Israel é acusado de usar fósforo branco contra civis no sul do Líbano; ONGs denunciam ‘crime de guerra’
Human Rights Watch registrou uso de munições por israelenses em pelo menos 17 municípios do país desde outubro
As autoridades libanesas acusam Israel de usar munições de fósforo branco contra civis e o meio ambiente. Um sobrevivente conta o que sentiu quando a sua localidade foi atingida por esse tipo de produto. Em contato com o oxigênio, a substância pode ser usada para criar cortinas de fumaça e iluminar campos de batalha. Ela também pode ser usada como arma incendiária e causar queimaduras graves, danos respiratórios, falência de órgãos e até levar à morte. A Human Rights Watch denuncia os riscos, em um relatório divulgado nesta quarta-feira (05/06).
No início deste ano, Mohammad Hammoud estava em casa com a esposa, no sul do Líbano, quando os bombardeios israelenses atingiram a cidade onde vive. O septuagenário logo percebeu que havia algo diferente naquele ataque em relação a todos os precedentes.
“Houve um incêndio na frente de casa (…) Havia um cheiro estranho (…) não conseguíamos respirar”, disse à AFP. “Quando as equipes de resgate chegaram, nos disseram que era fósforo”, acrescentou o morador de Houla, perto da fronteira com Israel, que teve de ser hospitalizado.
Desde o início da guerra na Faixa de Gaza, em 7 de outubro, o Hezbollah libanês tem trocado tiros regularmente com o exército israelense, em apoio ao seu aliado palestino.
“O uso generalizado de fósforo branco por Israel no sul do Líbano coloca os civis em risco e contribui para o deslocamento de pessoas”, disse a Human Rights Watch (HRW) em seu relatório.
A ONG afirmou ter “verificado o uso de munições de fósforo branco pelas forças israelenses em pelo menos 17 municípios no sul do Líbano desde outubro”. Em cinco deles, as munições foram “utilizadas ilegalmente contra áreas residenciais povoadas”.
Imagens da AFP tiradas pelo menos dez vezes entre outubro e abril mostram nuvens de fumaça em forma de polvo, geralmente associadas ao fósforo branco. As imagens foram feitas em pelo menos oito locais diferentes, diversas vezes perto de residências.

O Ministério da Saúde do Líbano afirmou ter identificado 178 pessoas que sofreram ‘exposição química devido ao fósforo branco’, desde outubro
Em outubro, os militares israelenses afirmaram que as normas exigiam que as bombas de fósforo branco “não sejam usadas em áreas densamente povoadas, a menos em certas exceções”. “Isto é conforme e vai além das exigências do direito internacional”, afirmou em um comunicado, acrescentando que os militares “não utilizam tais projéteis para queimar”.
A agência de notícias oficial libanesa ANI relatou repetidamente bombardeios israelenses de fósforo no sul do Líbano, inclusive nos últimos dias, às vezes causando incêndios. Segundo esta fonte, a aldeia de Houla sofreu um bombardeio com munição de fósforo em 28 de janeiro, dia em que Mohammad Hammoud e sua esposa foram internados.
O hospital informou à AFP que quatro civis foram internados na ocasião em cuidados intensivos por “asfixia grave e falta de ar devido ao fósforo branco”.
O Ministério da Saúde libanês afirmou, na quarta-feira, ter identificado 178 pessoas que sofreram “exposição química devido ao fósforo branco” desde outubro, sem distinguir entre eles os civis e os combatentes.
“A utilização de fósforo branco em áreas habitadas por civis pode (…) constituir uma violação do direito humanitário internacional”, disse Brian Castner, especialista militar da Anistia Internacional, à AFP. “Se civis forem feridos ou mortos, isto pode constituir um crime de guerra”, acrescentou.
No ano passado, a Amnistia Internacional já havia alertado que tinha “evidências do uso ilegal de fósforo branco por Israel” no sul do Líbano entre os dias 10 e 16 de outubro. Em particular, considerou que o ataque de 16 de outubro contra a aldeia de Dhayra, que feriu pelo menos nove civis, deveria “ser investigado como um crime de guerra”.
Em dezembro, a Casa Branca manifestou preocupação com relatos de que Israel tinha utilizado fósforo branco fornecido pelos EUA em ataques no Líbano.
Soldados da ONU implantados no sul do Líbano também detectaram o uso de fósforo branco, garantiu à AFP um funcionário da ONU, sob condição de anonimato. Beirute apresentou uma queixa à ONU em outubro, acusando Israel de ter “colocado em perigo a vida de um grande número de civis” ao usar fósforo branco e de ter “causado degradação ambiental generalizada” ao “queimar áreas florestais libanesas”.
A utilização de fósforo branco também suscitou preocupações entre os agricultores do sul do Líbano, cujas terras foram queimadas. Alguns temem a potencial contaminação do solo e das colheitas.
Os combates transfronteiriços entre o Hezbollah e Israel já deixaram mais de 450 mortos no Líbano, segundo uma contagem da AFP, a maioria das vítimas combatentes, além de 88 civis. A violência já causou o êxodo de mais de 94 mil pessoas.
Netanyahu: “Israel prepara operação no Líbano”
O primeiro-ministro de Israel, Benjamin Netanyahu, afirmou nesta quarta-feira que o país está “preparado para uma operação muito intensa” na fronteira com o Líbano, onde desde outubro as tropas israelenses trocam tiros diariamente com o movimento Hezbollah.
“Nós estamos preparados para uma operação muito intensa no norte. De uma forma ou de outra, vamos restaurar a segurança no norte”, detalhou Netanyahu durante uma visita à zona de fronteira.
Os seus aliados de extrema direita, os ministros Itamar Ben-Gvir e Bezalel Smotrich, apelaram, nos últimos dias, a uma ação urgente para restaurar a segurança no norte de Israel. “Eles estão incendiando aqui. Todas as fortalezas do Hezbollah também deveriam queimar e ser destruídas”, escreveu Itamar Ben-Gvir na terça-feira (04/06) em uma mensagem na rede Telegram.
Embaixada norte-americana em Beirute é atacada
Um homem armado, de nacionalidade síria, abriu fogo nesta quarta-feira contra a embaixada dos Estados Unidos no subúrbio ao norte de Beirute, capital do Líbano, antes de ser preso, informou o exército libanês.
O agressor foi baleado e ferido por soldados presentes no local e transportado para o hospital. Buscas estão sendo feitas na área e a embaixada permanecerá fechada ao público, com reabertura prevista para quinta-feira (06/06).
Não houve reivindicação imediata de responsabilidade pelo ataque. As forças de segurança libanesas implementaram postos de controle ao redor da embaixada e um helicóptero do exército libanês sobrevoa a área.
O primeiro-ministro interino do Líbano, Najib Mikati, disse que acompanha o incidente juntamente com o Ministro da Defesa e as Forças de segurança.