A Cúpula de Líderes do G20, que acontece no Rio de Janeiro nesta segunda e terça-feira (18 e 19/11), reúne as 19 maiores economias do planeta (África do Sul, Alemanha, Arábia Saudita, Argentina, Austrália, Brasil, Canadá, China, Coreia do Sul, Estados Unidos, França, Índia, Indonésia, Itália, Japão, México, Reino Unido, Rússia e Turquia) mais a União Africana e a União Europeia.
O evento que promove o encontro entre diversos chefes de Governo e delegações do mundo todo ocorre em um cenário de intensos debates sobre temas globais cruciais, como as guerras na Ucrânia e na Faixa de Gaza.
No Brasil pela primeira vez, o G20 acontece com o presidente brasileiro, Luiz Inácio Lula da Silva, como anfitrião. Durante os dois dias de evento, o mandatário lançou a Aliança contra Fome, uma adoção de medidas de combate à fome no mundo, uma das principais bandeiras da Presidência brasileira no grupo.
“A fome é a expressão biológica dos males sociais”, afirmou Lula na abertura da reunião, na manhã desta segunda-feira, lembrando o pensador brasileiro Josué de Castro, autor de Geografia da Fome e Geopolítica da Fome. Cabe a este grupo, completou o presidente, executar esta “inadiável tarefa de acabar com esta chaga que envergonha a humanidade”. Segundo o presidente, 82 países aderiram à Aliança Global contra a Fome, além de 26 organizações internacionais, 9 instituições financeiras e 31 fundações filantrópicas e ONGs.
A aliança contra a fome, proposta pelo Brasil, responde a um retrocesso, nos últimos anos, nas metas de desenvolvimento sustentável consensuadas pela Organização das Nações Unidas. Segundo dados divulgados durante o G20, cerca de 733 milhões de pessoas passaram fome em 2024. Isso significa que 1 em cada 11 pessoas no mundo sofre com a desnutrição.
Há, no entanto, um problema a ser superado, que é a obtenção de recursos para isso. Por enquanto, a decisão é mais política do que prática, e há o risco de o compromisso esbarrar na falta de recursos para o efetivo combate à fome.
Por isso, Lula defendeu, na sua fala da tarde desta segunda-feira (18/11) da reunião do G20, a taxação dos super-ricos e a reforma das instituições mundiais de poder.
Para Lula, “uma taxação de 2% sobre o patrimônio de indivíduos super-ricos poderia gerar recursos da ordem de 250 bilhões de dólares por ano para serem investidos no enfrentamento dos desafios sociais e ambientais do nosso tempo”.
O presidente brasileiro criticou ainda sanções unilaterais, que “produzem sofrimento e atingem os mais vulneráveis”, e “as instituições de Bretton Woods” – ou seja, FMI e Banco Mundial, especialmente – que teriam imposto obstáculos aos próprios objetivos de desenvolvimento sustentável que deveriam promover.
No âmbito do combate às mudanças climáticas, Lula defendeu um posicionamento mais radicalmente ativo dos países do G20, responsáveis por 80% das emissões de gases do efeito estufa, na questão climática.
“Aos membros desenvolvidos do G20, proponho que antecipem suas metas de neutralidade climática de 2050 para 2040 ou até 2045. Sem assumir suas responsabilidades históricas, as nações ricas não terão credibilidade para exigir ambição dos demais”, afirmou Lula.
Confira o que os líderes de outros países declararam sobre os temas trazidos pelo Brasil no G20
Países membros do BRICS
Líderes de países membros do BRICS, incluindo Índia, China e África do Sul, reforçaram durante o G20 a importância de combater a pobreza, a fome e as desigualdades globais.
As nações concordaram também que é essencial reformar as instituições internacionais, com foco nas necessidades do Sul Global, e destacaram o compromisso em enfrentar desafios como as crises alimentares e climáticas.
Índia
O primeiro-ministro da Índia, Narendra Modi, foi o segundo a discursar, logo após o anfitrião brasileiro, e afirmou que o Brasil “levou adiante” as decisões tomadas na Cúpula do G20 na capital indiana Nova Délhi, que antecedeu a Presidência brasileira do grupo.
