Ataques israelenses miram prédios residenciais em Gaza e matam 143 palestinos
Beit Lahilya fica no norte do enclave, com ao menos 100 mil palestinos sitiados há 26 dias pelo Exército de Israel, que impede entrada de ajuda
As Forças de Defesa de Israel (IDF, por sua sigla em inglês) voltaram a bombardear prédios residenciais em Beit Lahilya, no norte de Gaza, na madrugada desta quarta-feira (30/10). A região está sob cerco israelense há 26 dias e o ataque ocorreu enquanto civis tentavam resgatar soterrados.
O primeiro ataque contra a região deixou ao menos 93 pessoas mortas, sendo 25 crianças. Já o segundo, matou cerca de 19 pessoas e deixou diversos feridos em estado grave. Porém, ainda não se sabe quantas vítimas ainda podem estar soterrados.
“Meus dois filhos com suas famílias inteiras foram mortos. Minha filha também e minha outra filha com seus cinco filhos, todos mortos”, disse, aos prantos, uma mulher palestina em vídeo verificado pela emissora catari Al Jazeera. “O que eles fizeram para serem massacrados assim?”.
Mohamed El-Azamy, de 34 anos, que foi deslocado mais de 15 vezes no último ano, é outro sobrevivente do ataque. “A noite passada foi uma das piores”, disse ele ao jornal britânico Guardian.
“Houve bombardeios de todas as direções. Passamos horas esperando a bomba que nos mataria até que o prédio vizinho foi atingido. A cena era horrível. A maioria dos que vi eram crianças. Os corpos estavam mutilados. O que mais me doeu foi ver corpos das crianças colocados na beira da estrada”, disse.
Rabie al-Shandagly, outra vítima do ataque a Beit Lahilya, fez relato similar à agência AFP. “A explosão aconteceu à noite. Quando saí, pela manhã, vi pessoas puxando corpos, membros e feridos de debaixo dos escombros. A maioria eram crianças. Tentam salvar os feridos, mas não há hospitais ou cuidados médicos”, relatou.
Hospital colapsado
Os feridos foram enviados ao Hospital Kamal Adwan, o maior do norte de Gaza e dos poucos em funcionamento na região. Na semana passada, o local foi bombardeado por um tanque israelense, depois invadido por militares que prenderam a maior parte de seus funcionários.
Com as instalações parcialmente destruídas e sem pessoal, a unidade vive uma situação precária com feridos espalhados por todo o chão do hospital.
“Estamos sem recursos, sem suprimentos e quase sem médicos porque muitos deles, incluindo cirurgiões, foram detidos”, disse o diretor do hospital, doutor Hussam Abu Safia. “O hospital e toda a vizinhança são um cenário de guerra, o sistema de saúde entrou em colapso total, precisamos de uma intervenção internacional urgente”, disse à Al Jazeera.
Cerco mortal
Beit Lahilya fica no norte de Gaza, onde cerca de 100 mil palestinos estão sitiados há 26 dias pelo Exército de Israel, que impede a entrada de suprimentos. As autoridades de saúde do enclave calculam que cerca de mil palestinos já morreram ali e centenas estejam feridos ou sob os escombros.
Segundo o Guardian, o cerco e a escalada de violência naquela área aumentam os temores palestinos de que Israel esteja implementando um plano proposto por um grupo de ex-generais que consistia em ordenar a evacuação da população civil do norte, cortar o fornecimento de ajuda e considerar qualquer um que permaneça como militante.
O recrudescimento dos ataques em Gaza ocorreu 16 dias depois de os Estados Unidos deram um “ultimato” para que Israel melhorasse a entrada de ajuda humanitária ao norte de Gaza e evitassem os ataques a civis.

Ataques de Israel contra Gaza já duram mais de um ano, com milhares de mortos e feridos
No entanto, os ataques desta madrugada ocorrem quando o Programa Mundial de Alimentos da ONU acabava de solicitar ação imediata para evitar mortes por fome em grande escala no norte de Gaza.
Além disso, ocorreram dia após o Parlamento israelense ter aprovado a expulsão da organização de ajuda humanitária da ONU (UNRWA) de todo o país e dos territórios palestinos ocupados. A agência é a principal fornecedora de serviços básicos, como saúde e educação na Palestina, além de ser responsável por milhares de empregos.
Outros bombardeios em Gaza e no Líbano
No sul e no centro de Gaza, o Exército israelense também atacou tendas que abrigavam refugiados deslocados de outras regiões.
No sul, isso ocorreu no entorno de al-Mawasi, a oeste da cidade de Rafah, e no campo de refugiados de Khan Younis. No centro, o alvo foram as tendas de Deir el-Balah.
Ainda na terça-feira (29/10), os bombardeios israelenses mataram 77 pessoas no Líbano, 15 delas em Sarafand e Haret Saida, perto da cidade de Sidon. Os ataques mais uma vez incluíram as forças de paz da ONU, atingindo a sede da Unifil em Naqoura, onde feriram oito soldados austríacos.
O Exército de Israel responsabilizou o Hezbollah.
Muitas palavras e nenhuma ação
Os militares israelenses disseram que estavam “analisando os relatos do ataque”. Já os EUA, por meio de um porta-voz do departamento de Estado, “expressaram preocupação”, descreveram a situação humanitária de Gaza como “catastrófica” e os massacres recentes como “um incidente horrível com um resultado horrível”. Também disseram que “entrariam em contato com o governo de Israel para perguntar o que aconteceu”.
Diversas instâncias da ONU condenaram os ataques, com o qual seu escritório de Direitos Humanos se disse “chocado”. Mas, na reunião do Conselho de Segurança da ONU desta terça-feira, o representante da Palestina nesse organismo frisou que o momento já não é de palavras e sim de ações.
“Israel cruzou todas as linhas vermelhas, quebrou todas as regras, desafiou todas as proibições. Quando vocês vão agir? Vocês são o Conselho de Segurança, esse é o seu dever”, disse Riyad Mansou.
Ele lembrou que além dos 43 mil palestinos mortos em Gaza, os ataques israelenses deixaram mais de 100 mil mutilados com deficiências permanentes, e dois milhões de deslocados que não têm para onde voltar porque suas casas foram ou estão sendo destruídas.
“Suas ações têm que corresponder às suas palavras. Parem esse genocídio ou permaneçam em silêncio para sempre. (…) É preciso acabar com a impunidade e garantir a responsabilização porque esse genocídio só é possível por causa da impunidade”, disse o representante palestino.
