O Knesset, o Parlamento de Israel, proibiu nesta segunda-feira (28/10) a entrada e operação da Agência das Nações Unidas de Assistência aos Refugiados da Palestina (UNRWA), principal fornecedora de ajuda humanitária a civis em Gaza, em seu território e áreas sob seu controle. O decreto deve entrar em vigor entre 60 a 90 dias.
O projeto de lei aprovado por 92 legisladores israelenses, contra apenas 10 votos contrários, influencia diretamente no funcionamento da agência da ONU, uma vez que os caminhões que levam ajuda humanitária, como água, alimentos e medicamentos, precisam da aprovação de Tel Aviv para passar por seus postos de controle a fim de chegar ao enclave palestino.
Outro trabalho da UNRWA em Gaza é a manutenção da educação e saúde em Gaza, com hospitais de campanha e escolas que têm sido usadas pela população refugiada como abrigos temporários para fugir da violência israelense, mas também alvos dos bombardeios do exército.
Assim, segundo a emissora Al Jazeera, é estipulado que cerca de três milhões de palestinos, na Faixa de Gaza e na Cisjordânia, seriam privados dos serviços essenciais oferecidos pela agência humanitária. No âmbito educacional, mais de 650 mil crianças serão privadas de ensino.
O jornal catari ainda aponta outra problemática de suspender as ações da UNRWA: o desemprego de 13 mil pessoas que trabalham no território palestino.
Aprofundar o sofrimento dos palestinos
Após o voto israelense, o alto comissário da UNRWA, Philippe Lazzarini, declarou que a o decreto aprovado contra a agência “não tem precedentes e estabelece um precedente perigoso” porque “se opõe à Carta da ONU e viola as obrigações do Estado de Israel sob o direito internacional”.
The vote by the Israeli Parliament (Knesset) against @UNRWA this evening is unprecedented and sets a dangerous precedent. It opposes the UN Charter and violates the State of Israel’s obligations under international law.
This is the latest in the ongoing campaign to discredit…
— Philippe Lazzarini (@UNLazzarini) October 28, 2024
Afirmando que a lei “é a mais recente campanha israelense para desacreditar a UNRWA e deslegitimar seu papel no fornecimento de assistência e serviços de desenvolvimento humano aos refugiados palestinos”, o representante da ONU declara que o decreto “só vai aprofundar o sofrimento dos palestinos, especialmente em Gaza, onde as pessoas estão passando por mais de um ano de puro inferno”.
Identificando a aprovação do parlamento como “uma punição coletiva”, Lazzarini insta que “acabar com a UNRWA e seus serviços não vai tirar dos palestinos seu status de refugiados”, uma vez que “esse status é protegido por outra resolução da Assembleia Geral da ONU até que uma solução justa e duradoura seja encontrada para sua situação”.
“Não rejeitar esses projetos de lei enfraquecerá nosso mecanismo multilateral comum estabelecido após a Segunda Guerra Mundial. Isso deveria ser uma preocupação de todos”, concluiu o diplomata.
Suposta ligação com o Hamas
Após a aprovação da lei, o gabinete do primeiro-ministro Benjamin Netanyahu declarou que
“trabalhadores da UNRWA envolvidos em atividades terroristas contra Israel devem ser responsabilizados”, referindo-se às acusações de Tel Aviv sobre o envolvimento da agência humanitária com os ataques do Hamas em 7 de outubro de 2023.
A denúncia levou as Nações Unidas à investigação, que teve início em janeiro e foi finalizada em agosto passado. Segundo as conclusões, “para 10 dos investigados não foram encontradas provas suficientes e para outros nove surgiram indícios de um possível envolvimento com os atos”, estes últimos foram desligados da UNRWA.
UNRWA workers involved in terrorist activities against Israel must be held accountable. Since avoiding a humanitarian crisis is also essential, sustained humanitarian aid must remain available in Gaza now and in the future.
— Prime Minister of Israel (@IsraeliPM) October 28, 2024
Netanyahu ainda falou sobre “evitar uma crise humanitária” em Gaza, apesar da própria ONU já identificar essa situação, além de risco de fome iminente e vida aos civis do enclave. Assim, garantiu que a ajuda “deve permanecer disponível em Gaza agora e no futuro”, sem detalhar como essa manutenção será feita, uma vez que a UNRWA é a principal agência que atua na região.
Segundo o jornal local Times Of Israel, o governo israelense deve usar o tempo até o início do decreto para determinar novos meios de fornecer ajuda ao enclave.
O governo israelense deve votar também, ainda nesta segunda-feira (28/10), um projeto de lei para romper as relações diplomáticas com a UNRWA, segundo o jornal britânico The Guardian.
O que é a UNRWA?
Apesar de ser a principal agência humanitária atuante na Faixa de Gaza, a UNRWA também estende suas ações à Cisjordânia ocupada, Jerusalém Oriental, Síria, Líbano e Jordânia.
A agência foi criada pela ONU em 1949 para fornecer alimentação, saúde e educação à população palestina após a Nakba, conhecida como a catástrofe palestina: o deslocamento forçado de mais de 700 mil palestinos após a criação do estado de Israel em 1948.
A UNRWA foi criada pela Assembleia Geral da ONU em 8 de dezembro de 1949 para fornecer suporte básico, incluindo alimentação, saúde e educação, a dezenas de milhares de refugiados palestinos.