“Nós nos concentramos no desenvolvimento inclusivo, na liderança por mulheres e no poder da juventude”, afirmou Modi ao mencionar que o evento no Rio de Janeiro dá importância “às esperanças e aspirações do Sul Global”, como na reunião do último ano.
Já sobre o lançamento da Aliança Global de Combate à Fome e a Pobreza, na última segunda-feira (18/11), Modi mencionou dados de segurança alimentar, desenvolvimento social e contra a pobreza na Índia. Por isso, declarou apoio à iniciativa brasileira para promover esforços contra a insegurança alimentar até 2030, falando sobre a “importância” do passo.
Modi encerrou seu discurso abordando que “os países do Sul Global são os mais afetados negativamente pela crise de alimentos, combustíveis e fertilizantes causada por conflitos globais”, por isso as discussões “só podem ser bem-sucedidas” quando os desafios e prioridades dessas nações “estão em mente”.
China
Também na 19ª Cúpula do G20 sobre Combate à Fome e à Pobreza, o presidente chinês, Xi Jinping, disse, na última segunda-feira (18/11), que a China está pronta para trabalhar a fim de construir um mundo justo de desenvolvimento comum e delineou as oito ações da China para o desenvolvimento global.
Em seu discurso intitulado “Construir um mundo justo de desenvolvimento comum”, Xi ressaltou que a transformação de uma escala nunca vista em um século está se acelerando em todo o mundo hoje, e a humanidade enfrenta oportunidades e desafios sem precedentes.
O líder chinês também mencionou a reunião do G20 realizada em seu país, a Cúpula de Hangzhou, em 2016. “De Hangzhou ao Rio, os líderes do G20 vêm trabalhando para uma mesma meta, ou seja, construir um mundo justo de desenvolvimento comum”, acrescentou ele.
“A China sempre será um membro do Sul Global, um parceiro confiável de longo prazo de outros países em desenvolvimento, além de ser um praticante ativo e empreendedor que trabalha pela causa do desenvolvimento global. A China avançará de mãos dadas com outros países em desenvolvimento rumo à modernização”, declarou.
Apresentando as ações de Pequim para apoiar o desenvolvimento global, Xi mencionou a Rota da Seda – rotas interligadas pelo comércio na Ásia -, um centro de pesquisa do Sul Global, apoio ao desenvolvimento na África, apoio à cooperação internacional na redução da pobreza e na segurança alimentar, e um Plano de Ação Anticorrupção do G20.
África do Sul
O presidente da África do Sul, Cyril Ramaphosa, apoiou “totalmente o foco da Presidência brasileira na inclusão social e na luta contra a fome”.
“É somente por meio de um sistema integrado e abrangente de apoio social que seremos capazes de ajudar os mais vulneráveis da sociedade”, instou o mandatário ao ressaltar que das 700 milhões de pessoas que vivem atualmente em extrema pobreza, 67% estão na África Subsaariana.
Ramaphosa defendeu “redobrar urgentemente os esforços para eliminar a pobreza e a fome”, além de promover a igualdade de gênero, e “superar as crises planetárias de mudança climática, perda de biodiversidade, degradação ambiental e poluição”.
Na reunião “Reforma das Instituições de Governança Global”, Ramaphosa defendeu que tais mudanças “são mais urgentes agora do que nunca”, devido aos desafios que o mundo enfrenta.
“Acredito que todos concordamos que, para que a governança mundial avance, essas instituições devem ser reformadas”, instou ao mencionar o aumento das temperaturas globais, o aumento da desigualdade entre nações e pessoas e a escalada das tensões geopolíticas em áreas como Ucrânia, Gaza e Sudão.
Trazendo a Palestina ao seu discurso, o presidente sul-africano afirmou que o povo plestino “teve seu direito à autodeterminação negado e está sob o jugo de uma ocupação brutal e violenta”, referindo-se ao ataques de Israel à Faixa de Gaza, desde 7 de outubro de 2023.
