Atualizado em 05/09, às 13h33
Advogados da Argentina e do Brasil denunciaram o assassinato de duas meninas de 11 anos de idade por tropas militares do Paraguai durante uma operação contra o grupo guerrilheiro Exército do Povo Paraguaio (EPP) que ocorreu na última quarta-feira (02/09) na cidade de Concepción.
Segundo os representantes, as crianças, que eram cidadãs argentinas, foram mortas pela Força de Tarefa Conjunta (FTC), órgão que faz parte das Forças Armadas do Paraguai, e apresentadas como as únicas “vítimas guerrilheiras” de um “enfrentamento armado” com o EPP.
Em entrevista a Opera Mundi, a advogada brasileira Sabrina Diniz, que assessora o tio das vítimas, disse nesta sexta-feira (04/09) que as meninas serviram como falso positivo do governo paraguaio, ou seja, foram mortas e posteriormente vestidas como guerrilheiras. “Nas fotos, as crianças estão vestidas de guerrilheiras, mas essas vestimentas não estão sujas de sangue. As crianças foram vestidas depois de mortas”, afirma.
María del Carmen Villalba e Lillian Villalba, que completaria 12 anos em outubro, eram filhas de membros do EPP e estavam no local para visitar os pais.
De acordo com Diniz, foi negado à família o acesso aos corpos, que foram enterrados pelo governo paraguaio sem autorização dos parentes. A advogada ainda afirmou que a retirada dos corpos está prevista para a manhã deste sábado (05/09). Eles serão levadas ao cemitério de Lima, no Paraguai, onde ficarão enterrados até que se possa repatriá-los.
Segundo a advogada, “existe a possibilidade de as meninas terem sido torturadas e violadas”, o que só será possível confirmar quando a família tiver acesso aos corpos.
Na noite desta sexta-feira, o Ministério de Relações Exteriores da Argentina exigiu esclarecimentos do governo paraguaio e pediu que o país vizinho identifique os responsáveis pelo assassinato. “Se mantém contatos com as autoridades paraguaias a fim de esclarecer as circunstâncias em que se produziram essas mortes e se iniciaram os trâmites consulares pertinentes”, disse a chancelaria argentina em nota.
Presidente visitou local
Na quarta-feira (02/09), tropas da FTC invadiram um acampamento do EPP na cidade de Concepción, a cerca de 400 km da capital Assunção. A operação foi celebrada pelo governo, e o presidente do Paraguai, Mario Abdo Benítez, posou, armado, para fotos no local da invasão.
“Tivemos uma operação exitosa contra o EPP. Após enfrentamento, dois integrantes deste grupo armado foram abatidos. Agradeci a equipe por sua valentia e luta contra esse grupo criminoso”, escreveu o presidente pelo Twitter.
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Presidente do Paraguai, Mario Abdo Benítez, (ao centro) posou, armado, para fotos no local da invasão
A versão do governo paraguaio afirma que a idade das garotas não pôde ser determinada. Cristian Ferreira, médico forense do Ministério Público do distrito de Horqueta, chegou a afirmar que “um dos corpos tinha idade aproximada de 17 a 18 anos, e o segundo corpo uma idade aproximada de 15 anos”.
Os advogados rejeitam essa versão. Segundo a La Gremial – Associação Sindical de Advogados e Advogadas da Argentina -, “as meninas eram civis e, além disso, eram argentinas, e não faziam parte da feroz luta de classes que se desenrola no Paraguai”.
“Responsabilizamos o Estado paraguaio e seus colaboradores colombianos, norte-americanos e israelenses que operam em conjunto”, disse a organização.
Outra entidade a se manifestar foi o Partido Comunista do Paraguai (PCP), que chamou o episódio de um “ato terrorista, próprio de grupos armados da máfia, que é a definição mais próxima da condição da FTC”.
“Familiares e amigos, tanto no Paraguai como na Argentina, garantem que as meninas nasceram no país vizinho, tinham a idade mencionada [11 anos], vinham por apenas alguns dias para ver seus pais e não tinham a mínima condição de levantar fuzis”, disse o partido em nota.
O PCP ainda exigiu a “renúncia imediata dos ministros da Defesa e do Interior, Bernardino Soto Estigarriba e Euclides Acevedo, respectivamente, assim como o julgamento e punição dos chefes policiais e militares que comandaram essa operação terrorista”.
Comissão Interamericana de Direitos Humanos
A Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) repudiou na manhã deste sábado a morte das adolescentes na ação da FTC contra o grupo de guerrilheiros. O órgão afirmou que o governo paraguaio deve investigar o caso.
“O CIDH insta o Estado do Paraguai a investigar as circunstâncias da morte das adolescentes e redobrar esforços na adoção de medidas preventivas ao recrutamento forçado de meninas, meninos e adolescentes por grupos armados”, disse.