Seis jornalistas brasileiros chegaram a Israel no dia 5 de fevereiro, para uma temporada de oito dias, com todas as despesas de viagem e hospedagem pagas pelo Instituto Brasil-Israel (IBI), uma das principais entidades sionistas com inscrição nacional. O objetivo, segundo nota dos dirigentes dessa organização, é “desexcepcionalizar Israel, isto é, mostrar que se trata de um país complexo, como todos os outros, com pessoas diversas, opiniões distintas e nuances que, muitas vezes, só podem ser compreendidas quando vistas de perto”.
Os profissionais de imprensa que integram a delegação são: Pedro Doria, fundador e editor do Canal Meio; Tatiana Vasconcellos, âncora da Rádio CBN; Filipe Figueiredo, criador do podcast Xadrez Verbal; Leila Sterenberg, que atua semanalmente nos programas do canal do IBI; Janaina Figueiredo, repórter especial do jornal O Globo; e Marcos Guterman, diretor de Opinião no jornal O Estado de S. Paulo.
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A iniciativa ocorreu em paralelo com a excursão da delegação de acadêmicos brasileiros, organizada pela Stand With Us Brasil, que desembarcou em 2 de fevereiro e ficou até o dia 9. De acordo com o vice-presidente do IBI, Eduardo Wurzmann, em declaração ao boletim da associação, os participantes “terão oportunidade de conhecer e conversar com atores importantes de todo o espectro da política e da sociedade israelense”.

Por meio de uma excursão organizada pelo Instituto Brasil-Israel, jornalistas brasileiros de veículos da grande mídia e independentes viajam a Israel
No comunicado emitido pelo IBI, consta um itinerário que prevê uma visita à região atacada pelo Hamas em 7 de outubro de 2023, além da Praça dos Reféns “em um dia em que há a expectativa de retorno de sequestrados”. Opera Mundi entrou em contato com o instituto para obter mais informações referentes à excursão dos jornalistas, mas não obteve retorno até o fechamento desta reportagem.
Para o presidente do Sindicato dos Jornalistas de São Paulo (SJSP), Thiago Tanji, participação nas chamadas press trips sempre foi um ponto de debate, sendo que alguns veículos de comunicação tendem a proibir convites de empresas que financiam esses roteiros. Segundo o líder da categoria, a cobertura jornalística referente ao massacre na Faixa de Gaza já apresenta problemas em si, ainda mais quando há tentativa do governo israelense em utilizar “estratégia de relações públicas e lobby” para se manter próximo à imprensa.
“Os jornalistas terão liberdade e coragem de questionar as autoridades israelenses pelos mais de duzentos jornalistas assassinados desde outubro de 2023? Poderão realizar entrevistas e circular livremente pelos territórios que desejarem, conversando com a população palestina, que poderia relatar os horrores que viveram por decisões tomadas pelo Estado de Israel?”, questionou o sindicalista.

De acordo com o jornalista, sociólogo e professor da Escola de Comunicação e Artes da Universidade de São Paulo (ECA-USP), Laurindo Lalo Leal Filho, o governo israelense faz uso da tática do soft power, por meio de entidades alinhadas a Israel, como o IBI, para amenizar a repulsa global contra o país pelas denúncias de crimes contra a humanidade.
“É parte dessa política a viagem que jornalistas e professores brasileiros fazem a Israel. São convites feitos em meio a uma das agressões mais violentas da história recente, que deveriam merecer um mínimo de ponderação antes de serem aceitos. Não se pode admitir ingenuidade a essas pessoas com o tipo de formação que possuem. Ao aceitar o convite, tomaram implicitamente partido do lado agressor”, afirmou.
Para o jornalista, a mídia brasileira nunca abordou o genocídio perpetrado por Israel com “honestidade”. “Os convidados brasileiros terão coragem de se manifestar sem subterfúgios sobre o genocídio imposto aos palestinos ou se curvarão aos anseios dos seus anfitriões, engrossando ainda mais o caldo de desinformação da mídia brasileira?”, questiona.

Apesar do IBI se apresentar como uma instituição independente, muitos são os questionamento a esse respeito. Para Bruno Huberman, historiador e professor na PUC-SP, “o instituto colabora e coopera com diversos organismos paraestatais que, de alguma forma, atuam como organizações terceirizadas do Estado para avançar sua agenda globalmente”. Em sua opinião, o IBI “não tem uma vinculação direta com o Estado, mas com o projeto do Estado sionista.
“A narrativa deles não é de construir uma aliança e uma fidelidade irrevogável com o Estado de Israel”, complementa. “Querem de alguma forma, o que entendem ser o verdadeiro Israel. As suas qualidades e defeitos. E se colocam como organização crítica do governo Netanyahu”.

Para Huberman, no entanto, a relação com o IBI não é neutra. “Eles buscam ser o centrão”, avalia. “Defendem a paz, uma moralidade contra supostos extremismos, de certa forma igualando os fascistas israelenses com a resistência palestina, ou seja, desresponsabilizam a história colonial pelos problemas atuais. Existe um projeto político por trás dessas viagens do IBI.”
A reportagem de Opera Mundi tentou contato com os jornalistas em viagem, sem sucesso até a publicação da presente matéria. O site estará às ordens para expressar seus pontos de vista quando julgarem oportuno.

Na sexta-feira (07/02), a delegação de jornalistas brasileiros esteve no norte do Israel, na fronteira com o Líbano