Uma coalizão de organizações internacionais de ajuda humanitária acusou Israel, nesta terça-feira (12/11) de ignorar um ultimato dos Estados Unidos, que ameaçou com sanções caso o país não implementasse uma série de medidas para mitigar a crise humanitária em Gaza. As informações são do jornal britânico Guardian.
O ultimato, com prazo de 30 dias para expirar entre esta terça e quarta-feira (13/11), foi entregue em 13 de outubro. Segundo os grupos humanitários, quase nenhuma das exigências foi atendida até o momento.
Ainda não está claro quais medidas a falha de Israel em cumprir o acordo irá desencadear, mas podem incluir a suspensão temporária de parte do fornecimento de munições ou de outras formas de assistência militar. Até o momento, Washington não confirmou se considera que Israel cumpriu as exigências.
Posicionamento do Departamento de Estado dos EUA
O Departamento de Estado dos EUA afirmou ainda nesta terça-feira que o secretário de Estado, Antony Blinken, havia informado um alto funcionário israelense no dia anterior que as ações tomadas por Israel devem resultar em uma melhoria concreta no terreno.
Questionado sobre como os EUA pressionariam Israel para melhorar a situação humanitária, o porta-voz do Departamento de Estado, Vedant Patel, afirmou que não há “uma nova política ou avaliação a ser apresentada, mas continuaremos nossas conversas com o governo israelense”.
“Não fizemos uma avaliação de que Israel está violando a lei dos Estados Unidos”, disse Patel. O site Axios relatou mais cedo que Blinken decidiu não reduzir a assistência militar a Israel em função da situação humanitária em Gaza, tendo como fontes dois funcionários do governo norte-americano.
Concessão de última hora
Em uma aparente concessão de última hora, autoridades israelenses anunciaram a ampliação da “zona humanitária” em Gaza, adicionando áreas no interior que podem aliviar parcialmente a superlotação e permitir que algumas pessoas deslocadas se afastem da costa com a aproximação do inverno.
Autoridades humanitárias no território palestino descrevem a situação como “apocalíptica” em grande parte do território, onde mais de 80% dos 2,3 milhões de habitantes foram deslocados, e mais de dois terços dos edifícios foram destruídos ou danificados após 13 meses de guerra.
Os ataques israelenses continuaram nesta semana, matando pelo menos 14 pessoas, incluindo duas crianças e uma mulher, de acordo com autoridades médicas palestinas.
Um ataque na noite de segunda-feira (11/11) atingiu uma cafeteria a oeste de Khan Younis, matando ao menos 11 pessoas, incluindo duas crianças, segundo autoridades do hospital Nasser, para onde as vítimas foram levadas. Outro, na manhã de terça-feira, atingiu uma casa no centro de Gaza, matando três pessoas, incluindo uma mulher, de acordo com o hospital al-Awda, que recebeu as vítimas.
Forças israelenses lançaram uma grande operação no norte de Gaza no mês passado, isolando três cidades e ordenando a evacuação de civis. Militares afirmam estar combatendo militantes do Hamas que se reagruparam na área.
O que diz o relatório?
O relatório das organizações humanitárias listou 19 medidas de conformidade com as exigências dos EUA. Segundo o documento, Israel não cumpriu 15 dessas medidas e apenas parcialmente quatro.
“Israel não apenas falhou em atender aos critérios dos EUA que indicariam apoio à resposta humanitária, mas também tomou ações que pioraram dramaticamente a situação no terreno”, afirma o documento. “A situação hoje é ainda mais grave do que há um mês.”
O ultimato, assinado por Blinken e pelo secretário de Defesa Lloyd Austin, exigia que Israel permitisse a entrada de, no mínimo, 350 caminhões de mercadorias por dia em Gaza, abrisse uma quinta passagem para o território, garantisse o acesso de grupos de ajuda ao norte de Gaza e interrompesse legislações que prejudicassem as operações da agência da ONU para refugiados palestinos, a Unrwa.
Especialistas em segurança alimentar, segundo o jornal britânico Guardian, alertam para a iminência de uma fome em partes do norte de Gaza.
O volume de ajuda alimentar que chega à região atingiu o nível mais baixo desde dezembro, segundo dados oficiais israelenses, com apenas 8.805 toneladas de alimentos cruzando os postos de controle israelenses até o momento neste mês.
“A catástrofe humanitária em Gaza é resultado de uma obstrução sistêmica da ajuda, de bombardeios incessantes e de uma alarmante falha em proteger civis”, disse Katy Crosby, diretora sênior de política e advocacia nos EUA da Mercy Corps, ao veículo.
“O pior cenário para o norte de Gaza agora é uma realidade devastadora… O governo dos Estados Unidos deve responsabilizar Israel e tomar medidas decisivas para garantir a entrega irrestrita de ajuda. Sem isso, o sofrimento evitável e as mortes aumentarão e corroerão a credibilidade moral e legal dos Estados Unidos”, colocou Crosby.
Na segunda-feira, Israel afirmou ter atendido à maioria das exigências dos EUA e anunciou que uma quinta passagem para Gaza seria aberta nos próximos dias, mas afirmou que manteria suas leis contra a Unrwa.
Matthew Miller, porta-voz do Departamento de Estado dos EUA, disse na semana passada que Israel fez alguns progressos, mas que ainda precisa fazer mais para atender às condições dos EUA.
Autoridades israelenses rejeitam a acusação de que a ajuda é deliberadamente restrita e acusam as agências humanitárias de falharem em organizar sua distribuição.
Dificuldade na assistência
Agências ligadas à Organização das Nações Unidas (ONU) afirmam que os combates e a falta de segurança dificultam coletar e distribuir a ajuda no lado palestino.
Em outubro, 57 caminhões por dia, em média, entraram em Gaza, segundo dados israelenses, e 81 caminhões por dia na primeira semana de novembro. A ONU estima um número inferior, com cerca de 37 caminhões diários desde o início de outubro. As organizações afirmam que entre 500 e 600 caminhões seriam necessários para atender às necessidades básicas da região.
“Outubro foi um mês muito fraco”, disse um oficial israelense, sob condição de anonimato, conforme regras de briefing militar. “Mas se você observar os números de novembro, estamos mantendo uma média de 50 caminhões por dia para o norte de Gaza e 150 para o restante do território.”
Autoridades israelenses estimam que até 40% da ajuda é roubada em alguns dias. Trabalhadores da ONU em Gaza afirmam que cerca de um terço da ajuda foi saqueada.
Israel também anunciou medidas adicionais, como a conexão de eletricidade para uma usina de dessalinização na cidade central de Deir al Balah e esforços para trazer suprimentos para o inverno.
Na terça-feira, a Coordenação de Atividades Governamentais nos Territórios (Cogat), órgão militar israelense responsável pela ajuda humanitária a Gaza, anunciou uma entrega “tática” de alimentos e água para Beit Hanoun, uma das cidades mais atingidas no norte de Gaza.
Os bombardeios e a invasão terrestre de Israel já mataram mais de 43 mil palestinos, mais da metade mulheres e crianças, de acordo com autoridades locais de saúde, que não detalham quantos dos mortos eram militantes.