Após 80 dias de bloqueio total por Israel, palestinos voltam a comer pão
'Precisamos de mais farinha para alimentar famílias desesperadamente necessitadas', afirma Cindy Mc Cain, chefe do Programa Mundial de Alimentos da ONU
Mais de 2 milhões de palestinos aguardam em filas imensas pela distribuição dos pães, que voltaram a ser produzidos com a entrada de farinha na região, nesta quinta-feira (22/05), após 82 dias do brutal bloqueio de ajuda humanitária, perpetrado por Israel.
As padarias, insuficientes frente à urgência da fome, foram reativadas com ajuda do Programa Mundial de Alimentos (PMA) das Nações Unidas, conforme relatou a chefe da organização da ONU, Cindy McCain.
“Precisamos de mais farinha de trigo, mais combustível, mais acesso seguro – para que mais fornos possam voltar a funcionar e alimentar famílias desesperadamente necessitadas”, apelou McCain, em publicação na plataforma X.
As cozinhas beneficentes são um dos poucos pontos de acesso à alimentação. Famílias deslocadas de suas casas pelos bombardeiros enfrentam longas filas para garantir porções mínimas, enquanto médicos alertam para o avanço da desnutrição, especialmente entre crianças e idosos.
O ministro da Saúde da Autoridade Palestina, Majed Abu Ramadan, afirmou à Al Jazeera que 29 crianças e idosos morreram de causas “relacionadas à fome” nos últimos dias. Ele também disse que as previsões “muito realistas” das Nações Unidas de que 14.000 bebês poderiam morrer de fome pode estar subestimadas.

Reprodução vídeo / @WFPChief
Quantidade é insuficiente
Os caminhões com farinhas, comidas para bebês e medicamentos voltaram a entrar no território nesta quinta-feira (23/05), mas o volume está longe de atender às necessidades. Antes da guerra, Gaza recebia uma média de 500 caminhões por dia. Ontem, entraram apenas 90 veículos para atender uma população submetida à vulnerabilidade extrema.
Além disso, vários veículos seguem retidos na fronteira de Karem Shalom, como aponta o presidente do Crescente Vermelho Palestino, Younis Al-Khatib. A escassez de alimentos e o risco de fome em massa continuam a preocupar organizações internacionais.
Organizações de ajuda humanitária também expressam a preocupação com propostas que buscam limitar ainda mais o acesso à ajuda humanitária. Um plano articulado por Israel e os EUA prevê a distribuição de suprimentos sob controle de contratantes armados privados, com o argumento de evitar desvios por parte do Hamas.
Agências internacionais classificaram a proposta como impraticável e contrária aos princípios humanitários. As críticas reforçam a necessidade de canais neutros e eficientes para a entrega de recursos básicos à população civil.
Em entrevista exclusiva a Opera Mundi, o ex-dirigente do Hamas, Bassem Naim, afirmou que “não há palavras que possam descrever situação de Gaza”.
“Estamos falando de mais de 70 dias sem comida, sem remédios e sem combustível. Mesmo dentro da Faixa de Gaza, os israelenses sempre destruíram os poços de água, clínicas, hospitais, armazéns de alimentos que ainda estavam lá. Eles atacaram abrigos e casas seguras. E, portanto, estamos falando de uma verdadeira inanição, um verdadeiro desastre”, afirmou.
Ataques continuam
Enquanto os suprimentos chegam a conta-gotas, os bombardeios de Israel contar as famílias palestinas continuam.
Israel atacou um edifício residencial em Jabalia al-Balad, no norte de Gaza, atingindo mais de 50 palestinos. A Defesa Civil descreveu o cenário como um “massacre horrível”, destacando que eles conseguiram recuperar apenas quatro corpos e resgatar seis pessoas com vida.
O restante das vítimas estão sob os escombros e as operações de resgate foram interrompidas devido à escassez de maquinário, combustível e equipamentos médicos.
No sul de Gaza, 11 palestinos, entre eles crianças, foram mortos após um ataque a uma residência na cidade de Abasan al-Jadida, conforme noticiou a agência Wafa, nesta manhã. Outras pessoas ficaram feridas, algumas em estado considerado crítico.
Hospitais são alvo
A situação nos hospitais também é crítica. Em vídeo publicado na plataforma X, a cirurgiã plástica Dra. Victoria Rose denuncia o agravamento do colapso no sistema de saúde desde o bloqueio à entrada de ajuda. Segundo ela, a escassez de insumos cirúrgicos e medicamentos compromete os atendimentos mais urgentes e põe em risco a vida de milhares de feridos.
Na noite desta quinta-feira (22/05), tanques e drones israelenses atingiram o hospital al-Awda, no norte de Gaza. Segundo o diretor da instituição, Mohamed Salha, o cenário é de “horror”. Ele coloca em risco a vida de pacientes e da equipe médica, já debilitados pelas limitações impostas pelo bloqueio.
O Ministério da Saúde de Gaza denunciou uma intensificação da “campanha sistemática” de Israel contra hospitais. Pelas regras do direito internacional, os hospitais devem ser protegidos. Na última semana, informou, ao menos 20 unidades de saúde foram danificadas ou obrigadas a encerrar parcial ou totalmente suas atividades.
