obras de arte e produções gráficas em geral que mostram as articulações entre expressões culturais e os movimentos políticos.
Portanto, se você tiver interesse em saber mais sobre a expressão rebelde da tipografia da pixação, a influência do islamismo negro no surgimento do hip-hop, a importância da pirataria e da internet no rap underground, a pedagogia dos cartazes ilustrados, a ofuscada presença de mulheres negras no jazz, o protagonismo do punk-rock nas Jornadas de Junho ou a criação do senso de comunidade nos espaços por meio da música, o Balanço e Fúria é o seu lugar.