Enquanto os Estados Unidos se preparavam para as eleições presidenciais de 5 de novembro, o conselho editorial do jornal Los Angeles Times planejava anunciar apoio à vice-presidente Kamala Harris como próxima presidente do país. Mas a decisão editorial esbarrou em outro poder: a família do proprietário, Patrick Soon-Shiong, optou por interromper o apoio e declarar neutralidade na disputa. Semanas após a decisão, a filha do bilionário, Nika Soon-Shiong, revelou que o motivo central da decisão foi a postura pró-Israel de Kamala Harris na guerra em Gaza.
O endosso do LA Times a Harris era esperado, afinal, a atual vice-presidente dos EUA é nativa da Califórnia e residente de Los Angeles. Assim, anúncio do periódico fez leitores “especularam com raiva sobre uma decisão que foi amplamente considerada um favor ao candidato republicano Donald] Trump e um voto de desconfiança à Harris”, de modo que assinaturas foram canceladas, três membros do conselho editorial renunciaram e cerca de 200 funcionários assinaram uma carta aberta exigindo uma explicação para o posicionamento – uma vez que a questão palestina ainda não havia sido mencionada.
Segundo a reportagem original do The New York Times, Nika Soon-Shiong, que é ativista política e progressista, mas não tem nenhum cargo oficial no jornal, afirmou que a decisão em não apoiar nenhum candidato à Presidência foi “conjunta da família”.
“Como cidadã de um país que financia abertamente um genocídio, e como uma família que experimentou o apartheid sul-africano, o apoio seria uma oportunidade de repudiar justificativas para a ampla perseguição de jornalistas e a guerra contínua contra crianças”, declarou.
O argumento foi respaldado em suas redes sociais, ao dizer que o ato “não é um voto para Donald Trump”, mas sim “uma recusa em apoiar um candidato que está supervisionando uma guerra contra as crianças”.
This is not a vote for Donald Trump. This is a refusal to ENDORSE a candidate that is overseeing a war on children. I’m proud of the LA Times’ decision just as I am certain there is no such thing as children of darkness. There is no such thing as human animals.
— Nika Soon-Shiong 🇵🇸 (@nikasoonshiong) October 25, 2024
“Estou orgulhosa da decisão do LA Times, assim como tenho certeza de que não existe tal coisa como filhos das trevas. Não existe tal coisa como animais humanos”, fazendo referência às características atribuídas aos palestinos por autoridades políticas de Israel.
No entanto, posteriormente o proprietário do jornal e pai de Nika pronunciou-se sobre a decisão e contrariou as declarações da filha: “Nika fala em sua capacidade pessoal sobre sua opinião, como todo membro da comunidade tem o direito de fazer. Ela não tem nenhuma função no LA Times, nem participa de nenhuma decisão ou discussão com o conselho editorial, como já foi deixado claro muitas vezes”, afirmou, por meio de um porta-voz.
Em suas redes sociais, o dono do periódico “esclareceu como a decisão” do não endosso a nenhum dos candidatos ocorreu.
“O Conselho Editorial teve a oportunidade de elaborar uma análise factual de todas as políticas positivas e negativas de cada candidato durante seus mandatos na Casa Branca, e como essas políticas afetaram a nação. Além disso, o Conselho foi solicitado a fornecer sua compreensão das políticas e planos apresentados e seu efeito potencial na nação nos próximos quatro anos. Dessa forma, com essas informações claras e não partidárias lado a lado, nossos leitores poderiam decidir quem seria digno de ser presidente pelos próximos quatro anos”, declarou Soon-Shiong.
So many comments about the @latimes Editorial Board not providing a Presidential endorsement this year. Let me clarify how this decision came about.
The Editorial Board was provided the opportunity to draft a factual analysis of all the POSITIVE AND NEGATIVE policies by EACH…
— Dr. Pat Soon-Shiong (@DrPatSoonShiong) October 23, 2024
“Em vez de adotar esse caminho como sugerido, o Conselho Editorial optou por permanecer em silêncio e eu aceitei sua decisão. Por favor, votem”, instou ainda, sem mencionar as declarações de Nika.
O posicionamento de Patrick Soon-Shiong condiz com a informação detida pelos funcionários do conselho editorial que renunciaram. “Se essa foi a razão pela qual Soon-Shiong bloqueou um endosso de Kamala Harris, isso não foi comunicado a mim ou aos redatores editoriais”, declarou Mariel Garza ao NYT.
“Se o objetivo da família era ‘repudiar justificativas para o ataque generalizado a jornalistas e a guerra contínua contra crianças’, permanecer em silêncio não conseguiu isso”, afirmou.
Após a crise interna, o proprietário concedeu uma entrevista ao canal de notícias Spectrum, no qual declarou “querer desesperadamente que seu jornal transmita todas as vozes” e se autodeclarou como “independente” .
Posteriormente, o também bilionário do ramo biomédico afirmou que a falta de endosso a Haris “não se baseava em nenhuma questão única” ou pretendia favorecer qualquer um dos dois candidatos.
Enquanto isso, editores seniores do LA Times denunciam que Soon-Shiong frequentemente criticava o governo do atual presidente Joe Biden e se gabava de um jantar que manteve com Trump após vencer a corrida eleitoral de 2016.
(*) Com Brasil247