Centenas de manifestantes tomaram as ruas de Nova York nesta segunda-feira (10/03) exigindo a libertação de Mahmoud Khalil, um estudante palestino recentemente formado pela Universidade Columbia.
Os manifestantes entoaram diversas palavras de ordem, como “Hands off the students now!” (“Tirem as mãos dos estudantes agora!”), e denunciaram a universidade por conivência com as autoridades. Muitos participantes classificaram a detenção como um caso de “sequestro”, atribuindo a prisão de Khalil a uma escalada de xenofobia e islamofobia nos Estados Unidos.

Khalil, residente permanente legal no país e detentor do green card, foi detido no final de semana por agentes do Departamento de Segurança Interna (ICE) dos Estados Unidos. Segundo a agência de notícias Associated Press, ele foi transferido para um centro de detenção na Louisiana.
A prisão ocorreu um dia após o governo de Donald Trump anunciar um corte de US$ 400 milhões em financiamento federal para a Universidade Columbia, alegando que a instituição falhou em conter um suposto antissemitismo no campus. Khalil foi um dos líderes dos protestos que ocorreram na universidade em 2024 contra o genocídio de Israel contra os palestinos na Faixa de Gaza, o que aumentou as especulações sobre a natureza política de sua detenção.
No último ano, Khalil enfrentou medidas punitivas por parte também da Universidade Columbia devido ao seu ativismo. Ele foi um dos principais negociadores dos “Acampamentos de Solidariedade à Gaza” organizados no campus em 2024 e participou de diversas entrevistas e coletivas de imprensa. A instituição chegou a suspender o estudante, mas voltou atrás poucas horas depois.
Do palanque improvisado em frente à sede do Departamento de Segurança Interna de Nova York, uma das manifestantes declarou que a prisão de Khalil não irá intimidar os protestos. “A gestão de Trump acha que isso vai nos assustar, que vai nos tirar das ruas. Mas vamos continuar lutando”, afirmou.
Fahd Ahmed, diretor executivo da organização Desis Rising Up & Moving (DRUM), que trabalha com direitos de imigrantes em Nova York, alertou para os riscos enfrentados por estudantes estrangeiros que participam de manifestações. “Sabemos que aqueles que não são cidadãos estão sempre mais em risco, mas também sabemos que esses ataques não vão parar”, disse. “Estamos nos preparando para continuar nossa defesa, nossa unidade e nossa organização.”
Prisão sem mandado formal
Relatos indicam que Khalil foi abordado por agentes do ICE na entrada de sua residência, um imóvel da Universidade Columbia, enquanto entrava no local acompanhado da esposa, cidadã norte-americana grávida de oito meses. Os agentes, sem uniformes, infiltraram-se no prédio, confirmaram sua identidade e procederam com a prisão sem apresentar mandado judicial.
Testemunhas afirmam que os agentes ameaçaram sua esposa, sugerindo que ela também poderia ser detida caso tentasse intervir. Inicialmente, o ICE alegou que Khalil teve seu visto de estudante revogado pelo Departamento de Estado, mas, ao apresentar o green card, um dos agentes demonstrou surpresa e precisou confirmar a informação por telefone. Minutos depois, os agentes afirmaram que o documento também havia sido anulado, sem dar mais explicações.

Vigilância e repressão a ativistas estudantis
A detenção de Khalil ocorre em meio a um aumento na repressão contra estudantes envolvidos em manifestações pró-Palestina nos Estados Unidos. Segundo o site Axios, uma iniciativa chamada “Catch and Revoke” (“Capturar e Revogar”) foi lançada pelos Departamentos de Estado, de Justiça e ICE para monitorar ativistas a partir da análise de redes sociais por meio de inteligência artificial.
No entanto, a Universidade de Columbia também tem sido criticada por sua colaboração com as autoridades federais. Recentemente, a instituição divulgou diretrizes que recomendam que professores e funcionários “não interfiram” na ação de agentes da Segurança Interna, mesmo que estes não apresentem mandado judicial.
Alunos relataram que agentes de imigração têm abordado estudantes nos arredores do campus, gerando temor entre imigrantes e minorias raciais.
Professores denunciam repressão a estudantes
Na contramão da reitoria da Columbia, professores da instituição e do Barnard College realizaram uma coletiva de imprensa nesta segunda para condenar a prisão de Khalil, classificando-a como uma grave violação da Primeira Emenda, que garante a liberdade de expressão.
A professora Nadia Abu El-Haj, da Universidade de Columbia, declarou: “a história de Mahmoud é a história do povo palestino. Mas sejamos claros: ele foi detido por sua expressão política — um discurso que incomoda alguns dos meus colegas, estudantes e muitos agitadores fora da universidade. Tentam silenciá-lo difamando palestinos e manifestantes palestinos como antissemitas.”
Por sua vez, a docente Nara Milanich, do Barnard College, reforçou: “as universidades não podem existir quando estudantes são perseguidos, presos e desaparecem por conta de suas crenças políticas”. Ela acredita que estas instituições não podem funcionar quando “administradores chamam a polícia para resolver tensões no campus com armas e algemas”, remontando a estratégia utilizada pela Columbia para acabar com os acampamentos no campus.
Para a professora Marianne Hirsch, do Columbia Jewish Faculty Group, a repressão aos estudantes faz parte de uma estratégia política maior. “Meus colegas judeus e eu alertamos que a falsa caracterização da Universidade Columbia como um centro de antissemitismo seria usada como pretexto para reprimir protestos e discursos críticos. Agora, está claro que o que está em jogo para a administração Trump é o controle estrito sobre a liberdade de expressão, a dissidência e o ensino superior como um todo,” alertou.
Também no protesto a rabina Rachel Goldenberg recorreu às escrituras para condenar o que considera atos de autoritarismo. “Hoje, evocamos a Rainha Ester e enfrentamos aqueles que usam nossa segurança como pretexto para reprimir protestos estudantis legais e pacíficos, deter um futuro pai com green card, sufocar o movimento pela libertação palestina e desmantelar a educação superior. Conclamamos todas as pessoas de consciência a se inspirarem no exemplo de Ester: resistir ao medo, à intimidação e recusar qualquer colaboração com a agenda autoritária de Trump”, pediu ela.

Deportação suspensa por decisão judicial
O presidente Trump comentou a detenção em sua plataforma Truth Social, classificando como “a primeira de muitas” em meio às medidas de repressão contra estudantes e supostos “agitadores” que protestam contra as ações militares de Israel. “Não toleraremos atividades pró-terroristas, antissemitas e antiamericanas em nossas universidades”, escreveu o republicano, alegando que os protestos são organizados por “agitadores pagos”.
Apesar da retórica do presidente, uma decisão judicial suspendeu temporariamente a deportação de Khalil, marcando uma audiência após seu advogado entrar com uma petição contra a prisão.