“Como coletivo do G20, precisamos somar nossas vozes para garantir que a carnificina que está ocorrendo em Gaza acabe e que trabalhemos por uma paz justa e duradoura para palestinos e israelenses”, exigiu.
Ramaphosa finalizou seu discurso garantindo que “assumirá o esforço para fortalecer e reformar o sistema multilateral para responder efetivamente às realidades globais – e para garantir que nenhum país, nem ninguém, seja deixado para trás”, quando a África do Sul assumir a Presidência do G20 em 1º de dezembro.
Países membros do G7
Os países do G7, grupo formado pelas sete maiores economias do mundo, concordaram durante o G20 em focar em soluções para a crise alimentar global, apoiar o desenvolvimento sustentável e enfrentar os desafios climáticos.
O Canadá, França, Alemanha, Itália, Reino Unido e Estados Unidos destacaram a importância de apoiar os países em desenvolvimento e garantir a transição energética de forma justa e acessível.
Todos reforçaram a necessidade de maior cooperação internacional para lidar com as tensões geopolíticas e promover a paz, com um foco especial na segurança alimentar e na redução das emissões de carbono.
Canadá
Durante evento paralelo ao G20 no último domingo (17/11), o primeiro-ministro do Canadá, Justin Trudeau, colocou a desinformação como o principal obstáculo na transição energética global.
Ele afirmou que o G20 deve ajudar os países em desenvolvimento a evitar os erros cometidos pelos países ricos, que aumentaram suas emissões sem saber como reduzi-las.
Trudeau também comentou a eleição de Donald Trump, que deve impulsionar a produção de petróleo nos EUA, e criticou o discurso de que a proteção ao meio ambiente eleva os custos. “A sensação é de que o acesso à energia está em contraste direto com nossa responsabilidade de proteger o planeta”, disse.
O primeiro-ministro canadense defendeu que as economias emergentes possam adotar tecnologias verdes de forma acessível, sem cometer os mesmos erros do Norte Global.
Ele criticou ainda as empresas de petróleo, que usam o termo “transição energética justa” para defender a exploração de combustíveis fósseis, sem abordar as emissões geradas pela queima desses produtos.
Trudeau também defendeu o fim dos subsídios aos combustíveis fósseis e anunciou que o Canadá antecipou em dois anos sua meta de encerrá-los. “As empresas de combustíveis fósseis estão lucrando bilhões de dólares. Elas não precisam de subsídios”, concluiu.
França
O presidente francês Emmanuel Macron destacou, em sua fala na cúpula na segunda-feira (18/11), a necessidade de uma reforma na governança mundial, enfatizando que as instituições multilaterais, como a ONU, precisam refletir melhor os interesses dos cidadãos. “Nós fazemos sempre comunicados. Eu acho que a lucidez deve nos levar a dizer que muito poucas pessoas os leem”, afirmou.
Macron também defendeu a mudança no Conselho de Segurança da ONU, propondo a inclusão de países da África e da América do Sul como membros permanentes. O Brasil, que reivindica um assento permanente, tem o apoio da França nesta questão.
Além disso, o presidente francês alertou para os riscos das criptomoedas, destacando que elas podem ameaçar a estabilidade financeira mundial se não forem adequadamente regulamentadas. “Acho que na nossa discussão internacional, não levamos em conta os riscos de desestabilização das criptomoedas”, disse ele.
Macron também abordou questões de segurança global, incluindo a proliferação de armas e a situação em Gaza e no sul do Líbano. Ele pediu um cessar-fogo na região.
Alemanha
O chanceler alemão, Olaf Scholz, se mostrou decepcionado nesta terça-feira (19/11), com a falta de uma declaração anti-russa pela guerra na Ucrânia no comunicado final do G20.
“É muito pouco quando o G20 não consegue encontrar as palavras para deixar claro que a Rússia é responsável”, afirmou Scholz, após o fim da cúpula no Rio de Janeiro.
