Em 2025, USP receberá obras do modernista John Graz
Instituto de Estudos Brasileiros guardará acervo do artista plástico e arquiteto de interiores suíço que surpreendeu na Semana de Arte Moderna de 1922
A partir de fevereiro de 2025, o acervo do artista suíço modernista John Graz passa a integrar o Instituto de Estudos Brasileiros (IEB) da Universidade de São Paulo (USP).
A movimentação para a transição das obras, que atualmente são de posse da família do artista, para o IEB partiu do próprio Instituto John Graz. Para entender todos os detalhes da passagem do acervo, Opera Mundi conversou com a diretora-executiva do instituto, Claudia Worms Taddei.
A especialista em marketing cultural relatou que o instituto estava à procura de potenciais locais para receber parte do acervo de Graz há mais de seis anos. “Tudo começou com o interesse de doar a parte relativa à arquitetura, design e design de interiores”, afirmou sobre algumas obras que poderiam interessar a Faculdade de Arquitetura e Urbanismo (FAU) da USP, considerada como uma opção pela família.
“Mas entendemos que o IEB era muito mais adequado, em função de ser um instituto mais preparado para manter e fazer a guarda de obras em papel”, disse. O local também compõe o trabalho do pintor e artista plástico.
A escolha do Instituto de Estudos Brasileiros
De acordo com Taddei, ao longo desses anos em que o Instituto John Graz considerava o local adequado para receber o acervo, o IEB também recebeu coleções de outros artistas que participaram da Semana de Arte Moderna de 1922, influenciando a decisão final da organização.
“Além de aumentar sua capacidade de guarda, aumenta cada vez mais o potencial do IEB de atuar como um instituto de pesquisa”, relata a especialista ao mencionar o desejo de que as obras de Graz possam se transformar em objetos de estudo juntamente com outros trabalhos modernistas.
Taddei declarou que o Instituto John Graz “ficou muito feliz em saber que o acervo vai estar muito bem acompanhado por outros modernistas que compõem o IEB”. “Essa convergência e diálogo é muito importante para nós”, completou.
“O nosso primeiro contato há mais ou menos seis anos tinha esse intuito. Antes da pandemia fizemos uma reunião e, após, retomamos as tratativas quando os filhos passaram a ser os mantenedores e doadores do instituto. Então começamos a pensar na sustentabilidade, sucessão e vida futura do instituto”, disse.
A diretora informou que um instituto tem dois grandes objetivos: preservação e difusão das obras. Com isto em mente, contataram o IEB para fazer a guarda de parte do acervo, visando reduzir o trabalho e custos internos de preservação.
“Mas o mais importante sempre foi o desejo de que as obras pudessem ser acessadas por pesquisadores e estar disponíveis publicamente. E como não temos estrutura física para esse acesso, o IEB pareceu realmente ser uma instituição mais adequada em função do seu foco de pesquisa”, pontuou.
De acordo com Taddei, o desejo do instituto era que o trabalho de Graz fosse cada vez mais acessado, pesquisado e estudado, considerando especialmente que há uma grande parte do acervo desconhecida pelo grande público, que é a parte de arquitetura e design.
“Para nós é muito importante e interessante que esse trabalho e pesquisa se amplie. O IEB tem essa função e colabora com a missão do instituto. Também colabora com uma equipe técnica muito importante, por exemplo a Ana Paula Simioni, que é uma grande conhecedora do trabalho do Graz e é pesquisadora parceira do IEB”, exemplificou.
Determinado o IEB como o local que receberia o acervo de Graz, conversas internas, com o conselho do Instituto John Graz, familiares e empreendedores foram realizadas para “concentrar em um único espaço não apenas suas obras, mas também todo o material de pesquisa” que o modernista utilizava, como catálogos, exposições de materiais, objetos de trabalho, fotos pessoais, revistas, jornais e “tudo o que colabora e contribui” com sua pesquisa – exatamente tudo o que compõem um acervo.

Artista suíço modernista John Graz, conhecido por seus trabalhos na arte plástica e arquitetura de interiores
O que a USP recebe de Graz?
Antes da pandemia, o Instituto John Graz havia doado cerca de 50 obras para a Pinacoteca, prioritariamente telas e guaches, assim o IEB recebe especialmente obras em papel.
“Doamos para o IEB cerca de 1.650 obras, sendo 95% em papel – como desenhos abstratos figurativos, de móveis, projetos de arquitetura e interiores, e guaches. 100% dos materiais de pesquisa do Graz já foram doados com a finalidade de difusão. Com a família ficou um acervo muito pequeno, de mais ou menos 30 obras”, informou Taddei sobre o que USP recebe a partir de fevereiro de 2025.
Acervo de Graz poderá ser acessado
Seguindo um dos principais objetivos do Instituto John Graz, o acervo do artista poderá ser acessado de acordo com as regras do IEB.
Opera Mundi também conversou com a unidade de estudos da USP e, segundo suas ordens internas, o acervo de Graz poderá ser acessado após arquivado na Reserva Técnica do prédio. Antes disso, é possível que algumas obras precisem de tratamento ou restauração.
Após esse procedimento, pesquisadores ou interessados podem entrar em contato com o IEB para agendar um horário de visita. Tais métodos não são apenas orientações para este acervo específico do Graz, mas para todos os guardados pelo IEB.
Eventualmente, como qualquer outro acervo, é possível que as obras sejam expostas em museus ou institutos. Contudo, não há projeção de agenda para tal.
A diretora do Instituto John Graz afirmou, contudo, que o acesso digital ao acervo de Graz já foi disponibilizado pela própria organização. “Fizemos uma curadoria das principais e mais representativas obras, e disponibilizamos digitalmente em nosso site, que pode ser acessado de forma gratuita”.
John Graz e a Semana de 22
Taddei afirmou que apesar de ser conhecido pela Semana de Arte Moderna de 1922, o trabalho de Graz “se estende muito além”, apesar de este ter sido “um grande marco”.
“Foi uma primeira grande participação. Foi a entrada dele no Brasil, porque chega aqui pouco antes da Semana de 22 e acaba sendo reconhecido depois de uma pequena exposição no centro de São Paulo. Suas obras são conhecidas por Oswald de Andrade que se entusiasmou muito pelo seu trabalho e acaba convidando John para participar do evento”.
A diretora do instituto contou que Graz participou com seis ou sete obras na Semana de 22, dando o pontapé inicial ao seu trabalho e atuação no Brasil.
“Ele era um suíço, diferente da grande maioria ali que não eram europeus, e participou com sua influência da Bauhaus [escola de arte vanguardista da Alemanha] e também sua formação em artes e ofícios na Suíça. Depois da Semana de 22, ele acaba enveredando e ampliando o seu trabalho como arquiteto de interior e designer”, disse ao descrever as obras de Graz como “intermitente porque flutuam entre as artes plásticas, arquitetura e design”.
Segundo Taddei, alguns anos após a Semana de 22, Graz é reconhecido como arquiteto e decorador e passa a trabalhar com grandes famílias ricas de São Paulo, fazendo casas e projetos de interiores. Nesta fase, o artista não deixou de produzir como artista plástico.
“Isso acontece até mais ou menos na década de 1960, então ele vai reduzindo sua atuação como designer e arquiteto de interiores e retomando aos poucos sua atuação como artista plástico – muito mais por lazer e gosto do que necessidade financeira. Por isso seu trabalho como arquiteto de interior tem a ver com estabelecimento financeiro”, relatou.
