A tripulação do navio Humanity 1 recusou neste domingo (06/11) uma ordem do governo da Itália para deixar o porto de Catânia com os 35 migrantes impedidos de desembarcar no país. Os demais tripulantes – doentes, gestantes e crianças, foram autorizados a entrar no território italiano nesta manhã.
A embarcação pertence à ONG alemã SOS Humanity e, ao lado de outros três navios humanitários, protagoniza um braço de ferro com a gestão da premiê de extrema direita Giorgia Meloni sobre o acolhimento de deslocados internacionais.
“Hoje nosso capitão, Joachim Ebeling, foi contatado pelas autoridades para que deixe o porto com os 35 sobreviventes. Ele explicou que não pode fazer isso e que ficaremos aqui até que os sobreviventes desembarquem”, disse a ONG.
O Humanity 1 havia resgatado 179 pessoas no Mediterrâneo Central, rota migratória mais mortal do mundo, segundo a Organização Internacional para as Migrações (OIM), mas 144 tiveram autorização para desembarcar em Catânia por motivos médicos neste domingo.
Outros três navios humanitários também aguardam a designação de um porto seguro pela Itália: o Geo Barents, de Médicos Sem Fronteiras, com 572 náufragos a bordo e que já está em Catânia; o Ocean Viking, da SOS Méditerranée, com 234; e o Rise Abobe, da Mission Lifeline, com 90.
Normas internacionais de navegação determinam que pessoas resgatadas em alto mar sejam obrigatoriamente levadas ao porto seguro mais próximo, mas o novo governo italiano quer que os países de origem dos navios humanitários que operam no Mediterrâneo Central – Alemanha e Noruega – se responsabilizem pelos migrantes.
A linha dura contra as ONGs é capitaneada pelo ministro da Infraestrutura Matteo Salvini, que é responsável pela gestão dos portos italianos e ainda conseguiu emplacar um aliado fiel, Matteo Piantedosi, como ministro do Interior, pasta encarregada das políticas migratórias.
Twitter/SOS Humanity
Normas internacionais de navegação determinam que pessoas resgatadas em alto mar sejam obrigatoriamente levadas ao porto seguro mais próximo
França e Alemanha já se ofereceram para acolher parte dos migrantes, mas outros países da União Europeia, como Polônia e Hungria, aliados de Meloni e Salvini, boicotam sistematicamente as tentativas do bloco de redistribuir os deslocados internacionais, de modo a reduzir o peso do primeiro acolhimento sobre a Itália.
De acordo com o Ministério do Interior, 87,4 mil migrantes forçados já desembarcaram nos portos italianos em 2022, crescimento de 61% em relação ao mesmo período do ano passado.
Os principais países de origem são Egito (17,7 mil), Tunísia (16,9 mil), Bangladesh (12,3 mil), Síria (6,4 mil) e Afeganistão (6,1 mil).
No entanto, a maior parte desses deslocados segue viagem rumo ao norte da UE, para nações como a Alemanha, que registra 114 mil pedidos de refúgio em 2022, contra 37 mil da Itália.
Segundo a OIM, quase 1,3 mil pessoas já morreram ou desapareceram tentando concluir a travessia do Mediterrâneo Central em 2022, média de mais de quatro fatalidades por dia.
Papa cobra solidariedade
O papa Francisco cobrou também neste domingo “solidariedade da União Europeia” para acolher as centenas de migrantes forçados que aguardam para desembarcar na Itália.
“As vidas devem ser salvas, o Mediterrâneo é um cemitério, talvez o maior cemitério, mas a Itália não pode fazer nada sem acordo com a Europa”, disse o líder da Igreja Católica.
Segundo Jorge Bergoglio, todos os governos da União Europeia “devem se colocar de acordo sobre quantos migrantes podem receber”.
“E a União Europeia deve assumir uma política de colaboração e ajuda, não pode deixar para Chipre, Grécia, Itália e Espanha a responsabilidade por todos os migrantes que chegam em suas praias”, salientou.
Além disso, o Papa cobrou que a Europa incentive o desenvolvimento na África para que seus habitantes não tenham mais de fugir. “A exploração das pessoas na África é terrível”, acrescentou.