A declaração final do G20 Social, encontro da sociedade civil realizado na véspera do G20, no Rio de Janeiro, não mencionou, em nenhum de seus pontos, a crise humanitária e o genocídio em Gaza.
Em vez de citações diretas à questão Palestina, a redação final do documento priorizou declarações genéricas. O texto afirma, por exemplo, que os movimentos e organizações que participaram do G20 Social reivindicam “a necessária e inadiável reforma do modelo atual de governança global, que já se mostrou incapaz de oferecer respostas aos desafios contemporâneos e à manutenção da paz”. Também se afirma que o mundo pode “construir uma agenda coletiva que honre o compromisso com a justiça social e com a paz global”.
Segundo integrantes do governo ouvidos por Opera Mundi, a omissão não foi resultado de pressão, mas do processo de construção da declaração. Esse processo teria priorizado o consenso e a elaboração em torno dos eixos propostos pela presidência brasileira do G20.
“A natureza do documento foi apresentar ideias centrais, como contribuição da sociedade civil nacional e internacional envolvida no G20 Social, referentes aos três eixos definidos pela Presidência brasileira do G20: combate à fome, às desigualdades e à pobreza; sustentabilidade, mudanças climáticas e transição justa; e reforma da governança global”, afirmou Renato Simões, secretário nacional de Participação Social e coordenador de metodologia do G20 Social. “Durante todo processo de preparação do texto da Declaração Final do G20 Social não houve menções diretas a nenhuma situação específica, nem nas plenárias preparatórias, nem na plataforma Brasil Participativo e nem nas atividades autogestionadas, expressando destaques sobre situações extremas representativas dos três eixos”, completou ele.
Questionado se o fato de o documento deixar de mencionar a principal crise humanitária hoje no mundo não enfraqueceria o documento, Renato Simões avaliou que “a declaração final expressa uma potente fala da sociedade civil em defesa da paz, do desenvolvimento e da justiça socioambiental”. Renato Simões também afirmou que, “em nenhum momento”, houve pressão para retirada do tema da declaração final.
Também a Opera Mundi, Manuella Mirella Nunes da Silva, presidenta da UNE (União Nacional dos Estudantes), também justificou a ausência direta da Palestina na declaração como resultado da opção por seguir os eixos propostos pelo governo brasileiro. “A questão da Palestina é central em todo o debate atual para as relações internacionais, principalmente em um dos pontos centrais do G20: a reforma da governança global”, diz ela.
“Há de fato um apelo dos movimentos sociais ao cessar fogo imediato ao genocídio na Palestina e essa é uma das principais bandeiras do internacionalismo da UNE e dos estudantes no mundo! O documento não explicita a Palestina, porém sustenta fortemente a necessidade da Paz e do fim dos conflitos propondo a reforma do modelo atual de governança global, multilateralismo e ampliação da participação dos governos e povos dos países do Sul Global”, continua.
Manuela disse ainda que, antes do G20, “alguns grupos de engajamento conseguiram consenso em torno do tema da Palestina”: “o Y20, grupo de engajamento da juventude, determina explicitamente o cessar fogo imediato na Palestina. “A UNE articulou e acompanhou o debate no Y20 e reforça o chamado da juventude pelo fim do genocídio em Gaza”.
“A situação de Gaza e Haiti, entre outras, foram anotadas em declarações paralelas e pela manifestação das próprias organizações em seus fóruns próprios”, disse Antonio Lisboa, secretário de Relações Internacionais da Central Única dos Trabalhadores (CUT).
Amanda Harumy, da Organização Caribenha e Latino-Americana da dos Estudantes (OCLAE), reconhece que “não conter a defesa específica da Palestina nesse momento de crise humanitária é um ponto de debilidade” do documento. Mas ressalva que “a construção do consenso em qualquer espaço do G20 é complexa e exige um nível de costura política ampla, que construa uma agenda positiva, na qual avancemos com propostas práticas que realmente possam reformular a estrutura do mundo geopolítico”.
Assim como Manuella Nunes da Silva, da UNE, Harumy destacou a importância do Y20, que defendeu em seu posicionamento final o cessar-fogo imediato em Gaza, a libertação de todos os reféns e prisioneiros sujeitos a detenções arbitrárias e a retirada das forças israelenses de Gaza.
Durante o G20, movimentos populares que participaram do G20 Social fizeram uma grande marcha na orla de Copacabana em protesto contra o genocídio da população palestina na Faixa de Gaza. Nesta segunda-feira (18/11), um protesto na Cinelândia denuncio a cumplicidade do G20 com o genocídio.
Em seu discurso na entrega do documento do G20 Social, o presidente Lula não mencionou a questão palestina, embora tenha mencionado a destruição de Gaza na abertura do Urban20, evento paralelo que reunia prefeitos de todo o mundo na véspera do G20.
Colaboraram Fernanda Forgerini e Duda Blumer.