Quinta-feira, 10 de julho de 2025
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Estreou na sexta-feira passada (27/06) a última temporada da série sul-coreana Round 6 (ou Squid Game, em seu título original), a produção de maior audiência da história da plataforma Netflix. Embora a história principal gire em torno do protagonista Gi-hun Seong, vivido pelo ator Jung-jae Lee, existem ao menos duas subtramas nesta produção final.

Uma delas enfocada na personagem No-eul, ou a Soldado 11, já que ela é uma das pessoas vestidas de macacão rosa que fazem o controle armado da ilha onde os bilionários se divertem vendo pessoas desesperadas matarem umas às outras em jogos infantis com regras extremas.

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No-eul, interpretada pela atriz Gyu-young Park, é apresentada ao público na segunda temporada. Antes de sua revelação como Soldado 11, ela é apontada como uma trabalhadora de um parque de diversões que mora dentro de um carro no estacionamento do mesmo parque.

Em seguida, o público descobre que ela é uma ex-militar da Coreia do Norte, que decidiu fugir do comunismo deixando o marido (também militar) e uma filha pequena para trás. A série mostra que ela teria sido condenada à morte, supostamente por não se mostrar uma seguidora do presidente Kim Jong-un, razão pela qual toda a sua família foi perseguida e exterminada.

O grande problema é que ela não tem nenhum contato com a trama principal. Nas séries, as subtramas costumam ser histórias paralelas que fluem durante a narrativa até que convergem com a do protagonista, para tornar o resultado mais denso e complexo no final, mas em Round 6 isso não acontece.

Não acontece, mas cria-se essa expectativa: a personagem Soldado 11 se rebela contra um esquema de tráfico de órgãos e a opressão machista dos seus superiores, ação que ocorre em paralelo à grande rebelião iniciada pelo protagonista Gi-hun, que quer colocar um fim aos jogos mortais organizados pelos bilionários. Porém, essas duas insurgências nunca se encontram.

Personagem No-eul Kang, que encabeça subtrama da temporada final da série Round 6
Netflix

Ao impedir qualquer ligação entre No-eul e a trama principal, tem-se a impressão de que sua passagem pela história serviu apenas para que exista uma crítica à Coreia do Norte nas temporadas que se seguiram à primeira, como se fosse um elemento obrigatório da série, uma espécie de tributo narrativo a ser pago para que se possa fazer também as críticas aos problemas sociais do Sul – e que a própria personagem vive, pois, como já foi dito, ela mora dentro de um carro parado em um estacionamento.

Primeira temporada

Round 6 já havia flertado com as críticas veladas à Coreia Popular em sua primeira temporada com a personagem Sae-byeok Kang – curiosamente, ambas as personagens norte-coreanas da trama têm o mesmo sobrenome, mas não são apresentadas como parentes.

Sae-byeok é uma jovem que fugiu para a Coreia do Sul e que depois conseguiu trazer seu irmão mais novo para o país, porém enfrenta dificuldades para trazer sua mãe, que continua vivendo ao norte do Paralelo 38. A personagem é interpretada por Jung Ho-yeon Jung.

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Em ambos os casos, as críticas não fogem das caricaturas tipicamente usadas para rotular países comunistas. Na história de Sae-byeok, ela precisa resgatar sua mãe porque ela está sujeita a epidemias e restrições alimentares, chegando a relatar um suposto evento em que o governo norte-coreano teria ateado fogo a uma pilha de cadáveres mortos por um suposto surto de gripe no passado.

A diferença entre Sae-byeok e No-eul é que a primeira tinha uma ligação clara com a trama principal, por ser o interesse amoroso do protagonista Gi-hun. Essa situação dá um pouco mais de peso dramático para a velada crítica ao comunismo por trás da personagem.

Novamente, surge a sensação de que a crítica ao Norte é o preço a se pagar para apontar os problemas do Sul, que também estão presentes na história de Sae-byeok, cujo irmão trazido da Coreia do Norte teve que ir morar num orfanato porque ela não tinha condições de sustentá-lo no mundo capitalista.