Ele também criticou a falta de um comunicado sobre “o direito de Israel à autodefesa” e “a responsabilidade do Hamas” pela escalada das tensões no Oriente Médio.
Scholz destacou ainda que as tensões geopolíticas estão afetando as discussões do G20. “O vento que sopra nas relações internacionais está ficando mais forte”, completou o chanceler.
Itália
A primeira-ministra da Itália, Giorgia Meloni, afirmou nesta terça-feira (19/11) que a Itália está pronta para aumentar seu compromisso financeiro com o clima.
Ela reconheceu que os objetivos climáticos ainda estão distantes, mas acredita que o G20 “deve e pode desempenhar um papel decisivo” na transição energética.
Meloni destacou que não será possível triplicar as energias renováveis até 2030 e duplicar a eficiência energética sem uma maior cooperação entre nações desenvolvidas e economias emergentes. “Precisamos compartilhar as responsabilidades para atingir essas metas”, afirmou.
A primeira-ministra também reafirmou o apoio da Itália à força-tarefa promovida pelo Brasil, enfatizando que os países do G7 e G20 podem caminhar juntos para uma transição energética “justa e sustentável”.
Ela ainda lembrou que as nações mais vulneráveis, que menos contribuem para a poluição global, são as que mais sofrem com os impactos das mudanças climáticas.
Por fim, Meloni ressaltou os esforços da Itália na descarbonização e na pesquisa em fusão nuclear, uma tecnologia com potencial de tornar a energia mais acessível globalmente.
Reino Unido
O primeiro-ministro do Reino Unido, Keir Starmer, iniciou sua participação no G20, na última segunda-feira (18/11), destacando a necessidade de abordar a guerra entre Rússia e Ucrânia.
Ele também lembrou que nesta terça-feira (19/11) se completam mil dias do conflito, e ressaltou os impactos globais da guerra, que afeta a segurança alimentar e energética.
Starmer também pediu a libertação de reféns e um cessar-fogo imediato em Gaza, expressando preocupação com a situação dos civis palestinos, especialmente no norte de Gaza, e enfatizou que Israel deve agir conforme o direito humanitário internacional.
Além disso, o primeiro-ministro britânico anunciou a assinatura de uma declaração para listar títulos soberanos brasileiros na Bolsa de Londres e destacou os avanços nas parcerias com o Brasil, incluindo um acordo de energia limpa. Starmer afirmou que a colaboração em transição energética visa reduzir custos e aumentar a segurança energética global.
Ele também reiterou o apoio à Aliança Global contra a Fome e a Pobreza, proposta pelo presidente Lula, e destacou a importância do G20 para enfrentar desafios globais, como mudanças climáticas e pobreza, afirmando que o grupo representa 85% do PIB global e tem a responsabilidade de buscar soluções conjuntas.
Estados Unidos
Em seu discurso na segunda-feira (18/11), o presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, buscou enfatizar a importância para os norte-americanos de aumentar a pressão sobre o Hamas e de dar mais apoio para a Ucrânia.
Ele ressaltou, também, a necessidade urgente de ação para enfrentar a crise alimentar global.
Biden pediu investimentos significativos para ajudar países a alcançar os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável e apoiar os mais vulneráveis.
Ele anunciou que os Estados Unidos comprometerão US$ 4 bilhões para o Banco Mundial nos próximos três anos e mencionou a mobilização de US$ 60 bilhões para segurança alimentar na África.
O presidente também abordou a questão da dívida dos países em desenvolvimento, sugerindo um alívio financeiro para aqueles dispostos a implementar reformas.
Em relação ao avanço israelense em Gaza, Biden reiterou o “direito de Israel à autodefesa”, ecoando falas de outros líderes presentes na cúpula, mas pediu que o país aja conforme o “direito internacional”.
Além disso, Biden alertou para a crise humanitária no Sudão e pediu uma ação coletiva para resolver a violência e a fome. Ele concluiu destacando o papel do G20 na promoção de um futuro mais sustentável e equitativo.
(*) Com Ansa.